Quem disse que a HBO não pode fazer novela? Quando não há muita novidade para contar em uma história, o foco precisada estar ainda mais nos personagens e no roteiro, que deve caminhar inteligentemente pelo terreno do clichê para contar a mesma coisa de sempre, mas maneira atraente. Succession, indicada a melhor drama no Emmy 2019, não só faz isso brilhantemente como consegue reunir personagens medonhos que nos despertam, de alguma forma, a empatia. Ou ao menos pena.
Criado pelo britânico Jesse Armstrong (In the Loop, Veep), Succession conta a história da família Roy, que comanda o quinto maior conglomerado de mídia de entretenimento do mundo. É como se eles fossem a Rede Globo, mas os negócios vão desde canais de TV até parques temáticos. Logan (Brian Cox) é o pai e dono do império, um homem bem sucedido, mas conhecido por sua dureza. No alto de seus 80 anos, ele tenta preparar calmamente sua sucessão. O mais indicado a assumir é Kendall (Jeremy Strong), filho esforçado que tenta seguir os passos do pai, ao mesmo tempo em que precisa relutar contra a resistência da velha guarda por mudanças.
Os problemas (ou a diversão) da série começam quando Logan, que estava prestes a anunciar sua aposentadoria e indicar o filho, não apenas revela que está disposto a continuar por muito tempo à frente da empresa, como joga o próprio filho para escanteio. Mas tudo muda quando o patriarca sofre um derrame cerebral e as ações da companhia despencam.
Outros filhos estão na jogada, como Roman (Kieran Culkin, irmão de Macaulay Culkin), um bon vivant que não entende nada da empresa, mas quer surfar nos lucros; Shiv (Sarah Snook), uma articuladora política que usa o poder da família para eleger candidatos; Connor (Alan Ruck), o isentão que só quer ficar numa boa usufruindo do dinheiro; e Greg (Nicholas Braun), jovem sobrinho de Logan, que tenta entrar no círculo de riquezas da família, mas é apenas humilhado por todos.
O ritmo da série é daqueles que te deixam tensos no sofá.
Não se engane pela sinopse. Parece enfadonha e burocrática, mas o ritmo da série é daqueles que te deixam tensos no sofá. A relação da família é extremamente tóxica e violenta, mesmo sem ter muitas cenas de agressão. A dinâmica entre todos os personagens funciona de maneira orgânica e os diálogos são afiados, por vezes engraçado, mas na maioria das vezes violento. A cada movimento somos levados a pequenas reviravoltas dentro das cenas, que deixam a narrativa nervosa, quase como se estivéssemos assistindo a um reality show em que um precisa derrubar o outro.
Sim, ninguém presta, mas há algo comovente na relação daquelas pessoas. A família é abominável e não respeita ninguém, mas ao mesmo tempo há um certo carinho e admiração entre eles, seja quando todos se preocupam com o bem-estar do patriarca ou quando os personagens parecem carregar um bom coração ao não concordar com certas práticas. Succession consegue humanizar seus personagens sem que as ações soem deslocadas de suas próprias personalidades horrendas.
A série pode te lembrar diversas outras produções, já que é o mais recente Rei Lear na TV. A câmera trabalha em zoom como se estivéssemos vendo a família de Arrested Development ou algum episódio de Veep; o roteiro mais parece uma versão melhor acabada de Dinastia ou Dallas; o enredo lembra muito Empire e o protagonista pode ter relances de Tony Soprano. Nada disso, porém, tira a diversão.
Com personagens solitários e um ritmo de dar inveja a qualquer série de ação, a produção da HBO é um drama adulto e mais uma da das produções imperdíveis do canal, que este ano parece ter caprichado ainda mais na qualidade de seus roteiro. E embora o glamour esteja presente em 100% das cenas, Succession faz a riqueza parecer ridícula.