Uma das magias do horror é a capacidade de desconstruir o senso comum de que estamos seguros neste mundo. Essa perspectiva, que não deixa de ser existencialista, pode ser vista em obras como Halloween (1978). No clássico de John Carpenter, um assassino sobrenatural ameaça a vida de jovens num subúrbio, tipo de região que é conhecida justamente por sua segurança.
O Natal vira um tema recorrente no gênero na medida em que também consegue inverter a lógica da partilha e do acolhimento familiar, comum nas comemorações de fim de ano. A festividade da época vira um pesadelo em títulos como Gremlins (1984), Noite do Terror (1974) e Batman: O Retorno (1992), que considero um filme bem assustador.
Mesmo narrativas voltada para crianças usam figuras monstruosas para discutir como a alegria natalina é frágil, especialmente a que é baseada apenas na iconografia dos presentes e das decorações. O Grinch (2000) é uma criatura que rouba o Natal de sua cidade por achá-lo superficial. Em O Estranho Mundo de Jack (1993), o melancólico protagonista assombra as crianças no dia 24 de dezembro porque está obcecado pelo significado da festa .
É possível que essa retratação do período natalino como um espaço de violência e insegurança venha também do nosso próprio estranhamento, muitas vezes inconsciente, dessas tradições. Nos grandes centros urbanos, evitamos o contato com o outro, que pode ser perigoso. Durante o Natal, no entanto, o abraçamos, pois forçamos a generosidade. Afirmamos que a época não é sobre presentes, mas nunca deixamos de comprar ou esperar que lembrem de nós. É também um momento em que um homem adulto e barbudo pode segurar crianças no colo, sem que isso gere qualquer tipo de repercussão moral.
É possível que essa retratação do período natalino como um espaço de violência e insegurança venha também do nosso próprio estranhamento, muitas vezes inconsciente, dessas tradições.
Não parece ser por acaso que o Papai Noel ocasionalmente seja retratado como uma figura demoníaca. Em O Santo (2010), São Nicolau é o espírito de um bispo do século XV que, no início de dezembro, rouba e mata crianças em cima de seu cavalo. No divertidíssimo Uma Noite de Fúria (2005), dois jovens precisam fugir do ataque de um Papai Noel que está livre de uma aposta milenar, feita com um anjo (!), e finalmente pode agir como um serial killer. O insano Papai Noel das Cavernas (2010) acompanha um grupo de caçadores que precisam matar papais noéis primitivos e canibais que saíram de uma caverna, onde estavam presos há séculos.
A popularidade recente do folclore europeu de krampus, uma criatura mítica que sequestra crianças em oposição ao Papai Noel, mostra de como estamos suscetíveis a aceitar versões mais sombrias do Natal. Já praticamente um clássico, Krampus: O Terror do Natal (2015), de Michael Dougherty, é um exemplo perfeito para ilustrar isso. Na trama, uma família precisa enfrentar o monstro, que pune quem se esquece do espírito natalino e liga apenas para as decorações e para os presentes. Os ataques começam justamente quando os familiares se reúnem e começam a forçar um convívio harmonioso numa relação consolidada por conflitos.