“Este programa espantosamente popular iniciou a tendência da reality televisivion – não tem apenas 16 estranhos brigando entre si. Em torno de cada episódio cuidadosamente engendrado, surge uma competição paralela – um gigantesco jogo de gato e rato entre os produtores e o público. Toda semana, os resultados ansiosamente aguardados são tema de conversa na hora do cafezinho e divulgados como notícia até nas emissoras concorrentes. É televisão para a era da Internet – feito para ser discutido, dissecado, debatido, previsto e criticado”.
O texto reproduzido acima, do autor Henry Jenkins, fala do programa Survivor, da CBS norte-americana, veiculado desde 2000 (no Brasil, chegou a existir por curtas temporadas na Globo com o nome No Limite). No entanto, poderia muito bem descrever o que já vimos de Big Brother Brasil 21, que se inicia hoje – e, como o título desse artigo indica, já começou bem antes do programa ir ao ar.
A quantidade de conversação que este reality show gerou antes de estrear é simplesmente fenomenal. Aparentemente, a Globo conseguiu adequar-se, a partir de BBB21 (o que não significa que estas estratégias começam aqui) aquilo que Henry Jenkins chamou de “cultura da convergência” e via, nesse livro de 2008, como o futuro do entretenimento: o surgimento de produtos cada vez mais multimidiáticos, conectados entre si por diversos fios narrativos e, acima de tudo, dependendo diretamente do engajamento com o público para poder “vingar”.
Vejamos: no BBB21, a expectativa da audiência em torno dos participantes se iniciou há muito tempo. Em 2020, o programa inseriu uma nova estratégia, bastante arriscada, mas que foi muito bem-sucedida: dividiu o elenco entre pessoas famosas (“camarote”) e anônimas (“pipoca”). O risco era de que as celebridades protagonizassem o BBB ou então engessassem as performances, por serem pessoas extremamente preparadas para controlar sua imagem pública. Felizmente, isso não aconteceu – inclusive, a interação viva entre famosos e desconhecidos trouxe um sabor a mais à atração.
A quantidade de conversação que este reality show gerou antes de estrear é simplesmente fenomenal. Aparentemente, a Globo conseguiu adequar-se, a partir de BBB21, àquilo que Henry Jenkins chamou de “cultura da convergência”.
A jogada foi importante porque, a partir de então, o público pode começar a se engajar com o próximo BBB assim que o programa termina: começam a sonhar com quais famosos querem que estejam na edição e especular possíveis nomes. Outro ganho à emissora: podem apostar nas webcelebs, como aconteceu no BBB20 e BBB21, trazendo para a televisão um público bastante engajado nas redes sociais e que já estava afastado dela. Uma jogada de mestre.
Com a aproximação de uma nova edição, portanto, o jogo começou a esquentar. As redes entraram em polvorosa com especulações diversas sobre o elenco. O que os emojis postados por Boninho querem dizer? O influencer tirou foto em tal lugar – isso significa que ele está confinado? Fulano desapareceu das redes, será que ele foi selecionado? Em resumo, configurou-se um delicioso “jogo de gato e rato”, pegando carona na expressão usada por Jenkins, em que nós, os espectadores, estamos perfeitamente conectados e inseridos nesse universo do BBB – sem que o programa tenha nem começado ainda.
Para completar, a cereja do bolo: a experiência do BBB21 se tornou tão atraente que até os próprios jornalistas e produtores de conteúdo começaram a alimentá-lo. Pouco importa se o que se fala é real ou não. Numa entrevista impagável concedida ao canal do jornalista Chico Barney, uma suposta participante banida do programa presta seu depoimento surreal e conta que teria saído da Globo para fundar uma nova emissora, a “Globe” – e surge, quase que imediatamente, um novo verbete para o “BBBverso”, apropriado, inclusive, pela própria Globo, num crossover perfeito.
Nesta semana, começa por fim o BBB21, embora ele já tenha começado muito antes, conforme já dito. Já há torcidas estabelecidas, fandoms, cancelamentos. Isso significa que o programa será bom? Não há como saber, pois reality shows de convivência são sempre uma incógnita, para nossa alegria. Sucedendo ou não, uma coisa é certa: a Globo parece, mais uma vez, estar ofertando com maestria o tipo de entretenimento que queremos.