Horror não é, como costumam dizer, o medo do escuro. Horror é o que se insinua nos cantos iluminados da casa, o que range não sob os pés, mas dentro do peito. Teacup, a série criada por Ian McCulloch para o Peacock e produzida por ninguém menos que James Wan (de Invocação do Mal) que acaba de entrar no catálogo do Globoplay, parece saber disso — pelo menos durante seus episódios iniciais.
Baseada (e essa palavra deve ser usada com extrema liberdade aqui, já que cerca de 90% do enredo foi abandonado nesse processo de adaptação) no romance Stinger, de Robert R. McCammon, a série nos leva a um rancho isolado na Geórgia rural, onde três famílias tentam sobreviver não apenas a uma ameaça sobrenatural indizível, mas também a seus próprios fantasmas domésticos. Ou seja: as criaturas lá fora são assustadoras, mas nada se compara ao que há debaixo do teto de casa.
A protagonista Maggie, interpretada por uma Yvonne Strahovski (de The Handmaid’s Tale) firmemente empenhada em parecer à beira de um colapso nervoso (com sucesso), lidera um elenco que entrega mais do que o roteiro por vezes permite. Scott Speedman, como o marido silencioso e contido — ou apenas ausente, a depender do episódio —, equilibra-se entre o trauma e o cansaço crônico. Chaske Spencer e Kathy Baker completam o núcleo de personagens que, a despeito das intenções do roteiro, conseguem parecer reais, o que no horror contemporâneo já é quase um milagre.
A série, com seus episódios enxutos de 30 minutos, acerta ao rejeitar o inchaço narrativo que assola tantos thrillers modernos. Cada capítulo se movimenta com precisão cirúrgica, encurtando caminhos sem apressar emoções. Há um desconforto crescente que se infiltra lentamente — uma espécie de tensão que parece tão enraizada quanto as árvores retorcidas que circundam o rancho.
A ficção científica se insinua nos últimos episódios como um convidado atrasado a um velório: fora de lugar e sem tempo para se justificar.
Mas então, como um chá que esfria rápido demais, Teacup começa a perder o sabor. A atmosfera densa dá lugar a explicações desencontradas, e o mistério que sustentava o silêncio se desfaz em ruídos desconexos. A ficção científica se insinua nos últimos episódios como um convidado atrasado a um velório: fora de lugar e sem tempo para se justificar.
O final — ou seria apenas uma suspensão abrupta? — tenta ser poético, mas soa apressado. Sacrifícios são feitos, mas não se sente o peso. Fica a impressão de que a série foi cancelada antes de encontrar sua verdadeira voz, deixando perguntas sem resposta e promessas sem entrega. Um desfecho que ecoa não como um grito, mas como um suspiro entalado.
E ainda assim, há algo em Teacup que permanece. Talvez seja sua ambição contida, seu desejo sincero de evocar um medo mais atmosférico do que espetaculoso. Ou talvez seja simplesmente o fato de que, por seis episódios ao menos, ela realmente consegue nos manter atentos — não pelo que vemos, mas pelo que suspeitamos.
No fim das contas, Teacup é uma boa xícara de chá deixada sobre a mesa: ainda morna, com aroma agradável, mas esquecida antes do último gole.
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