Inverossímil começa mal, quase horrível. Um professor do curso de Letras troca mensagens com uma aluna, combinam de se encontrar para conversar sobre uma história que a garota escreveu. Ela chega, ele está sozinho no apartamento… Isso mesmo, parece o enredo de um filme pornô-com-história. Mas dá pra piorar: as frases são um tanto sofríveis, como se você estivesse lendo aqueles romances de banca de jornal e parece ainda que o revisor do livro estava dormindo, pois escaparam vários erros de digitação.
E aí começa a segunda parte do livro, lançado pela Não Editora, e você percebe que Rodrigo Rosp estava mentindo. Ok, a fabulação é mentirosa por definição, mas é que neste caso o autor faz o leitor perceber que na verdade (verdade?) estava lendo um texto meio merda escrito por um dos personagens. Aquela não era história do livro. Que dizer, aquela era apenas uma história dentro de outra história, mas não cabe dizer aqui com isso vai sendo revelado.
Às vezes digo que dois conselhos podem ser úteis para os escritores contemporâneos: 1) usem filtro solar (ver Pedro Bial) e 2) fuja da metalinguagem, pois segundo o instituto Eu Acho de pesquisas, esse recurso já está muito manjado, já encheu o saco, saturou, parem de dar piscadinhas inteligentes para o leitor, que preguiça, etc.
Parece-me que Rosp é uma exceção. Na verdade há outros autores que também conseguem fazer a metalinguagem funcionar sem soar muito babaca então a palavra exceção nesse contexto talvez seja um tanto excessiva. Vamos tentar melhorar então: Parece-me que Rosp é um dos autores que faz um bom uso da metalinguagem (viu só? Ao evitar a generalização com esse “um dos”, a resenha ganha mais credibilidade (perceba que esse argumento faz com que o resenhista encontre uma desculpa para ficar em cima do muro (fica bem claro que o resenhista está prevendo argumentações contrárias e já está apresentando a sua defesa no corpo do próprio texto (típico crítico cuzão)))). O caso é que a firula literária deu certo em Inverossímil, pois ficou divertido e abriu margem para uma reflexão interessante.
O caso é que a firula literária deu certo em Inverossímil, pois ficou divertido e abriu margem para uma reflexão interessante.
O livro é composto por momentos de narração convencional, mas boa parte das páginas são preenchidas com diálogos em dispositivos eletrônicos, como se reproduzissem as conversas via Facebook ou Whatsapp.
Tendo em vista que editamos a nossa vida nas redes sociais, criando personagens de nós mesmos, é interessante como o autor faz uso da instantaneidade deste recurso e nos coloca pra pensar sobre a ficção. O modo como o professor conversa via mensagens faz com que ele crie um personagem canastrão ou é a sua personalidade “real” que está contaminada de clichês discursivos? Depois de nos atolarmos em livros, séries e filmes, o quanto de nossas atitudes e reações são realmente autênticas? Se a experiência da comunicação se limita a uma mera reprodução de comportamentos, fica até meio difícil de separar o que é ficção e o que é realidade, pois tudo é repetição, tudo é mentira.
Inverossímil é uma obra corajosa por apostar nesta questão do formato atípico e na temática de nicho (embora seja moderninho, com mensagens e tal, sei lá se alguém que não é da área de Letras vai se interessar muito por essa história, já que basicamente é a literatura falando de suas questões intestinais), portanto, trata-se de um livro ambicioso por um lado, mas também um pouco limitado de outro, já que praticamente só tem a bala da metalinguagem no cartucho. É aquela coisa de um show de humor com uma piada só. Mas pelo menos é uma piada que funciona.
INVEROSSÍMIL | Rodrigo Rosp
Editora: Não Editora;
Tamanho: 128 págs.;
Lançamento: Janeiro, 2015.