Logo que os primeiros fotogramas de Projeto Flórida (2017) começam a deslizar na tela, o que o espectador presencia é um menino correndo e chamando seus amigos aos gritos. O tom não é de desespero, mas de urgência inocente, aquela urgência animada de quem tem algo muito importante para compartilhar com um grande companheiro. A resposta vem na mesma intensidade, daquela forma empolgada que crianças costumam fazer, sem qualquer economia no uso de decibéis.
A cena é bem corriqueira, cotidiana, comum, mas não é por esses adjetivos que deixa de encantar. E isso deve-se, principalmente, pela simplicidade com que o relacionamento entre os pequenos é mostrado e pela desenvoltura dos atores. Essa cena de abertura é capaz de dar o tom de boa parte do filme, uma vez que a produção investe tanto no minimalismo quanto na naturalidade para exibir uma espécie de celebração da infância livre, feliz e ingênua. A música “Celebration”, de Kool & The Gang, acompanha a projeção dos créditos iniciais e reforça essa atmosfera de festa.
Há um momento em que o roteiro começa a investir na porção menos feliz e celebrativa do universo dos personagens. Assim, a história deixa de deslizar para o monótono e ingressa ainda mais no realismo.
Projeto Flórida conta a história de Moonee, interpretada por Brooklynn Prince. Ela é uma garotinha de seis anos que faz amizades nas proximidades dos parques Disney, numa região marcada por conjuntos habitacionais pobres. É num deles, gerenciado por Bobby, vivido por Willem Dafoe, que ela mora com a mãe Halley, interpretada por Bria Vinaite. Halley tem uma ótima convivência com a filha, apesar de estar sempre sob a pressão da falta de dinheiro.
Houve quem definisse Projeto Flórida como “agridoce”. Difícil negar que, realmente, essa é uma palavra bastante oportuna para referir-se a este trabalho do diretor Sean Baker, conhecido por Tangerine (2015). A razão é simples. Em certo momento, a projeção passa a ficar cansativa e repetitiva pelo fato de mostrar única e exclusivamente as travessuras e a liberdade de um grupo de crianças transitando pelos arredores de onde moram. Mas há um momento em que o roteiro começa a investir na porção menos feliz e celebrativa do universo dos personagens. Assim, a história deixa de deslizar para o monótono e ingressa ainda mais no realismo, lembrando que nem só de festa e inocência é construída uma infância (ou a vida como um todo, para expandir a análise).
Mais que o roteiro, é o talento tanto dos atores quanto da direção em conduzir o elenco mirim que transforma essa produção em uma experiência de impacto. Impacto, aliás, é o que o espectador mais sensível terá ao deparar-se com a cena final.
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