Outro novembro começando e, mais uma vez, estamos no “Mês da Escrita do Romance”. O Nacional Novel Writing Month (ou NaNoWriMo, para os íntimos) tem se tornado o momento em que diversos escritores e aspirantes criam coragem para separar um pouco do seu tempo e escrever, durante os 30 dias seguidos do mês, a primeira versão de um romance de 50 mil palavras – o que dá cerca de 175 páginas.
A quantidade chega a assustar: são 1667 palavras por dia, quase 6 páginas. No entanto, a cada ano que passa, mais e mais pessoas enfrentam o desafio e acabam completando a meta (bom, a maioria pelo menos tenta, não é?). No ano passado, eu escrevi sete dicas básicas para aqueles que queriam começar e precisavam de dicas.
Para essa semana, eu terminei a leitura de Story, escrito por Robert McKee. Apesar do livro ter como foco a escrita de um roteiro de cinema, o que McKee faz é discutir a estrutura de narrativas em geral – seja de roteiros, peças ou romances. De uma maneira bem rude, o que vou tentar fazer é reunir algumas dicas básicas dele para quem quer se aventurar no NaNoWriMo.
Estruturas da Estória
Robert McKee explica que as estórias são moldadas de acordo com uma estrutura, que nada mais é do que uma seleção de eventos organizada de maneira estratégica com o objetivo de mostrar a vida de um personagem ao mesmo tempo que estimular emoções ou expressar pontos de vista para o público. O que define o evento é a presença de uma “mudança significativa na vida de uma personagem”, expressa e determinada em termos de valor.
O que isso quer dizer? Uma narrativa é composta não pela totalidade da vida de alguém, mas pela organização de situações que marcam mudanças em sua trajetória, como um casamento, uma demissão ou um acidente grave. Esses valores que ele cita (bastante) ao longo do livro não são nada mais do que “qualidades universais da experiência humana” que variam do positivo para o negativo e vice-versa. Da saúde para a doença, da solidão para o amor, ou do sucesso para a derrota.
Esses eventos são organizados e trabalhados na narrativa de acordo com sua complexidade, irreversibilidade e pelo grau da mudança de comportamento. Desde unidades menores, como os Beats (que são como rápidas mudanças de humor em um diálogo), passando pelas Cenas e as Sequências, e chegando aos Atos. Quanto “maior” o seu índice na escala, mais irreversível é a mudança que o protagonista sofre. Dessa maneira, a história narrativa vai de maneira crescente até o Clímax do Último Ato, que deve trazer em si uma mudança absoluta e irreversível.
Conflitos, Incidente Incitante, Crise e Clímax
No entanto, para que esses eventos façam sentido para o público e enriqueçam a narrativa, é preciso que a história tenha conflitos, uma presença constante de forças antagonistas. Segundo McKee: “A função da estrutura é prover pressões progressivamente construídas que forçam o personagem a enfrentar dilemas cada vez mais difíceis, fazendo escolhas de risco e tomando atitudes cada vez mais difíceis, gradualmente revelando sua verdadeira natureza”.
Na estória, nos concentramos naquele momento, e apenas naquele momento, no qual uma personagem toma uma ação esperando uma reação útil ao seu mundo, mas, ao invés disso, o efeito de sua ação é provocar as forças do antagonismo.
Dessa maneira, os conflitos que fazem a história andar são construídos de acordo com a seguinte lógica: Expectativa > Forças do Antagonismo > Brecha. Por exemplo: em uma cena de perseguição, a personagem se encontra em um beco sem saída e pega o telefone na expectativa de pedir ajuda, mas se frustra ao perceber que o telefone não tem sinal. No entanto, ao ativar a luz do celular, ela encontra um bueiro no chão e consegue escapar.
Para complexificar essa cena e dar mais profundidade ao personagem, poderíamos adicionar um dilema: fugir sozinha ou ficar com seus amigos? Dessa forma, a lição que passa é: quanto mais riscos, mais importante é o objeto de desejo. Para ajudar, você pode tentar localizar os conflitos que em diversos níveis: são conflitos internos e subconscientes? São contra instituições? Ou contra forças maiores da natureza?
Três eventos devem ser destacados no momento da sua história: (1) O Incidente Incitante, que é o primeiro evento que desarranja radicalmente o equilíbrio na vida do(a) protagonista. É o momento em que não é há mais possibilidades de empurrar para baixo do tapete, só existe a mudança. Como a reação humana padrão é tentar manter as situações dentro da zona de conforto, cada escolha precisa se tornar cada vez mais complicada para o protagonista, até o momento da (2) Crise, cuja resolução é o (3) Clímax da história – uma mudança tão profunda para o protagonista que toca o público de maneira mais intensa.
Essa projeção é feita de maneira progressiva, Cena a Cena. Cada uma delas deve trazer em si um ponto de virada: uma surpresa, a intensificação da curiosidade, uma nova interpretação de um fato ou a mudança no caminho da história. Para McKee, as boas cenas de um roteiro devem trazer algum desses elementos… caso contrário, corte-a.
Rotina
Para organizar todas essas informações e colocar a mão na massa, Robert McKee sugere o seguinte fluxo de trabalho:
- Faça uma Step-Outline: Estruture toda a sua história em tópicos, passo a passo, até achar o Clímax e finalizá-la.
- Reescreva essa Step-Outline: Faça o caminho reverso e ajuste o trajeto do Clímax ao Incidente Incitante.
- Conte a História: Separe alguém para uma conversa de 10 minutos e conte a história em voz alta. Se funcionar, vá para o próximo passo.
- Argumento/Rascunho: Faça um rascunho mais elaborado de cada cena. Escreva as ações dos personagens e veja o que funciona. No caso do romance, evite marcações de cenário e diálogos. Se necessário, desenvolva um pouco das digressões internas.
- Faça a Primeira Versão Final.
Agora, mãos à obra!
STORY | Robert Mckee
Editora: Arte & Letra;
Tradução: Chico Marés;
Tamanho: 430 págs.;
Lançamento: Janeiro, 2006.