Além de nunca celebrarmos o Dia dos Namorados no fatídico 12 de junho, minha namorada e eu temos o costume de celebrar o romance de maneira pouco convencional.
Ao invés de reservarmos uma mesa num bistrô parisiense ou celebrar em um restaurante japonês, demos espaço para as comemorações na última sessão de Invocação do Mal 2, que estreou na última quinta-feira. Surpreendente, o filme levantou da cadeira do cinema até o espectador mais incrédulo do gênero (claro que estou falando de mim mesmo).
Por mais que o enredo aposte em velhas fórmulas de possessão, demônios e uma criança atormentada, James Wan sabe criar atmosferas. E a graça dos sustos vem justamente pelo timing impecável que vi poucos fazendo. Mas o que mais surpreendeu no filme de Wan, na nossa querida coluna, foi a sensibilidade tocante da trilha sonora.
O longa tem, além da assinatura do mestre do terror e consagrado compositor Joseph Bishara (Invocação do Mal, Annabelle, Os Escolhidos e Sobrenatural),o sútil toque dos clássicos. Durante o filme, entre expectativa e sustos, existe The Clash, The Beatles, Bee Gees e o rei Elvis. O intuito é muito maior que apenas recriar a atmosfera dos anos 70 exigida no filme.
Em uma das cenas mais marcantes, esquecemos por alguns minutos que estamos em um filme de terror. Nela, Ed Warren pega seu violão e toca para a família Hodgson uma linda versão de “Can’t Help Falling in Love”. Na mesma cena, o apelo romântico do caçador de fantasma para sua esposa é tocante.
A música, executada praticamente em sua forma integral, surpreende pelo romantismo e sutilidade impostos em um filme criado para aterrorizar.
A música, executada praticamente em sua forma integral, surpreende pelo romantismo e sutilidade impostos em um filme criado para aterrorizar. Logo após, “I Started a Joke” é tocada como pano de fundo para a menina Janet.
O recurso das trilhas sonoras em destaque acima foram muito mais que apenas bom gosto de quem as escolheu e vai muito além apenas da composição de elementos dos anos 70. A sensibilidade das músicas nesse cenário capturam toda a emoção necessária da plateia a ponto de introduzi-las no enredo do filme. É emocionar para chocar e chocar para emocionar a todo instante.
Mas por que Wan e sua equipe dariam tanto peso a Blue Hawaii em um filme tão inglês? Como o próprio Ed Warren diz na cena à Peggy Hodgson “um pouco de cultura norte-americana na casa”.
Além de ser o álbum que estabiliza o elo entre a família e o pai, Blue Hawaii é um dos mais brilhantes e bem-sucedidos na carreira do rei do rock. Lançado em 1961, o álbum é a essência de todo o talento de Elvis. Em faixas que usam todo o recurso dos metais e com grande base de guitarras e corais havaianos, Elvis sensibiliza e cativa em faixas que transitam fácil do êxtase e da extravagância à sensibilidade e paixão.
Faixas como “Beach Boys Blues” e “Aloha Oe” são grandes exemplos da união vocal de Elvis com ritmos praieiros, enquanto “Hawaiian Sunset” e “No More” exploram com majestade ritmos lentos. E para deixar ainda melhor, existe a icônica e apaixonante faixa “Can’t Help Falling in Love”, que nos presenteia com outra atmosfera, fechando um álbum generosamente lindo até os dias de hoje.
https://www.youtube.com/watch?v=al7tPCvhCdQ
Por mais que o trabalho de grupos ingleses da época fosse excelente e tão originais, Elvis é um dos poucos e grandes artistas que teriam em sua obra todos os recursos necessários para dar a atmosfera pretendida no filme. Ao mesmo tempo que um álbum todo se torna um elo, é necessário apenas uma música para desconstruir todo o terror e presentear os casais do cinema com um minuto de emoção. Se James Wan sabe que só pode dominar sua plateia de maneira unânime usando Elvis, ele foi brilhante em acatar essa decisão.
Invocação do Mal 2 pode dividir a crítica com seu modelo e sua proposta inovadora. Mas é bem justo dizer que é humanamente impossível alguém criticar a escolha de suas músicas referências. Principalmente quando se tem uma sutil e brilhante homenagem ao rei do rock em seu contexto.