O diretor Lenny Abrahamson ganhou a atenção do público de vez com o longa O Quarto de Jack, estrelado por Brie Larson, pelo qual recebeu uma indicação ao Oscar de melhor diretor. Porém, foi Frank, seu filme anterior, lançado apenas meses antes, que pode ser considerado sua estreia nos grandes circuitos e festivais.
Jon (Domhnall Gleeson) é um jovem aspirante a músico que, por um acaso do destino, está no lugar certo e na hora certa quando a excêntrica banda The Soronprfbs precisa de um tecladista. O vocalista e líder (em todos os sentidos, inclusive espiritual) é Frank, um sujeito que usa uma cabeça gigante de papelão 24 horas por dia e 7 dias por semana, e que desperta a devoção de todos à sua volta com sua genialidade artística. A partir daí, Jon é convidado a seguir com a banda enquanto eles gravam seu disco em um local recluso e em meio às bizarrices do processo criativo de Frank.
Mesmo tendo um elenco de respeito, encabeçado por Maggie Gyllenhaal (The Deuce, Batman: O Cavaleiro das Trevas) e Gleeson (Ex Machina, Star Wars: The Last Jedi), é no mínimo corajoso escalar um dos maiores nomes do cinema na época e o esconder sob uma cabeça de papelão por 98% do filme. É até por isso que, ainda que não seja um spoiler e o nome do ator esteja em qualquer referência do longa, vou optar por não citá-lo. A expectativa e curiosidade de se descobrir somente no final o verdadeiro rosto de Frank é um bônus agradável que tive e não gostaria de privá-los disso. Quem sabe, sabe. Quem não sabe, melhor ainda.
A comédia, ainda que divertida em suas peculiaridades e ao tirar sarro da pretensão que bandas alternativas parecem sempre ter, é tão desconstruída e pretensiosa quanto os colegas de banda de Jon.
A comédia, ainda que divertida em suas peculiaridades e ao tirar sarro da pretensão que bandas alternativas parecem sempre ter, é tão desconstruída e pretensiosa quanto os colegas de banda de Jon.
Clara, personagem de Gyllenhaal, é a epítome da artista blasé, com uma eterna expressão de desprezo e “não impressionada” com nada que o novato apresente. Baraque (François Civil) é o baixista francês que se recusa a falar em inglês e Nana (Carla Azar) é a baterista que mais parece uma adolescente gótica rolando os olhos frequentemente [ou a Ravena de Jovens Titãs, alguém?]. Don (Scoot McNairy), o integrante que convidou Jon a se juntar à banda, parece ser o mais lúcido, só para descobrirmos que ele também tem os mais profundos problemas psicológicos.
Frankfaz rir com um humor que varia constantemente entre a ironia sagaz e o absurdo das situações. Sua premissa em si já é particular o suficiente para ser considerada (ao menos no senso comum) algo que só veríamos em filmes independentes, assim como o ritmo que o longa assume em alguns momentos.
Dito isso, toda a subtrama sobre doenças mentais, identificadas mais explicitamente nos personagens de Don e Frank, não é nada engraçada e gera momentos completamente destoantes do tom do filme. É como se ele nos lembrasse que a “loucura” alheia nem sempre pode ser tratada como uma piada.
Ah, digo subtrama porque a história mais superficial e linear da sinopse é o desejo de Jon não só em se tornar um artista, mas em ter reconhecimento, vontade que seus companheiros nunca tiveram.
Ao assistir, tenha em mente que não se trata de sua comédia tradicional e que, assim como seus personagens, Frank (o filme e também o personagem) vai exigir um pouco de paciência para superar seus rompantes de pretensão e exagero. Está escondido no catálogo da Netflix mais próxima de você.
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