Anunciado a altos brados como o “reality show mais esperado do ano”, o programa A Fazenda 11 finalmente estreou na Record TV, cercado de uma estrondosa estratégia de marketing que se fundamentava na expectativa em torno de seu casting. Nos próximos meses, poderemos acompanhar diariamente as desventuras dos “peões” (alcunha dos participantes deste reality, tal como os brothers em Big Brother Brasil) dentro desta atração que, orgulhosamente, se define como trash TV, como aquele tipo de televisão que só faz sentido justamente pelo baixo nível das cenas exibidas (tretas, barracos, baixarias, etc.).
Confesso que, ao longo de todos estes anos, nunca parei para assistir a este reality show, uma vez que as atrações do mesmo tipo são vastas e já consomem tempo suficiente na vida útil de qualquer cidadão. Porém, uma espiada nesta primeira semana de programa já traz algumas pistas sobre qual é a graça de A Fazenda. Sendo assim, é possível tentar entender porque o show angaria tantos fãs, tornando-se uma espécie de atração cult inesperada da TV. Por isso mesmo, ainda que cansativa em vários aspectos (como todo reality show de convivência, é um programa sobre nada), A Fazenda tem algo de particularmente irresistível.
Para começar, A Fazenda carrega um “autodeboche” ao celebrar tudo aquilo que há de mais execrável na televisão: a fama pela própria fama, a repercussão acerca de assuntos inúteis, a humilhação pública e a destruição da própria reputação em troca de algum dinheiro (ou ao mesmo de alguma visibilidade que possa rentabilizar posteriormente). Se o “primo rico” Big Brother Brasil é uma espécie de corrida pela fama dando em troca a própria privacidade, A Fazenda configura uma segunda chance para os que já perderam a primeira corrida (não por acaso, muitos participantes são provindos de outros reality shows).
A Fazenda carrega um ‘autodeboche’ ao celebrar tudo aquilo que há de mais execrável na televisão: a fama pela própria fama, a repercussão acerca de assuntos inúteis, a humilhação pública e a destruição da própria reputação em troca de algum dinheiro.
Ao longo dos anos, o programa foi sendo moldado para se tornar uma galeria que resgata e expõe personalidades que parecem ter zero interesse na autopreservação. Tem algo de Casa dos Artistas, o saudoso reality show do SBT que “furou” a primeira edição de Big Brother Brasil, e trazia a mesma premissa a partir de celebridades – mas em A Fazenda, há o adicional da temática rural, que não é muito relevante na trama, mas busca colocar os participantes em obrigações esdrúxulas na “roça” (na verdade, parece mais uma casa luxuosa ou uma “chácara” de classe média alta). Além disso, o programa trouxe à baila elementos cult da própria história da TV (como Gretchen, Monique Evans, Rita Cadillac), ao mesmo tempo que criou novos objetos de culto (como Theo Becker e Nadja Pessoa, construídos enquanto vilões cujos vídeos os replicam eternamente como “totens” da trash tv).
A sacada fundamental de A Fazenda 11 é conseguir juntar um elenco que se apresenta como um verdadeiro crossover de vários programas trash de outras emissoras e da própria Record TV, temperados por algumas celebridades orgânicas da internet. Vejamos alguns: Drika Marinho é recém-saída de Power Couple, outro reality da Record, e ganhou mais fama após o término do programa por causa da traição de seu marido; Diego Grossi, também egresso de Power Couple e Big Brother Brasil, é uma espécie de profissional de reality shows; Tati Dias e Bifão participaram do De férias com o ex, na MTV; Thayse Teixeira entra na cota dos influencers da internet e se define como a “dona do Cariri”; Guilherme Leão também provém da internet, onde foi viralizado como o “segurança gato do metrô”. Há ainda uma ex-panicat, uma ex-miss, um DJ e um ex-comediante.
Em suma, o elenco parece ter sido escolhido a dedo para agradar a todos os potenciais interessados na trash TV. Os “nichos” parecem representados pelos peões. As duas moças de De férias com o ex (um dos programas mais surreais já veiculados na televisão) representam, possivelmente, uma geração millenium. Hedonistas, com um discurso visual body positive e cobertas de tatuagens, Tati e Bifão prometem trazer o teor “pegação” fundamental para este tipo de reality. As mulheres, aliás, prometem comandar o show: os homens do elenco parecem todos a mesma pessoa, insípidos, exalando irrelevância. Exceção feita, talvez, para os “veteranos” Rodrigo Phavanelo, ator, o ex-jogador Túlio e o ator de Cidade de Deus Phelippe Haagensen.
Como todo reality show que se preze, a condução é fundamental, e Marcos Mion (embora um tanto exagerado nos trejeitos) parece levar bem esse papel, muito melhor que o antecessor Roberto Justus – justamente por não se levar tão a sério e ter já uma conexão com o humor e a televisão de má qualidade (vale lembrar que ele protagonizava o Piores Clipes do Mundo na MTV). No entanto, ainda falta alguma espontaneidade e rapidez a Mion: no primeiro episódio, foi chamado de Bial por Túlio e só conseguiu “reagir” alguns minutos depois da gafe. Para nosso deleite, que venham ainda muitas gafes por aí.