Uma mudança pode ter inúmeros (e bem distintos) significados, mas também tem em comum, independente dos motivos, uma necessidade de procurar algo ausente, uma busca pelo reencontro com uma base essencial. É interessante colocar estes fatores em perspectiva ao analisar o novo momento dos maringaenses da Sollado, banda formada no já distinto ano de 2010 com o nome de Sollado Brazilian Groove.
Como marca deste novo momento, o grupo formado por Valter Rosini (vocal), Fernando Morete (violão e vocal), José Augusto (guitarra), Gabriel Moraes (baixo), André Lauer (bateria) e João Paulo (percussão) apresentou em janeiro o homônimo Sollado, registro que contou com a participação de Claudio Caldeira (saxofone), Lucas Trabuco (guitarra) e Ricardo Martins (violão) e procurou concatenar cada personalidade ao longo das nove canções que compõem o álbum.
Sollado, essa procura pelo “eu” dentro do “outro”, aponta para algumas direções ao passo que resgata referências que determinaram a identidade sonora do grupo. De cara, o primeiro detalhe que chama a atenção em Sollado é o refinamento de sua produção, a cargo do próprio grupo e com mixagem por Gabriel Moraes e masterização por Felipe Tichauer.
Sollado, essa procura pelo ‘eu’ dentro do ‘outro’, aponta para algumas direções ao passo que resgata referências que determinaram a identidade sonora do grupo.
Se Para Todos os Efeitos (2014) era um disco com alma, o novo trabalho da banda de Maringá tem um casamento coeso entre alma e corpo. As notas de psicodelia, de forró e de punk, por exemplo, ao encontrarem paisagens sonoras mais etéreas, conferem uma cara ímpar, diferente das idiossincrasias com as quais nos acostumamos na música feita no Paraná – e mais ainda no norte do estado. Em virtude disto, Sollado tem muitos méritos, especialmente por seu esforço em busca de uma inventividade frente à pasmaceira e preguiça que por vezes polui a cena independente. Se não podemos afirmar que o sexteto é substancialmente original, certamente não há como acusá-los de não jogar uma musicalidade de maneira honesta com seu público.
Outro fator a ser destacado, a banda faz questão de imprimir em suas composições reflexões sobre nossa contemporaneidade, especialmente as relações humanas, com um diálogo bem interessante com a “modernidade líquida” de Bauman e nosso universo de “sinais confusos, propenso a mudar com rapidez e de forma imprevisível”. Se na forma como o sociólogo e filósofo falecido em 2017 encarou a pós-modernidade, emergem o individualismo, a fluidez e a efemeridade das relações (“Vivemos em tempos líquidos. Nada foi feito para durar.”), o álbum da Sollado não se furta em entender e matutar sobre de que forma isso se estende pelos demais elementos dessa coisa complexa chamada vida – e, para alívio dos mais apressados, sem nenhuma arrogância, fórmulas prontas ou frases feitas.
Em tempos que o pensamento, a reflexão e a autocrítica se tornaram mercadorias para discursos vazios, os maringaenses merecem palmas por seu bom conteúdo.