Geralmente, quando vemos adolescentes sendo retratados na televisão, logo percebemos o tom didático, quase catequista: não fume, não beba, não faça sexo, não desrespeite seus pais. Por isso, várias gerações de adolescentes brasileiros riram quando o elenco de Malhação pediu uma rodada de suco para a galera no Gigabyte. Mas isso não é diferente das produções norte-americanas. Embora arriscando um pouco mais, séries como Dawson’s Creek, The O.C e One Tree Hill abordavam temas como drogas, sexo e relacionamento com os pais, mas sempre envoltos por um julgamento claro, ditando o certo e errado, sem contar os atores bem mais velhos interpretando personagens mais novos.
Eu tinha 18 anos quando assisti a primeira temporada de Skins – Juventude à Flor da Pele (2007), série britânica transmitida no Brasil pela HBO. Embora eu já estivesse no fim da adolescência e não tivesse vivido nem metade do que é retratado na tela, lembro de ter achado tudo tão incrível e inovador que facilmente decretei: melhor série adolescente da história. Pois bem, oito anos depois e cada vez mais perto dos 30 anos, decidi rever a primeira temporada e algumas coisas mudaram de lá para cá.
A série foi o único programa que desejou falar com jovens sem fazer isso por meio de críticas.
Criada por Bryan Elsley e Jamie Brittain (pai e filho), o primeiro ano de Skins conta a história de um grupo de amigos, entre 16 e 18 anos, que vive em Bristol, na Inglaterra. São eles: Tony (Nicholas Hoult), um atraente e popular garoto; sua namorada Michelle (April Pearson); um garoto muçulmano chamado Anwar (Dev Patel, do longa Quem quer ser um milionário?); Maxxie (Mitch Hewer), jovem dançarino e melhor amigo de Anwar; Cassie (Hannah Murray, de Game of Thrones), uma garota com transtornos alimentares; Sid (Mike Bailey), atrapalhado melhor amigo de Tony; Chris (Joe Dempsie) despreocupado e inconsequente; Jal (Larissa Wilson), uma garota com problemas familiares; e por fim, Effy (Kaya Scodelario), irmã de Tony.
O que mais grita em Skins é a urgência adolescente. A intenção nunca foi a de mostrar histórias mornas ou jovens com uma grande crise de consciência, pelo menos não em sua primeira temporada. Então, vemos atores interpretando personagens muito perto de suas idades reais e falando diretamente com seu público-alvo, sem nenhum tipo de julgamento. Escrita por um time de roteiristas jovens, jamais vemos diálogos existenciais e filosóficos como víamos em Dawson’s Creek ou personagens ricos e bêbados fugindo para o México como em The O.C. Mas nos deparamos com adolescentes fazendo burradas típicas, muito sexo, muita maconha e muita bebida. Quase um Trainspotting semanal.
Obviamente, afirmar que essa é a realidade de todo e qualquer jovem seria uma generalização injusta. Porém, a grande sacada de Skins foi reverberar o que a cultura pensa dos adolescentes. Mesmo que o público não compartilhe as mesmas experiências, é muito fácil se projetar naqueles personagens, podendo ser “jovem de verdade”, pelo menos por 40 minutos. Skins pegou a noção cultural do que é ser adolescente e adaptou à realidade inglesa, dialogando com o mundo todo.
Mas Skins seria facilmente esquecida caso focasse apenas em “sexo, drogas e música britânica”. Embora seja vendida assim, um olhar um pouco mais atento perceberá que a série foi o único programa que desejou falar com jovens sem fazer isso por meio de críticas. O roteiro não se utiliza de eufemismos para mostrar seus problemas. Em Skins temos vilões reais, como anorexia, tabus religiosos, depressão, sexualidade, abandono familiar, dentre outros. Tudo é mostrado por meio do olhar daqueles personagens. Assim, os adultos são retratados como caricatos e completamente alheios ao que acontece ao redor.
Skins não quer entregar nenhuma grande mensagem, mas as atitudes daqueles personagens acabam fazendo o público refletir. Pouco a pouco vemos os jovens amadurecendo, sem a necessidade do didatismo. Dedicando um episódio para cada um, a série consegue desenvolver a característica de todos com calma.
Mas como eu disse lá no início do texto, minha visão sobre a série mudou um pouco de uns anos para cá e essa é a beleza de rever algo depois de quase uma década. Skins poderia ser muito mais relevante caso se levasse a sério. Na ânsia de mostrar a realidade, a série peca por exagerar e criar situações forçadas. Com a intenção de chocar, os roteiristas deixam de explorar plots densos para focar em cenas cômicas, como o episódio em que priorizam uma subtrama boba de uma ninfeta russa ao invés de explorar o conflito entre o garoto heterossexual e religioso que começa a questionar se deve continuar a andar com seu melhor amigo, dançarino e gay.
Mas, de repente, me dei conta que, na verdade, eu é que não conseguia me conectar diretamente com aqueles personagens como há oito anos. Ainda que os exageros irritem, é nessa fase em que tudo costuma ser genuinamente exagerado e uma situação que poderia ser resolvida facilmente, acaba virando uma bola de neve de drama. A insatisfação natural de cada um deles e a tentativa de resolver tudo da pior maneira possível – e mais intensa – acaba deixando aqueles adolescentes perfeitamente críveis.
A beleza de Skins está em justamente trazer uma abordagem da adolescência nada moralista. O que vemos é uma produção que deseja provocar o público a sentir a juventude à flor da pele. As melhores cenas de Skins não são sobre drogas, tramas exageradas e sexo desenfreado, mas sobre o turbilhão de emoções que dominam essa fase da vida. Com um balanço muito eficiente entre a juventude quase infantil e a chegada da vida adulta, Skins pode conquistar tanto os jovens de 16 anos quanto os adultos mais nostálgicos.
Os americanos até tentaram emplacar uma versão, produzida pela MTV em 2011, mas não convenceu, durando apenas uma temporada. A série original e completa está disponível na Netflix. Independente da idade, sérias boas merecem ser vistas.