Poucos dias separam o lançamento de um dos maiores álbuns da história da música e o aniversário de um dos mais completos artistas do século XX. Aliás, o traço que une David Bowie, o gênio criativo por trás de Ziggy Stardust, e o ex-beatle Paul McCartney é justamente o grau de versatilidade dos dois músicos e suas incríveis capacidades de se reinventarem e transitarem por vários gêneros. Comecemos por Bowie, que há 45 anos apresentava seu mais icônico trabalho.
O álbum The Rise and Fall of Ziggy Stardust and the Spiders from Mars, lançado em junho de 1972, foi sem dúvida um dos marcos da música pop do século XX. O disco de pouco mais de 38 minutos se tornou um dos principais representantes do chamado Glam Rock, gênero que se difundiu na época, principalmente no Reino Unido, a base de muito glitter, performances teatrais e da animosidade dos primórdios do rock, mas com harmonias que flertavam com a psicodelia.
Ao apresentar Bowie travestido de seu colorido e maquiadíssimo alter ego, o extraterrestre Ziggy Stardust – persona criada pelo próprio músico ainda no início daquele ano -, o álbum levou o jovem cantor (na época com apenas 25 anos) definitivamente ao estrelato da cultura dos efervescentes anos 70.
O conceitual trabalho conta, evidentemente, a história da ascensão e queda de Ziggy, astro alienígena (devidamente estereotipado na figura do roqueiro com apelo sexual e que leva uma vida de excessos) buscando se comunicar com os terráqueos. Seja na canção “Five Years”, que abre o disco, onde ficamos sabendo que a Terra só tem mais cinco anos de vida (“Five years, that’s all we’ve got”), ou na clássica “Starman”, onde a figura de Ziggy tenta deixar uma mensagem de alento para nosso planeta, mas tem receio que sua excêntrica figura nos assuste (“He’d like to come and meet us, but he thinks he’d blow our minds”), a qualidade artística de Bowie e sua banda prevalecem. Solos de guitarra na medida certa; voz e violão em algumas faixas, tons psicodélicos em outras. Tudo com muito vigor e energia setentista.
Aliás, o traço que une David Bowie, o gênio criativo por trás de Ziggy Stardust, e o ex-beatle Paul McCartney é justamente o grau de versatilidade dos dois músicos.
No entanto, esta é apenas uma das muitas faces do cantor britânico. Ainda que o período glam o tenha acompanhado por mais alguns anos, é impressionante como, ao longo de toda sua carreira, Bowie foi capaz de transitar por diversos gêneros musicais e ser igualmente genial em todos eles.
Desde seus primórdios, nos anos 60, quando fazia folk pop, passando por sua fase glam, e posteriormente soul na década de 1970, quando lançou maravilhas como Diamond Dogs e Young Americans, até chegar aos anos 80, período em que se infiltrou no universo da dance music e atingiu um novo nicho de mercado e público. O camaleão David Bowie se adapta a diferentes contextos e é a personificação do artista irrotulável e, na humilde opinião deste que aqui escreve, é tão completo quanto um certo beatle que em breve aniversariará.
No próximo domingo, dia 18 de junho, Sir James Paul McCartney completa exatos três quartos de século de existência. O garoto da classe operária de Liverpool se transformou num dos músicos mais respeitados e reconhecidos de sua geração. Versátil, criativo e inquieto, Paul McCartney se reinventou inúmeras vezes ao longo de sua carreira, produzindo música de tudo que é jeito e para todos os gostos. Certamente um dos maiores nomes da história da música, Paul chega aos 75 (para a nossa sorte) ainda produzindo discos e excursionando pelo mundo.
Leia também
» Os 50 anos do lançamento de ‘Sgt. Pepper’s’
» O nascimento do camaleão David Bowie nas lentes de Mick Rock
Ao formar com John Lennon a dupla de compositores mais conhecida do universo – ainda que Lennon-McCartney não passasse de uma mera formalidade na hora de assinar trabalhos quase sempre feitos individualmente -, o baixista dos Beatles foi o responsável por grandes clássicos da banda em suas mais diversas fases. Seja a partir do rock sessentista de “I Saw Her Standing There”, que abre o disco de estreia do conjunto, passando pela balada voz e violão de “Yesterday” (simplesmente a canção mais regravada da história da música), chegando aos devaneios psicodélicos presentes no disco Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band e nos mega hits “Hey Jude” e “Let it Be”, Paul soa sempre magistral e cativante. Não à toa, sua versatilidade e coragem capazes de “assumir” o comando musical dos Beatles em 1967 coincidem com a fase mais experimental e criativa da banda.
Aliás, Paul McCartney é tão brilhante que, caso cometêssemos a infâmia de simplesmente apagar os Beatles da história da humanidade, seu nome ainda assim estaria reservado entre os grandes ícones da música. Seja a partir de seu trabalho com os Wings ou em sua carreira solo propriamente dita, Paul produziu maravilhas nos 27 álbuns que lançou desde a ruptura “beatle” em 1970. Há realmente de tudo nestes trabalhos.
Ram, de 1971, e Band on the Run, de 1974, por exemplo, são fantásticos discos que trazem um Paul “pop-rock” em grande estilo. Não raramente, estes álbuns figuram entre os grandes lançamentos da prodigiosa década de 1970. Agora, observe o que o já veterano e consagrado Paul McCartney dos anos 90 foi capaz de realizar apenas nesta década: Debutar na – preparem-se – música erudita com o lançamento de Liverpool Oratorio (1991), onde, num clima solene e religioso, mostra seu flerte com o classicismo; dar início, dois anos depois, à sua aventura na música eletrônica, com o impactante Strawberry, Oceans, Ships, Forest sob o codinome da banda The Fireman, e, por fim, gravar Flaming Pie (1997), registro cru de rock’n’roll após um período afastado dos acordes simples de guitarra, que o recolocou nas paradas de sucesso.
Com as bênçãos dos deuses da música, brindemos em homenagem à Bowie e McCartney.