Acredito que uma boa forma de encarar um programa televisivo é vê-lo como um relacionamento. Existem altos e baixos, por vezes alguns problemas parecem incontornáveis, mas nós fazemos o que for possível para que dê certo. Em um seriado, assim como em um relacionamento, precisamos encontrar mecanismos que impeçam que haja um desgaste; tentar, como se diz costumeiramente, reinventar a relação.
A nova era da televisão, que tem como líderes involuntários os serviços de streaming como Netflix, Hulu e Amazon, provocou uma rachadura nas estruturas dos seriados de estúdio, aqueles que se utilizam de claque, como Friends, Seinfeld e boa parte dos principais programas de comédia da TV norte-americana nos últimos 20 anos.
Basta fazer um esforço de levantamento e notará que as principais séries cômicas da atualidade apostam suas fichas em roteiros mais elaborados, um humor mais inteligente e que não recorre ao uso do riso forçado. Veja bem, não é questão de juízo de valor, são apenas fatos. Ainda assim, a principal série de comédia da TV ainda utiliza de tal recurso. Mas nem a claque foi suficiente para salvar algumas das últimas temporadas de The Big Bang Theory.
Porém, parece que o número 9 é da sorte. A nona temporada de The Big Bang Theory, terminada recentemente, deu frescor ao programa, que já tem algumas temporadas renovadas pelas frente. Ao menos desde a quinta temporada, o show passou a sofrer inúmeras críticas, ainda que os números de audiência pudessem não evidenciar que havia uma crise. Aliás, nem sempre eles evidenciam.
The Big Bang Theory parece ter aprendido a mais dura lição: você precisa ter na manga estratégias para desenvolver seus personagens sem eliminar as características que os fizeram ídolos.
Piadas sem o mínimo de humor, ou pior, forçando o riso puxado pelo artíficio das palmas e risadas, tornaram o programa arrastado e um sacrifício de ser acompanhado. Em alguns pontos, chegou a parecer que havia preguiça da equipe de roteiristas, que foram criando trajetos que, no final, mostraram-se sem saída. Raj conseguindo falar com as mulheres, Sheldon namorando e muito mais humano e o relacionamento água com açúcar de Penny e Leonard estrangularam todo o alívio cômico de The Big Bang Theory.
Já nos episódios finais da oitava temporada foi perceptível o esforço do roteiro em tornar a série mais dinâmica e retornar algumas características dos personagens que haviam ficado em segundo plano. Mas foi agora na última temporada que, finalmente, voltamos a poder dar boas risadas com a falta de tato de Sheldon e as trapalhadas de Raj e Howard, além de assistirmos ao fortalecimento das personagens femininas, anteriormente deixadas em segundo plano, quase como uma deixa para que os quatro homens desfilassem seu humor.
Mesmo que ainda um pouco irregular, The Big Bang Theory parece ter aprendido a mais dura lição de seriados longos: você precisa ter na manga estratégias para desenvolver seus personagens sem eliminar as características que os fizeram ídolos do grande público. Soma-se a isso a importância da inserção de novos personagens, garantindo um respiro à trama.
Se, no passado, Amy (interpretada por Mayim Bialik) foi a chama de renovação para a série, desta vez Chuck Lorre e seus companheiros não precisaram nem ir longe. Kevin Sussman, o Stuart, passou a ser presença mais constante e, para nossa sorte, mostrou-se realmente um bom ator, entregando um trabalho corporal impressionante, fugindo de ser excessivamente caricato e dando personalidade a um personagem que era apenas um simples coadjuvante. Mesmo Raj mostrou que sua fase garanhão poderia garantir risadas, e Howard e Bernadette conseguiram propiciar o riso a um público que havia se tornado muito mais exigente.
Se ainda há um freio de mão puxado, ele responde pela dupla Leonard/Penny. É digno de menção que a atriz Kaley Cuoco não represente mais o estereótipo da mulher ignorante, apenas um objeto sexual. Contudo, não conseguiram encontrar ainda uma saída cômica para seu personagem, fazendo dos momentos em que está em cena com Johnny Galecki a parte mais difícil de ser digerida.
De toda forma, inegável que The Big Bang Theory deu bons sinais para o futuro. Torçamos para que se concretizem.