Sutileza, leveza, simplicidade e elegância eram características fortes do trabalho do brilhante Nelson Xavier, que tristemente nos deixou há exatamente uma semana. Mestre da atuação, nos seus 75 anos de vida quase 60 foram dedicados à carreira. Agora, só nos resta relembrar com saudades e admiração a incrível trajetória desse ator e diretor brasileiro que tanto contribuiu para a história da teledramaturgia e do cinema nacional.
Nelson Xavier se consagrou primeiro no cinema e no teatro para depois chegar à nossa televisão, onde interpretou grandes papéis em séries e novelas. Formado na Escola de Artes Dramáticas da Universidade de São Paulo em 1957, estreou no palco do Teatro de Arena com a peça Eles Não Usam Black-tie, de Gianfrancesco Guarnieri. Na mesma época, Eduardo Coutinho, futuro cineasta, arrumou-lhe emprego de revisor na revista Visão, onde passou a colaborar como crítico.
O cinema entrou na vida de Xavier após o golpe militar de 1964 e a consequente censura ao teatro político. O ator tinha convicção de que as artes dramáticas não eram sua vocação e em uma entrevista ao Memória Globo confessou que as câmeras lhe assustavam profundamente: “Eu tive muita dificuldade em começar a fazer televisão. As máquinas eram enormes, eu tinha pavor, até tremia!”, afirmou. Mas, ao contrário do que acreditava, ele tinha nascido para isso.
Até o final dos anos 70, foram muitos filmes, como O ABC do Amor (1967), Os Deuses e os Mortos (1970), É Simonal (1970), A Culpa (1972), Dona Flor e seus Dois Maridos (1976) e A Queda (1978), que lhe rendeu um Urso de Prata no Festival de Berlim. Mas, apesar de ter feito mais de 50 filmes durante a vida, seu maior sucesso veio recentemente, quando interpretou o médium Chico Xavier em dois filmes: Chico Xavier (2010) e As Mães de Chico Xavier (2011). Em entrevista, o ator confidenciou que o papel foi um dos mais marcantes em sua carreira, pois foi seu reencontro com a espiritualidade (assista aqui).
Na televisão, interpretou quase 30 personagens. Sua estreia foi na pele de Zorba, na novela Sangue e Areia (1967), de Janete Clair. Mas foi em 1982 que viveu seu primeiro protagonista: o lendário cangaceiro Lampião, seu trabalho com maior repercussão. O papel aconteceu na primeira minissérie da TV Globo Lampião e Maria Bonita, dirigida por Paulo Afonso Grisolli. Vendida a outros países, é considerada até hoje como uma das melhores produções históricas da televisão brasileira. Nelson Xavier apresentou uma interpretação magnífica, emprestando delicadeza e lirismo a um personagem tão controverso.
Outro sucesso foi como o Delegado Queiroz, em Pedra Sobre Pedra, de 1992, fazendo comédia com a parceira de cena Arlete Salles. Entre outros, alguns trabalhos na teledramaturgia que podemos destacar e citar são Tenda dos Milagres, O Pagador de Promessas, A História de Ana Raio e Zé Trovão, Renascer, Irmãos Coragem, Belíssima, A Favorita e Gabriela.
Sua filha, Tereza Villela Xavier, no comunicado público do falecimento feito nas redes sociais, disse uma frase que expressa o sentimento de todos que acompanharam e admiraram sua carreira: ‘Ele virou um planeta! Estrela ele já era’.
Seu talento era tanto que até quando fazia papeis coadjuvantes seus personagens chamavam a atenção do público. Um exemplo de sua imensa dedicação está no ar em Senhora do destino, novela de 2004, que está sendo reexibida pela segunda vez no Vale a Pena Ver de Novo. Nesta, que foi uma das melhores criações do autor Aguinaldo Silva, Nelson Xavier era o motorista Sebastião, irmão de Maria do Carmo (Susana Vieira). A história era bonita, mas a escalação do ator fez toda a diferença. Ele construiu um personagem de uma dimensão humana impressionante, alguém real e passível de identificação.
Mais recentemente (em 2013), de cabeça raspada, atribuiu a mesma credibilidade a outro líder espiritualista que interpretou: Ananda Rinpoche, um guia budista que ajudou o mocinho vivido por Bruno Gagliasso em Joia Rara e depois reencarnou como sua filha, Pérola, vivida pela atriz mirim Mel Maia. O seu último trabalho na TV foi uma participação especial na novela Babilônia (2015) como Sebastião, um cadeirante assassinado pela vilã Beatriz (Gloria Pires).
De monge a sertanejo e rei do cangaço, Nelson Xavier foi todos eles com a técnica de quem domina o ofício, mas acrescenta aquela dose de emoção de quem trabalha com o coração. Sua filha, Tereza Villela Xavier, no comunicado público do falecimento feito nas redes sociais, disse uma frase que expressa o sentimento de todos que acompanharam e admiraram sua carreira: “Ele virou um planeta! Estrela ele já era”. Sua morte abre uma lacuna gigantesca nas nossas artes cênicas, mas o que ameniza um pouco é que esse grande homem deixou um legado à altura de sua grandeza pessoal.
Para tardar as saudades um pouquinho mais, podemos vê-lo na tela em seu mais novo trabalho, que lhe rendeu o prêmio de melhor ator no Festival do Rio de 2016. Ele protagoniza o filme Comeback, de Erico Rassi, que retrata a história de um ex-pistoleiro aposentado que reage com violência à hostilidade do mundo que o cerca enquanto tenta voltar à ativa. O título está previsto para chegar aos cinemas brasileiros no dia 25 deste mês.