Há filmes que falam ao coração, outros à cabeça — F1: O Filme, novo épico de ação automobilística dirigido por Joseph Kosinski, fala diretamente aos sentidos. É um banho de som, velocidade e carisma. Não pede reflexão, tampouco exige envolvimento emocional profundo. Quer, acima de tudo, que o espectador embarque na jornada com os olhos arregalados e o corpo em tensão, como quem assiste a uma final de Fórmula 1 em câmera subjetiva.
Brad Pitt interpreta Sonny Hayes, piloto veterano que brilhou nos anos 1990 e retorna às pistas para tentar salvar a equipe falida de um amigo (Javier Bardem, carismático como sempre). Mas o que está em jogo, no fundo, não é a vitória em si: é o resgate de um homem diante da passagem do tempo. Sonny não corre apenas para vencer — corre para não desaparecer. Para convencer a si mesmo de que ainda é relevante em um mundo que parece ter acelerado sem ele.
É impossível não comparar F1: O Filme a Top Gun: Maverick, do mesmo diretor. A estrutura é quase idêntica: o herói envelhecido, o pupilo impulsivo, a missão quase impossível e o embate entre o “antigo” e o “novo”. Mas se Maverick tinha um lastro emocional mais bem construído, F1: O Filme aposta tudo na superfície — e funciona melhor quando se mantém nela. As tentativas de aprofundar o drama pessoal de Sonny, como um trauma físico mal resolvido, surgem e desaparecem sem deixar marcas.
É impossível não comparar F1: O Filme a Top Gun: Maverick, do mesmo diretor. A estrutura é quase idêntica: o herói envelhecido, o pupilo impulsivo, a missão quase impossível e o embate entre o “antigo” e o “novo”.
O filme, no entanto, é um colosso técnico. Filmado em nove circuitos reais da temporada de Fórmula 1 de 2023, entrega imagens impressionantes — mérito do diretor de fotografia Claudio Miranda, que cola a câmera ao asfalto e nos coloca dentro do cockpit com uma fisicalidade quase vertiginosa. A trilha de Hans Zimmer, poderosa como sempre, ruge como um motor V12, embalando cenas de tirar o fôlego com uma pulsação quase tribal.
E há Pitt, claro — à vontade como nunca em sua fase “astro maduro”. Sonny é talvez o personagem mais próximo de seu papel icônico em Thelma & Louise desde os anos 1990. Mas agora o galã é um homem de 61 anos que não precisa mais provar nada. Está confortável em sua pele, mesmo quando exibe tatuagens esquisitas e camisas estilosas que parecem saídas de um desfile conceitual. O personagem é contraditório, às vezes até incoerente, mas Pitt segura tudo no carisma.
A narrativa também escorrega em sua tentativa de comentar o presente: há um subtexto sobre a transformação da Fórmula 1 em um espetáculo mais midiático que esportivo, mas ele aparece de forma tímida.
O jovem Josh (Damson Idris) representa a nova geração moldada pelas redes sociais, pressionada a performar não apenas nas pistas, mas nas timelines. Seu agente, ironicamente chamado Cashman, insiste que o sucesso hoje se mede em cliques. Sonny, claro, despreza tudo isso — e não esconde o desdém por sorrisos falsos diante das câmeras.
F1: O Filme até flerta com críticas ao culto à imagem e à automatização do esporte, mas no fundo se rende ao fascínio da máquina. Há uma certa nostalgia por um tempo em que o instinto valia mais que os sensores, e o talento falava mais alto que os algoritmos. A conexão entre Sonny e Kate (Kerry Condon), engenheira com um pé no passado e outro no futuro, serve como âncora emocional — mas também parece protocolar, como se fosse uma exigência de roteiro mais do que uma necessidade dramática real.
No fim das contas, F1: O Filme é exatamente o que se propõe a ser: uma máquina caríssima e bem calibrada, construída para impressionar. É cinema de alto desempenho, com acabamento impecável, mas que nunca deixa de parecer uma vitrine polida demais, onde emoção e complexidade são polidas até quase desaparecerem. Ainda assim, impossível não se deixar levar pela grandiosidade do projeto, pela competência da execução — e, principalmente, pelo magnetismo de Brad Pitt, que continua a ser, com ou sem capacete, uma força da natureza.
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