Não há dúvidas de que a música está por todos os lados, em todos nossos momentos, e de que existem para as mais diversas finalidades, de dançar a estudar, de embalar uma atividade física até para relaxar. A música sempre foi compreendida como ferramenta comunicacional, através da qual transmitimos emoções, pensamentos e ideias que as palavras não são capazes de exprimir.
Enquanto sua finalidade é motivo de filósofos, cientistas e meros mortais, como nós, nos descabelarmos em busca de uma resposta minimamente plausível, há quem saiba brincar com sua arte, extrapolando a questão da finalidade e chegando até a definição de sua sonoridade.
Se para Agenor Braga e Reinaldinho dos Teclados, a dupla por trás do duo curitibano E Agora, Zé?, sua obra pode ser rock, folk ou nada disso, eles fazem questão de deixar isso bem pontuado em seu primeiro álbum, lançado no fim de abril. Estalido no Escuro transita por diferentes influências na busca de estabelecer um diálogo com o ouvinte, deixando uma certa dose de respostas a cargo desse mesmo público.
Estalido no Escuro transita por diferentes influências na busca de estabelecer um diálogo com o ouvinte, deixando uma certa dose de respostas a cargo desse mesmo público.
A arte age de diferentes maneiras – e é significada de outras tantas. É justamente esse fator que permite afirmar que uma obra são tantas, ou que um produto cultural nunca será o mesmo para distintos consumidores. Nesta pareidolia cultural, em que mente e corpo interpretam os estímulos oferecidos pelo duo E Agora, Zé? de formas diferentes, temos confirmado que a capacidade criativa de associar as variadas referências encontra eco na maneira subjetiva em que cada riff e cada verso cantado chega até nós.
Fruto de um exercício multidisciplinar, contemplando ilustrações, um trabalho lírico minucioso e o estabelecimento de uma narrativa lógica na ordem de disposições das músicas, o disco tem a proeza rara de soar complexo mediante uma apresentação simples e direta. Ele não subestima o ouvinte, mas também não pesa a mão ao concatenar ideias e redes referenciais, que poderiam embaralhar mais do que enriquecer.
Entretanto, Estalido no Escuro tem seus tropeços, principalmente no que tange a uma excessiva semelhança nos arranjos de algumas das faixas. Não chega a prejudicar o andamento do álbum, mas é inevitável a sensação um pouco confusa de que as canções se repetem, o que pode tornar sua audição cansativa, menos prazerosa. Mas é aqui que aquele fenômeno pareidólico fica mais evidente, o que permite fazer uma conjectura de que os resultados estavam previstos desde o início.
O astrônomo Carl Sagan, por exemplo, afirmou, em O Mundo Assombrado pelos Demônios, que “o mecanismo de reconhecimento de padrões em nossos cérebros é tão eficiente em descobrir uma face em meio a muitos outros pormenores, que às vezes vemos faces onde elas não existem.” E ao ver, sentir e perceber o que, talvez, nem esteja ali, o duo atinge seu objetivo em despertar emoções e sensações nas pessoas. É a arte em ação.