Não há muito o que falar sobre a qualidade técnica de Investigação Criminal. Produzida e exibida originalmente no canal a cabo A&E, em 2012, a série documental, que conta pelo olhar dos delegados, peritos e psiquiatras as histórias dos crimes mais famosos do Brasil, ganhou um novo fôlego em 2018 com a distribuição dos episódios pela Netflix. A edição é amadora e parece ter sido feita por alguém que sabe o básico do básico dos softwares de edição de vídeo. Não há imagem de apoio suficiente para sustentar os áudios e a repetição de frases e informações chega a irritar. Mas, então, por que estamos falando disso?
Longe de mim querer comparar Investigação Criminal com qualquer obra do mestre do documentário Eduardo Coutinho, mas aqui, tal como nas obras do diretor, há uma maior preocupação com as histórias e não com a técnica. Dificilmente isso pode ser considerado algo proposital, já que a impressão é de que a produção não tinha orçamento nenhum disponível, mas a crueza dos depoimentos e a riqueza de detalhes faz com que o público se sinta incomodado, comovido e se coloque no lugar das vítimas.
Por serem crimes que invadiram nossos lares por meio do circo midiático, o documentário dá uma sensação familiar estranha.
Utilizando depoimentos longos com algumas imagens cedidas pela polícia, Investigação Criminal tem uma estrutura básica repetitiva. Alguns letreiros aparecem para dividir a história e, no final, sempre ficamos sabendo o que houve com os assassinos. Dirigido, escrito e produzido por Beto Ribeiro (que já trabalhou também em outro documentário semelhante, Anatomia do Crime), fica evidente que a série tem um posicionamento claro sobre a crítica que quer fazer à legislação penal brasileira. E mesmo para quem entende de leis e do sistema judiciário, o resultado deixa uma desesperança amarga no peito do público.
Algumas histórias são mais famosas do que as outras e ainda estão latentes na nossa memória, como o assassinato da menina Isabela Nardoni e o plano mais imbecil do universo arquitetado por Suzane Von Richthofen e os irmãos Cravinhos. O mais interessante, não somente nestas duas histórias, é saber como os peritos criminais agiram de forma cuidadosa. A série acaba dando voz e exalta pessoas que geralmente não têm muito espaço na grande mídia para explicar a leigos como uma investigação de fato funciona. Aliás, para quem se interessou especialmente por esses dois crimes citados, o livro Casos de Família, de Ilana Casoy, narra as duas histórias com uma precisão de tirar o fôlego.
Todos os episódios contam com poucas imagens para dar ritmo à narrativa, portanto, a série precisa se firmar na retórica dos entrevistados. Funciona bem na maior parte do tempo, em outros o ritmo fica cansativo, especialmente no caso do cartunista Glauco Villas Boas e na abordagem do crime da Oscar Freire. Outro erro é a falta de algumas informações básicas sobre o caso, que deixam as histórias muitas vezes confusas.
Porém, desde a perturbadora história do médico Farah Jorge Farah e do maníaco do parque, a narrativa dos casos dá um nó no estômago. Por isso, é no episódio do menino Ives Ota que Investigação Criminal chega em seu ápice. Forte e muito difícil de assistir, o episódio traz o pai do menino contando sobre a investigação e a agonia do sequestro do filho. Sem apelar para lágrimas ou desespero, o episódio contrasta os depoimentos forte, secos e chocantes dos policiais e peritos com a doçura do pai, que vai relatando sua dinâmica com o filho e o que ele lembra daqueles dias sem fim.
Por serem crimes que invadiram nossos lares por meio do circo midiático, o documentário dá uma sensação familiar estranha de que estamos acompanhando histórias de alguém muito próximo a nós. Ao final, o sentimento é mesmo de que há algo muito errado no nosso sistema e que o ser humano acabou dando muito errado. Mesmo pecando na qualidade técnica e com uma amadorismo injustificável, Investigação Criminal é um documento sóbrio, real e triste, que diz muito nas entrelinhas sobre como funciona nosso país.