É sempre bom perceber a dificuldade que tenho em fazer uma lista de melhores séries do ano porque a TV deixou de ser aquele meio que produzia algumas séries ótimas para se tornar o meio que produz somente algumas séries ruins. Com isso, nosso filtro acaba sendo muito maior. Séries que poderiam ser consideradas sensacionais há alguns anos hoje podem ser apenas medianas. O nível está alto. E atualmente há séries (boas) para todos os gostos, desde quem curte um drama poderoso até quem gosta de ficção científica. Cada um pode ter uma série para chamar de sua.
O ano foi marcado por diversos hypes que não necessariamente foram excelentes, nem ruins. Por isso, ficam de fora da lista Game of Thrones (não me odeie, mas a temporada foi tecnicamente impecável e só), Stranger Things (foi uma bela temporada, mas nem perto de ser uma das melhores coisas do ano), American Vandal (essa só não entrou porque eu ainda não consegui ver, mas tem post aqui jurando que você precisa assistir) e Mindhunter (que é incrível e deveria estar aqui, mas precisei tirar para incluir uma outra que me perturbou muito mais). E não vamos nem falar de The Crown e Dark porque são recentes demais para incluir na lista e deixar outras fora.
O ano foi marcado por diversos hypes que não necessariamente foram excelentes, nem ruins.
Não conseguir ver todas as séries também causa uma baita aflição. Quem consegue consumir tudo? Quantas maratonas foram feitas em apenas um dia? O que escolher? Quantas séries a Netflix lançou este ano? O que deixamos de ver só porque nos acostumamos com a Netflix e com as séries que estão ali, fáceis?
Mas isso é papo para outro dia. Vamos à lista das 10 melhores séries do ano, na minha humilde opinião. Você, leitor, não fique ofendido se sua série não estiver aqui. Aliás, pode contribuir nos comentários dizendo o que foi imperdível este ano. Todas as resenhas das séries citadas podem ser lidas aqui na Escotilha.
10. Girls – 6ª temporada (HBO)
As acusações feitas a Lena Dunham quase me fizeram tirar a última temporada de Girls da lista, mas, enfim, a série não foi feita apenas por Lena ou por Murray Miller, um dos produtores acusados de assédio sexual (e que Lena cometeu o erro de defendê-lo). O fato é que os roteiristas fecharam a dramédia de maneira muito delicada e fugindo de todos os clichês possíveis que uma série assim poderia ter.
Não houve lição de moral ou uma grande jornada do herói para aquelas mulheres. Tudo ocorreu num tom sóbrio e comovente, com episódios memoráveis como “American Bitch”, “What Will We Do This Time About Adam?” e “Goodbye Tour”. O último episódio foi massacrado pelos fãs, mas como não poderia deixar de ser, a série encerra com um nível de honestidade bastante coerente com seu início, lá em 2012, fazendo de Girls uma série marcante para a televisão.
9. The Good Place – 1ª e 2ª temporada (NBC/Netflix)
The Good Place estreou em 2016, mas terminou sua primeira temporada em 2017 na NBC. Graças à Netflix, o mundo todo teve a oportunidade de conhecer uma das comédias mais divertidas do ano até agora e com uma das reviravoltas mais legais do momento.
Caso não ocorra nenhum problema na mão dos roteiristas, o segundo ano promete seguir com o mesmo nível de excelência. Com um elenco perfeito, texto redondinho e com questões filosóficas que funcionam muito bem dentro de uma comédia, The Good Place foi uma grata surpresa no meio do marasmo da televisão aberta norte-americana.
8. Master of None – 2ª temporada (Netflix)
É difícil o segundo ano de uma série superar sua estreia, mas Master of None voltou com um nível absurdo de excelência e, na minha opinião, entregou alguns dos episódios mais bonitos da TV esse ano. Basta ver a estreia da temporada, “The Thief”, que faz uma charmosa releitura do filme neorrealista italiano Ladrões de Bicicleta, ou o incrível episódio “New York, I Love You”, que apresentou crônicas dos moradores da cidade que geralmente não têm suas histórias mostradas, além de, claro, o episódio vencedor do Emmy por melhor roteiro, “Thanksgivin'”, que mostra diversos jantares de Ação de Graças enquanto a personagem Denise (Lena Waithe) descobre sua sexualidade e luta para se assumir perante à família. Lena Waithe, aliás, entrou para a história do Emmy Awards como a primeira mulher negra a ganhar o prêmio na categoria melhor roteiro em série de comédia. Imperdível é pouco.
7. Ozark – 1ª temporada (Netflix)
Essa entra na lista não por ser uma série inovadora e brilhante, mas simplesmente por, talvez, ter sido a série mais tensa (e consequentemente divertida) este ano na Netflix. Mesmo bebendo de várias fontes similares (a mais óbvia, claro, é Breaking Bad), Ozark conseguiu fazer com que nós ficássemos na ponta do sofá incrédulos com tudo o que estava acontecendo, além de nos fazer torcer por pessoas corruptas e que não medem consequências para terem mais dinheiro.
Com uma coerência no roteiro e uma urgência que funcionam muito na tela, Ozark fez a gente voltar a ter confiança na Netflix depois de uma sequência de série ruins que a plataforma lançou esse ano.
6. American Crime – 3ª temporada (ABC)
Essa é uma série da ABC e as duas primeiras temporadas estão na Netflix. Não há previsão para a chegada da terceira e última, o que é uma pena. Tal como seu segundo ano, American Crime mostra os Estados Unidos como ninguém quer ver. Focado nos imigrantes mexicanos e na prostituição infantil, a série mete o dedo na ferida para mostrar um país doente e hipócrita.
Infelizmente, American Crime jamais deveria ter sido exibida em canal aberto, o que garantiu seu cancelamento precoce. Ao mesmo tempo, é admirável que ela tenha durado três anos e tenha jogado todas as verdades na sala do público norte-americano sem medo. Com planos fechados, um texto seco e atuações dignas de palmas, American Crime talvez seja a série mais incompreendida dos últimos anos e deveria ter ganhado muito, muito mais repercussão.
5. The Keepers – Documentário (Netflix)
Eu ia colocar Mindhunter na quinta posição, mas basta lembrar um pouco o que senti assistindo a The Keepers para entender porque eu precisei mudar. Absolutamente perturbador, sórdido e assustador, a série documental da Netflix conseguiu mesclar as ferramentas de uma narrativa de terror como uma história real que por si só já embrulha o estômago e te faz dormir de luz acesa.
O pior de tudo é que não há demônios sobrenaturais, somente ações humanas mesmo. Os padres pedófilos e a corrupção da cidade de Baltimore para esconder a sujeira da igreja católica foi uma das coisas mais nojentas do ano. Precisa ter estômago forte.
4. Big Little Lies – 1ª temporada (HBO)
Impressionante como tudo nessa série funciona, desde o roteiro, escolha do elenco, trilha sonora, diálogos reais e uma montagem que deixa o público admirado e angustiado. Não teve para ninguém. A minissérie (agora série, já que foi renovada para uma segunda temporada) mostrou uma trama adulta, pesada e que escancara a discutível perfeição de uma comunidade rica, mostrando as pequeninas coisas do dia a dia e o que escondemos por meio de aparências.
Além de discutir relações abusivas e mostrar o poder das mulheres, Big Little Lies é um thriller mais do que eficiente e faz o público consumir tudo com calma e ficar sem fôlego a cada episódio, mostrando que a HBO ainda é a HBO e que suas produções estão longe de serem superadas.
3. The Leftovers – 3ª temporada (HBO)
The Leftovers começou bastante criticada em 2014 para se tornar, em 2017, a série mais elogiada e, claro, injustiçada nas premiações. Fato é que a produção da HBO está sendo alçada como mais uma obra-prima da TV. Falando sobre perdas e o poder da memória, The Leftovers encerrou sua trajetória de maneira delicada e abordando o luto de um jeito tão belo quanto Six Feet Under fez um dia.
2. The Handmaid’s Tale – 1ª temporada (Hulu)
Acho que todo mundo vai vai concordar que The Handmaid’s Tale foi uma das melhores séries do ano e que merece todos os prêmios que vem acumulando por aí. Quem não concorda provavelmente ainda não a assistiu. Tudo na série arrepia e assusta porque o que é discutido é tão atual que nada do que vemos ali soa tão absurdo ou irreal quanto parece.
Interessante perceber que algumas pessoas não quiseram assisti-la por julgar o tema forte demais, o que é justamente algo que a série tenta alertar. Vamos fechando cada vez mais os olhos para o que está acontecendo, até que, quando percebermos, o mundo mudou para pior. Mais do que um thriller e uma história muito bem costurada, The Handmaid’s Tale é um alerta e uma série extremamente necessária.
1. The Deuce – 1ª temporada (HBO)
Eu não coloquei The Handmaid’s Tale em primeiro lugar porque, no fim das contas, ela é baseada no livro de Margaret Atwood, o que já garante um rico material para os roteiristas. Já The Deuce, a nova série de David Simon (The Wire), traz um roteiro original e um esmero no texto que nos fazem entender por que a televisão está num nível de excelência tão absurdo.
Focado no início da indústria pornográfica dos EUA dos anos 1970, The Deuce é um deleite para os olhos a cada cena e, mesmo com um roteiro lento, jamais se torna cansativa, chata ou desinteressante. Mais uma vez o realismo dos personagens e da cidade abordado por Simon choca e convence. Com apenas oito episódios, o realismo cru das ruas nova-iorquinas e a visão nada binária com que cada personagem é apresentado é sensacional.