Um dos maiores nomes não apenas da literatura peruano, Julio Ramón Ribeyro é considerado um dos melhores contistas latino-americanos. Não limitou seu mergulho literário aos contos, também se destacando em outros gêneros, especialmente o romance. Até peças teatrais o escritor se pôs a escrever, especialmente no período que me imigrou para Paris. Integrante do boom literário na América Latina, quando o mundo passou a conhecer o que era feito ao sul do mundo, teve a (in)felicidade de ser contemporâneo de Mario Vargas Llosa, Enrique Congrains Martin e Carlos Eduardo Zavaleta.
No caso específico de Vargas Llosa, é apontada a ele a “culpa” para que a obra de Ribeyro tenha sido conhecida tardiamente, até mesmo em seu país. O reconhecimento só veio tardiamente, em 1994, quando foi vencedor do Prêmio Juan Rulfo de Literatura Latino-Americana, atualmente conhecido como Prêmio FIL de Literatura (Nélida Piñón e Rubem Fonseca já venceram o mesmo prêmio). Faleceria pouco tempo depois, em 4 de dezembro daquele ano, mas seria sempre lembrado como um dos autores prediletos de gente como Julio Cortázar.
O vencedor do Nobel de Literatura de 2010 ganhou ao longo dos anos toda a atenção de crítica e público no Peru. Foi o suficiente para emudecer um pouco a força de sua grande obra, em que fica evidente que não era apenas a reputação que os diferenciava, mas também a forma de ver a vida, a política local, as relações humanas.
O vencedor do Nobel de Literatura de 2010 ganhou ao longo dos anos toda a atenção de crítica e público no Peru. Foi o suficiente para emudecer um pouco a força de sua grande obra.
No Brasil, apenas a coletânea Só Para Fumantes havia sido traduzida, na já extinta Cosac Naify. Pois não é pouco se alegrar que a coleção “Otra Língua”, da editora Rocco, organizada por Joca Reiners Terron, tenha trazido para nós Prosas Apátridas (158 págs). A obra, traduzida por Paulo Roberto Pires, foi sendo construída por seu autor ao longo de vários anos. Aliás, o próprio Julio Ramón Ribeyro fez questão de deixar claro que se tratava de um livro em que seus textos não eram capazes de serem encaixados em nenhum gênero. Eles flutuam entre anotações de diário, fruições de pensamento e ensaios, em que ele brinca com a forma como expõe suas imprensões, suas obsessões e fragilidades.
A primeira edição de Prosas Apátridas foi lançada em 1975 e contava com 89 fragmentos. A segunda foi lançada em 1978 e contava com 150. Finalmente, em 1982, é lançada a atual edição, que contém 200 fragmentos em que Ribeyro fala sobre política, sexo, amor e também compartilha conosco sua exímia capacidade de observador, seja de pessoas ou de pequenos detalhes cotidianos. Para os que não conhecem o escritor, é uma obra fácil, doce e delicada, ótima para apresentar o universo de Ribeyro e sua “prosa” incomum. Também é uma coleção de fragmentos repletos de frases e notas para serem gravadas na memória e repetidas à exaustão. Por isso, como diz o posfácio, não se assuste se sair grifando todo o livro, Julio Ramón Ribeyro e seu Prosas Apátridas causam isto em que o lê.
Fica aqui uma de minhas citações favoritas do livro: “Compreendi então que escrever, mais do que transmitir um conhecimento, é ter acesso a um conhecimento. O ato de escrever nos permite apreender uma realidade que até esse momento se apresentava de forma incompleta, velada, fugitiva ou caótica. Muitas coisas só são conhecidas ou compreendidas quando escrevemos. Porque escrever é explorar o mundo e nós mesmos com um instrumento muito mais rigoroso que o pensamento invisível: o pensamento gráfico, visual, reversível, implacável dos signos do alfabeto”.
PROSAS APÁTRIDAS | Julio Ramón Ribeyro
Editora: Rocco;
Tradução: Paulo Roberto Pires;
Tamanho: 158 págs.;
Lançamento: Abril, 2016.