Criolo é um artista diferente. Por mais clichê que a afirmação possa ser, é difícil encontrar outra forma de se referir ao músico paulistano. Dono de uma discografia quase irretocável, a cada novo lançamento Criolo se mostra mais inquieto, incomodado com seu próprio trabalho. Não por outra razão, reeditou um de seus primeiros trabalhos, Ainda Há Tempo, de 2006.
Se nos é difícil apontar um artista com maturidade o suficiente para fazer autocrítica, [highlight color=”yellow”]Criolo parece bem à vontade no confronto com seu passado, suas raízes e suas referências.[/highlight] Entre um disco e outro, se aventura em releituras, singles, projetos e outras aventuras que lhe permitem aprender, ter prazer e estar sempre tornando a entrar em contato com sua essência, tudo aquilo que faz de Kleber Cavalcante Gomes o Criolo que o Brasil passou a conhecer depois do já histórico Nó Na Orelha, de 2011.
Criolo tece teias complexas em seu novo trabalho. Opta por um caminho de pedras, que talvez o afaste de parte de seu público, seja o que chegou a ele através do rap, seja o que o abraçou quando atingiu o mainstream.
Enquanto o caminho natural de muitos artistas da música brasileira é embrenhar-se no universo pop, flertando com gêneros mais em evidência nas paradas de sucesso, o músico paulistano segue um caminho contrário, mostrando que suas escolhas artísticas nos últimos anos não eram puro capricho. Espiral de Ilusão, quarto disco de estúdio, sucessor de Convoque Seu Buda, mergulha não simplesmente no samba, mas em inúmeras referencias ao universo cultural afro-brasileiro.
Criolo tece teias complexas em seu novo trabalho. Opta por um caminho de pedras, que talvez o afaste de parte de seu público, seja o que chegou a ele através do rap, seja o que o abraçou quando atingiu o mainstream – e por vezes era o destino de suas afiadas e pungentes críticas. Com Espiral de Ilusão, Criolo leva seu público a Cartola, Paulinho da Viola, mas também apresenta a ele Henricão e toda a nata paulistana, sem esquecer de buscar Clara Nunes e trazer à luz dos novos tempos os pontos de umbanda.
[highlight color=”yellow”]Criolo é cada dia mais um artista maior do que somos capazes de compreender.[/highlight] Ainda que, para alguns, sua forma eloquente de falar ao microfone, ou a maneira pausada e, por vezes, confusa quando concede uma entrevista seja vista como presunção, é justamente aí que se esconde a magnificência de seu talento, trazido em cada disco de formas distintas.
O cantor compreende bem nosso tempo, não usa seu conhecimento para tomar o lugar de fala de outrem e sempre procura ser uma voz agregadora aos discursos que toma para si. Diferente de outros artistas, para ele um discurso não é só um discurso, é uma luta, uma forma de levar a vida. Para isso, não esquece que hoje sua situação é diferente, e usa isso a seu favor, seja para fazer crítica social, seja para falar sobre o cotidiano e sobre a urbe – ou até mesmo para atacar o presidente Michel Temer, o prefeito João Dória e tantos outros meninos mimados.
Espiral de Ilusão vai, certamente, dividir opiniões entre os fãs, tal como já foi entre a própria crítica especializada, mas é, sem sombra de dúvida, mais um indício de que Criolo quer e precisa expandir seu repertório e que, com isso, nos entregará obras ricas.