Se O Homem-Formiga (leia crítica aqui), em cartaz nos cinemas brasileiros, surpreendeu o público ao oferecer aos fãs de filmes de super-heróis uma narrativa menos centrada em pirotécnicas cenas de ação, e com maior ênfase no desenvolvimento dos personagens e nos diálogos, a nova versão de Quarteto Fantástico vai em outra direção.
O filme usa como base tanto elementos dos quadrinhos originais de Stan Lee e Jack Kirby quanto do longa-metragem de 2005, mas faz o que hoje chamam de reboot – em vez de dar continuidade à narrativa dos filmes anteriores, a história é reiniciada do zero. No caso do filme que chega nesta quinta-feira aos cinemas, esse retorno às origens é literal.
O filme de Josh Trank, que coassina o roteiro com o produtor Simon Kinberg e Jeremy Slater, escolhe como fio condutor a trajetória do menino prodígio Reed Richards (vivido na fase adulta por Milles Teller, do premiado Whiplash), desde a infância. Ainda garoto, ele já se vê às voltas com um invento que mudará sua vida: um equipamento capaz de teletransportar matéria para outra dimensão. Em sua escola, o veem como uma criança-problema, imersa no mundo da fantasia.
Descoberto sete anos mais tarde em uma feira escolar de ciências pelo visionário pesquisador Franklin Storm (Reg E. Cathey, da série House of Cards), Reed recebe uma bolsa de estudos integral para o Baxter Institute, uma academia tecnológica e think tank, onde sua invenção é vista como um grande feito. Lá, ele conhece a filha adotiva de Storm, Sue (Kate Mara, também de House of Cards) e seu irmão rebelde Johnny (Michael B. Jordan, de Fruitvale Station, A Última Parada, que causou controvérsia entre os aficionados da HQ por ser negro). Para ingressar na instituição, Reed tem de deixar para trás seu melhor amigo de infância, Ben Grimm (Jamie Bell, astro de Billy Elliot), que voltará à cena quando Richards colocar seu invento em ação.
Fecha o grupo outro prodígio, o temperamental Victor Von Doom (Toby Kebbell, de Planeta dos Macacos – O Confronto), que desenvolveu um projeto semelhante ao de Reed, mas não conseguiu dar-lhe continuidade. Juntos, vão tentar usar a criação de Reed para alcançar essa outra dimensão, que seria uma versão alternativa da Terra, onde esperam encontrar curas para doenças e, talvez, um futuro lar para os humanos, caso nosso planeta entre em declínio irreversível. A jornada a essa outra instância, no entanto, os colocará em confronto com forças energéticas poderosas e terríveis, e dela nascerá o Quarteto Fantástico.
Reed ganha a habilidade de se esticar como se fosse feito de borracha. Johnny vira uma tocha humana, ardendo em fogo. Sue adquire a capacidade de se tornar invisível e de criar em torno de si campos energéticos. O pobre Ben, que entra de gaiato no navio, se transforma em uma criatura, a Coisa, metade homem, metade rocha, cuja força espetacular passa a ser usada pelo governo norte-americano como arma de guerra. E o que terá acontecido com Victor?
O maior defeito de Quarteto Fantástico é, talvez, sua grande qualidade, ironicamente. A primeira parte do filme, dedicada à apresentação dos personagens e a mostrar como eles adquirem seus superpoderes, é bem interessante. Enquanto o filme de 2005, que ganhou continuação em 2007, tinha tons cômicos e era mais solar e abobalhada, a nova versão é sombria e dramática. Todos os jovens protagonistas são de alguma forma marginais, problemáticos e os poderes que adquirem são recebidos como fardos, punições. Esse tom de quase horror é bastante interessante e bem-vindo, já que mais coerente com as origens dos personagens.
“A primeira parte do filme, dedicada à apresentação dos personagens e a mostrar como eles adquirem seus superpoderes, é bem interessante.”
Acontece que, quando a ação do filme realmente tem início, com o quarteto entrando em ação, a narrativa desanda, porque não sobra tempo suficiente para que os personagens se reconfigurem. Ele são melhores sem seus superpoderes. O último terço da história, que se concentra no retorno do quarteto à outra dimensão em busca de uma cura e culmina com o confronto com uma força malévola, é mal contada, sem grande impacto dramático.
Os efeitos visuais do filme impressionam e são superiores aos vistos nos filmes de 2005 e 2007, mas a impressão que fica ao fim da projeção é que a trama, bem construída até determinado ponto, sai dos trilhos ao acelerar seu ritmo, esquecendo de se calcar nos personagens que levou tanto tempo para apresentar. De posse da Fox, os personagens da Marvel, que ainda não migraram para a Disney, talvez não tenham a oportunidade de demonstrar a que vieram em um segundo episódio, caso este fracasse. E isso é bem mais do que mera possibilidade.
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