Uma das definições de clichê dicionarizadas em língua portuguesa diz que se trata de uma ideia já batida ou repetida à exaustão, ou seja, por algum motivo, aquela ideia se tornou um lugar comum, por ser sinônimo de qualidade ou não. É difícil falar no som de Josh Tillman, ou melhor, Father John Misty, como decidiu rebatizar sua carreira solo há alguns anos, sem evocar a palavra clichê.
A sensação é que já ouvimos todas aquelas músicas, sejam as faixas do celebrado Pure Comedy ou do recém-lançado God’s Favorite Customer. Mas isso não é nenhum demérito, pelo contrário. Mais uma vez, Tillman conseguiu atingir um resultado polido e tão bem arquitetado que é difícil escapar.
Desde a primeira faixa, é fácil se deixar levar pelas músicas, que vão se sucedendo num crescendo de qualidade – apesar de a faixa de abertura ser um destaque à parte – até as partes mais melancólicas do disco, onde o flerte do cantor com o folk e o country ficam mais evidentes e as faixas ainda melhores, como é o caso de “Please don’t die”, em que a voz cristalina de Tillman faz que a indiferença seja quase impossível.
Mais uma vez, Tillman conseguiu atingir um resultado polido e tão bem arquitetado que é difícil escapar.
É complicado analisar culturalmente o fenômeno Father John Misty se olharmos unicamente seu tipo de música, pois ele consegue se destacar numa seara alternativa em que muitos músicos parecem apenas fazer pastiches de si mesmo. Nesse novo álbum, Tillman consegue provar que, claro, para além de uma figura absolutamente autocentrada, há uma sensibilidade sutil e uma delicadeza que pareciam estar camufladas debaixo de um manto de ironia.
God’s Favorite Customer é tão repleto de boas harmonias e consegue construir uma atmosfera de tamanha delicadeza, isso sim uma novidade na obra de Tillman, que é quase possível esquecer o enorme ego que se esconde debaixo da barba e do visual que acabou se convertendo na tônica do momento.
As letras, sempre interessantes, soam como se, então, o eu-lírico de Tillman finalmente caminhasse numa direção distinta, mais aberta e emocionalmente mais vulnerável, o que confere uma certa doçura melancólica a certas faixas, em especial a que dá nome ao álbum. God’s Favorite Customer é, sem ser absolutamente genial e original, uma experiência auditiva agradável, que a voz certeira faz com que seja ainda melhor.
Se o clichê vira clichê porque não deixa de ser uma coisa boa, então o som de Tillman enquanto Father John Misty é um clichê, mas certamente um dos melhores que nossa época produziu.