Como falar do quinto episódio de uma franquia cinematográfica sem nela pensar como integrante de uma saga que, ao longo dos anos, transpôs os limites da tela grande. A verdade é que O Exterminador do Futuro: Gênesis só faz sentido, e oferecerá algum prazer ao espectador, caso ele tenha visto pelo menos os dois primeiros, e melhores, episódios, ambos dirigidos por James Cameron (dos campeões mundiais de bilheteria Titanic e Avatar), e tiver alguma noção de seu significado na história não apenas do cinema, mas da cultura pop.
No início da década de 1980, Cameron, hoje uma espécie de sinônimo de blockbuster, era um cineasta em início de carreira, com apenas um longa-metragem no currículo: o trash Piranhas 2 — Assassinas Voadoras (1981). Três anos mais tarde, ele faria história ao lançar O Exterminador do Futuro, realizado com apenas US$ 6,4 milhões.
Mais do que um êxito comercial, o filme tornou-se objeto de culto, uma referência no gênero ficção científica/ação, e Cameron dirigiria, em 1989, uma sequência, também espetacular, O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final. O longa se tornou um estrondoso êxito internacional, após o qual o cineasta abandonou a franquia, que renderia mais três episódios de uma marca que já acumulou US$ 1,4 bilhão.
Portanto, falar sobre Gênesis, em cartaz desde ontem nos cinemas brasileiros, não é tarefa fácil. Por mais que seja uma história algo autônoma, o filme é um eco do passado, uma tentativa de resgatar tanto a própria franquia e seu significado simbólico quanto a carreira de seu astro, o austríaco naturalizados Arnold Schwarzenegger, hoje com 68 anos.
Primeiro ‘O Exterminador do Futuro’ é filme de horror com metáfora cristã
O argumento da trama original é revisitado, mas com a deliberada intenção de chutar o balde, e mudar alguns elementos essenciais.
Antes de entrar para o panteão das grandes franquias de ação de Hollywood, O Exterminador do Futuro começou como um título de horror em 1984. Depois de um pesadelo, o diretor James Cameron idealizou a produção como um slasher movie em que o assassino com uma faca era substituído por um robô do futuro com armas.
Depois de ter sido governador da Califórnia, Schwarzenegger agora parece disposto a brincar com a própria persona mais do que nunca. Seu personagem, que no longa original era o vilão, agora é uma espécie de patriarca cibernético, responsável pela proteção da família Connor, ao ponto de ser chamada por Sarah (Emilia Clark, Daenerys Targaryen da série Game of Thrones), de (pasmem!) “paps”.
Essa informação é uma espécie de chave para uma leitura mais crítica de Gênesis, dirigido por Alan Taylor (de Thor: O Mundo Sombrio). Ao mesmo tempo em que não deixa de ser uma obra de ficção científica e ação, o filme é um pastiche dos quatro episódios anteriores, sobretudo dos dois primeiros, brincando e subvertendo seus elementos sem muita cerimônia. Desdiz o que já disse, transformando a figura messiânica de John Connor em uma espécie de vilão, e amplificando dos os elementos da trama, sem medo da incoerência e do absurdo. Talvez seja esse seu maior diferencial e charme.
O argumento da trama original é revisitado, mas com a deliberada intenção de chutar o balde, e mudar alguns elementos essenciais. John Connor (Jason Clarke, de A Hora Mais Escura), que teria o papel de salvar a humanidade, manda Kyle Reese (Jai Courtney, da série Spartacus) ao passado para proteger Sarah Connor. Ao chegar a 1984, tudo está mudado. E aí está, talvez, o grande achado criativo do longa: ele parte do princípio de que os quatro episódios anteriores de alguma forma tiveram impacto sobre o enredo original, o alterando, em uma brincadeira metalinguística.
O roteiro embaralha a linha do tempo e, ao alterar o passado, também muda o presente, e nada será como antes. O fãs mais puristas vão reclamar dessas alterações, que parecem tirar a saga dos trilhos. Mas essa opção faz algum sentido se os produtores têm a intenção de dar novo gás à franquia, emprestando-lhe novos rumos narrativos, ainda que, para entendê-los, é necessário conhecer, pelo menos, os dois primeiros longas.
O elenco é um dos pontos altos. Emilia Clarke e Jai Courtney rendem muito bem como o casal protagonista. Jason Clarke faz um John Connor ambíguo e sombrio, e J.K. Simmons (ganhador do Oscar de melhor ator coadjuvante por Whiplash) tem uma breve, porém marcante participação. Quanto a Schwarzenegger, presente na tela em três versões diferentes, se consolida como ícone inquestionável do cinema de ação. E com muito humor e autoironia.
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