Neste momento, Björk está em busca do amor em sua nova fase musical, com disco que deve ser lançado logo, logo e o ótimo single “The Gate”. No meio dessas novidades, uma data fundamental em sua carreira é celebrada: 22 de setembro marcou os 20 anos de lançamento do disco Homogenic.
Terceiro disco solo de Björk, Homogenic existe para mim no centro de uma tríade genial da cantora islandesa, bem ao lado do anterior Post e do subsequente Vespertine. Estes três trabalhos definem Björk como essa artista ao mesmo tempo pop e avant-garde, através de sua poética delicada e suas experimentações sonoras.
Homogenic já começa icônico em sua capa, idealizada pelo genial Alexander McQueen, amigo íntimo de Björk. Com um vestido que se assemelha a um quimono e um visual que remete às mulheres-girafas da Tailândia, a arte segue o conceito de apresentar Björk como uma guerreira a enfrentar o mundo com amor.
Gravado quase inteiramente em Málaga, na Espanha, o disco é claramente caracterizado por seus contornos épicos, em que cada faixa é construída com múltiplas camadas. Logo de cara temos “Hunter”, que mescla música eletrônica e folk de forma certeira, para em sequência entrar “Jóga”, com sua orquestra e suas batidas de trip-hop ao fundo. E assim continua, trazendo uma faixa mais interessante que a outra.
“Unravel” é dolorosa em sua delicadeza. “Bachelorette” é um clássico irretocável e intenso (curiosamente, no Brasil já serviu até de trilha para os momentos de tensão de A Fazenda). “5 Years” e “Pluto” mostram a Björk que foi cantora punk quando adolescente, com vocais mais intensos. “All is full of Love” é o momento delicado e sincero, que ainda hoje é lembrada por muitos pelo seu clipe de “romance robótico”.
Os robôs criados por Chris Cunningham em “All is full of Love” são incônicos e hoje em dia o clipe faz parte do acervo permanente do MoMA, em Nova York. Repetidos sempre que possível na antiga MTV Brasil, os clipes dessa fase de Björk são irretocáveis: “Bachelorette” – criada originalmente para o filme Beleza Roubada, de Bernardo Bertolucci, e que tinha inicialmente o título “Bertolucci” – ganhou um clipe surrealista nas mãos de Michel Gondry, colaborador constante de Björk, que também dirigiu o clipe em animação de “Jóga”.
“Hunter”, por sua vez, mostra uma Björk careca a transformar-se em um leão computadorizado, sob direção de Paul White. “Unravel” só ganhou clipe em 2004, nas mãos de Lynn Fox, quando da turnê Greateast Hits de Björk, mesmo sendo um lançamento menor é ainda assim um clipe lindíssimo.
Com mais de 20 profissionais envolvidos na produção, incluindo aí Mark Bell, Howie B e o brasileiro Eumir Deodato, Björk é a dona do disco, cuidando de cada detalhe com atenção e dando o seu tom íntimo ao trabalho, especialmente por suas composições bastante pessoais.
“Jóga” é dedicada à sua melhor amiga e por isso leva seu nome. “5 Years”, dizem as más línguas, é uma resposta ao fim do namoro que ela teve com Tricky, assim como “Immature” seria uma resposta ao fim de seu namoro com Goldie. Especulações apenas. Das composições, “Pluto” é uma das mais simbólicas, em que Björk constrói uma faixa sobre a destruição total, para que assim renasçamos.
Björk é a dona do disco, cuidando de cada detalhe com atenção e dando o seu tom íntimo ao trabalho.
Das histórias por trás das faixas, uma das mais curiosas é de “So Broken”, faixa lançada em edições especiais do disco: Björk imaginava a si mesma como uma personagem de uma novela espanhola, então cantarolava essa canção quando estava na cozinha. No final das contas, a faixa acabou ganhando contornos de flamenco ao lado do guitarrista Raimundo Amador.
Essa “novela espanhola” na qual Björk era uma personagem imaginária surgiu depois do suicídio do stalker Ricardo López, em 1996. Apaixonado pela islandesa e revoltado com seu relacionamento com Goldie, López tentou matar a cantora com uma carta-bomba. Como seu ato final, López gravou 18 horas de VHS, onde aparece produzindo a tal carta, falando de seu amor/obsessão por Björk, destilando racismo contra Goldie e, por fim, raspa seus cabelos, pinta seu rosto e atira em si próprio.
Abalada com essa situação, é notável a resposta de Björk: só o amor nos salva, nos mantém firmes. E esse amor todo foi transformado nessa joia que é Homogenic. Enfim, eu poderia seguir aqui falando e confabulando sobre esse disco – daria um livro -, por isso encerro e digo apenas: aproveite essa data para visitar/revisitar essa obra-prima!
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