A direção do cineasta canadense Denis Villeneuve faz toda a diferença em Duna, ficção científica baseada no romance homônimo do escritor norte-americano Frank Herbert, publicado em 1965. Embora o filme, em cartaz desde a semana passada, tenha problemas de roteiro – é excessivamente longo, por vezes até redundante, com algumas cenas que pouco ou nada acrescentam à trama -, a mise-en-scène do diretor de A Chegada (2016), que escapa à obviedade, criando momentos de encantamento na tela, oferece ao espectador um filme belo, intrigante, ainda que imperfeito.
Menos focado na ciência e na racionalidade, ou mesmo na ação, Duna, que já havia tido uma versão para o cinema em 1984, assinada por David Lynch (de Cidade dos Sonhos), torna-se, pelas mãos de Villeneuve, um espetáculo para os sentidos.
Fotografia, direção de arte, figurinos e efeitos visuais estão à serviço de uma proposta estética: oferecer uma experiência sensorial ao público disposto a embarcar no ritmo mais lento e contemplativo da narrativa, para imergir em uma outra dimensão. Há na obra de Herbert, mais do que uma aventura, uma jornada transcendental. E isso o cineasta soube trazer muito bem para a sua adaptação.
Fotografia, direção de arte, figurinos e efeitos visuais estão à serviço de uma proposta estética: oferecer uma experiência sensorial ao público disposto a embarcar no ritmo mais lento e contemplativo da narrativa, para imergir em uma outra dimensão.
Toda a trama é construída em torno de uma figura messiânica: Paul Atreides, vivido de forma ao mesmo tempo intensa e contida por Timothée Chalamet (de Me Chame pelo Seu Nome). Herdeiro da Casa Atreides, num futuro distante, tanto geográfica como temporalmente. Nesse espaço-tempo, a estrutura política é medieval, há tecnologia, mas os computadores são proibidos, porque existem humanos com habilidades mentais que os substituam.
No início do filme, o duque Leto Atreides (Oscar Isaac, da mais recente trilogia Star Wars) recebe do imperador um novo domínio: o planeta Arrakis. Coberto por um deserto, o que justifica o nome Duna, esse corpo celeste é o único em todo o universo capaz de produzir uma especiaria essencial às viagens espaciais, um pó mágico também responsável pela alteração das percepções, viagens sensoriais.
Vivida pela atriz sueca Rebecca Ferguson (de Missão Impossível 5 e 6, a mãe de Paul pertence a uma ordem de feiticeiras e ela sabe que o filho talvez seja o escolhido para salvar o império do poderio da Casa Harkonnen, que, por 80 anos, controlou Duna, faturou muito dinheiro com a especiaria e hostiliza a população local, os fremen, nativos de pele escura que se organizam de forma tribal.
É impossível não enxergar em Duna uma metáfora, já evidente no livro que a originou. Arrakis seria o Oriente Médio, o fremen os povos árabes do deserto e os Harkonnen os colonizadores brancos, mercenários e indiferentes à cultura e ao meio ambiente. Seu líder, o barão Vladimir Harkonnen (o também sueco Stellan Skarsgard, de Ondas do Destino), é um vilão cruel, desprezível e glutão.
Com duas horas e 35 minutos de duração, Duna, que cobre apenas a primeira parte do romance original, se alonga demais em algumas sequências desnecessárias e não dá conta de apresentar devidamente personagens importantes, vividos por Josh Brolin, Javier Bardem, Charlotte Rampling e Zendaya, jovem estrela do momento. Talvez esse problema seja corrigido na continuação. Ou não.
A despeito desses problemas, Duna é muito envolvente, para quem se deixa capturar pela visualidade das estonteantes geografias criadas por Villeneuve, onde há naves biomimetizadas que se assemelham a insetos e vermes gigantescos se escondem nas areias escaldantes do deserto, sempre à espreita.