Tinha tudo para dar certo. Friends from College poderia suprir um pouco a eterna carência dos viúvos de Friends. Poderia matar a saudade dos órfãos de How I Met Your Mother. Poderia ser uma comédia interessante ao abordar um grupo de amigos na casa dos 40 anos, faixa-etária em que histórias como esta costumam encerrar, não começar. O elenco é invejável, especialmente os nomes Keegan-Michael Key (Key & Peele), Cobie Smulders (How I Met Your Mother), Fred Savage (Anos Incríveis), Billy Eichner (Difficult People) e por aí vai. Mas é impressionante como tudo deu errado na nova série da Netflix. E impressiona mesmo, não é força de expressão.
O texto é tão constrangedor que é possível se surpreender ao perceber como perdemos tempo assistindo a uma das produções mais vergonhosas do ano. Ressalto, aliás, como a Netflix está deixando de ser uma opção para se tornar só mais uma espécie de canal de televisão tradicional. Há um desespero em lançar uma série original a cada semana, o que há tempos nos faz questionar se estamos sendo críticos em relação à plataforma streaming.
Criada por Nicholas Stoller (Ressaca de Amor, Cinco Anos de Noivado) e pela escritora Francesca Delbanco, a série é uma espécie de Friends direcionada a quem cresceu assistindo a Friends e misteriosamente nunca amadureceu, tal como seus personagens. Friends from College gira em torno de Ethan (Keegan-Michael Key), um escritor de sucesso que pretende voltar ao topo dos livros mais vendidos agora com um romance adolescente. Podemos também chamá-lo de Chandler.
Ethan é casado com a advogada Lisa (Cobie Smulders) — ou se preferir pode chamá-la de Monica —, mas mantém um caso com Sam (Anie Parise) — ou Rachel, caso queira —, que também é casada e é a melhor amiga dos dois desde os tempos de faculdade. O caso de Ethan e Sam é ocasional, já que ele mora em Chicago com a esposa e ela em Nova York com o marido, mas quando Lisa consegue um emprego em NY, os dois se mudam e não se aproximam apenas de Sam, mas de todo o grupo de amigos da época da universidade em Harvard.
São enredos que poderiam ter dado certo caso conduzidos por melhores mãos, mas o que vemos na tela é desperdício atrás de desperdício.
Max (Fred Savage) é um agente literário que tenta impulsionar a carreira de Ethan — ele talvez possa ser chamado de Ross. Ethan é casado com Felix (Billy Eichner), um médico especialista em fertilização. Marianne (Jae Suh Park) é uma péssima atriz que faz umas peças duvidosas e podemos tranquilamente chamá-la de Phoebe. Há ainda Nick (Nat Faxon), que não tem muita função na história e poderia ser chamado de Joey.
A série basicamente cria situações para que estes personagens interajam, mas ninguém contou com o fato de que um elenco tão talentoso pudesse ter zero química na tela. Não há empatia, ninguém se convence de que aquelas pessoas são amigas há anos e não há cumplicidade ou intimidade entre ninguém do grupo. Ao contrário, todos parecem incomodados com a presença dos outros, talvez mais por falha do texto e da direção do que por culpa dos atores.
Temos ainda a questão de que, para uma série que tenta falar sobre amizade, todo mundo trai todo mundo, são egoístas e colocam os próprios amigos para baixo. Mas este não é o problema. Se os personagens fossem interessantes, poderia até ser uma abordagem bacana. O problema é que o texto e as situações beiram o amadorismo.
Ethan é um personagem irritante, que se comporta como uma criança de 12 anos em todos os momentos. Todos. Quando fica estressando ou desconfortável, Ethan imita vozes aparentemente engraçadas. E isso é repetido incansavelmente durante os oito episódios. Em determinado capítulo, os personagens masculinos usam drogas e fazem as coisas mais idiotas que alguém poderia fazer, como ficar sapateando num apartamento ou jogar pizzas na parede e no teto, apenas para contarem em quanto tempo vai demorar para cair. Em outra situação, dois personagens matam acidentalmente o coelho da amiga e, claro, compram outro no lugar e torcem para que ela não perceba. Em outro momento, quando todos saem para um passeio em uma vinícola, esquecem um personagem na hora de voltar para casa porque estão bêbados e querem comer no McDonald’s. É tudo muito constrangedor.
Para não dizer que a série de todo ruim, há uma subtrama envolvendo Ethan e Lisa tentando ter um bebê. Toda a questão da fertilidade feminina é bastante eficiente, especialmente quando a série foca no doloroso tratamento para que mulheres consigam engravidar. O problema é que desde o começo nós sabemos que aquele casal está em crise e que, enfim, Ethan não é mais apaixonado pela esposa e sim pela amante, que é a melhor amiga de Lisa, o que gera uma dificuldade para que o público torça por qualquer um deles.
Há, também, a questão de um casal que entra em crise porque um dos dois muda completamente de personalidade quando está perto dos amigos. Ou o caso do trabalho de Lisa, que se vê infeliz dentro de uma empresa machista. São enredos que poderiam ter dado certo caso conduzidos por melhores mãos, mas o que vemos na tela é desperdício atrás de desperdício.
Lá pelo final da temporada, a série melhora um pouco quando, vejam só, as situações ficam um pouco mais maduras e complicadas. Embora o personagem Felix seja um médico atrapalhado que só faz piada e é bastante ridículo, é ele quem enriquece a série analisando-a exatamente como ela é. Ele não entende, por exemplo, por que aquelas pessoas são amigas, por que são tão imaturas e por que agem feito adolescentes. Felix não gosta dos personagens e nem o público.
Por fim, a série tem alguns breves momentos que garantem uma ou duas risadas, mas que não chegam nem perto de serem suficientes para aguentarmos oito episódios. De qualquer forma, Friends from College pode agradar aos órfãos de séries com risadas ao fundo e que curtem assistir adultos idiotas fazendo coisas idiotas.