Completa 20 anos de lançamento em 2021 um dos títulos mais importantes do cinema latino-americano neste século: E Sua Mãe Também, filme do cineasta mexicano Alfonso Cuarón, escrito em parceria com seu irmão, Carlos Cuarón. Assim como Roma (2018), que deu ao realizador seu segundo Oscar de melhor direção (o primeiro foi por Gravidade), o longa-metragem tem forte conteúdo autobiográfico, ao mesmo tempo em que lança um olhar bastante cirúrgico sobre as relações entre classes no México contemporâneo.
E Sua Mãe Também tem como foco principal a complexa relação entre dois amigos, Julio (Gael García Bernal, de Diários de Motocicleta), um rapaz da classe média com uma irmã militante de esquerda, e Tanoch (Diego Luna, de Um Dia de Chuva em Nova York), filho de um grande empresário.
O confronto entre os dois mundos representados pelos protagonistas possibilita um retrato nervoso, intenso e bastante crítico de um sociedade que, como a brasileira, é muito estratificada, permeada por preconceitos e códigos que perpetuam estruturas que datam dos tempos coloniais. Embora Julio e Tanoch sejam aparentemente próximos, íntimos até, abismos os separam.
Em uma das sequências mais emblemáticas, e incômodas do filme, Tanoch, ao visitar o apartamento de Julio, vai ao banheiro e, sem o amigo vê-lo, evita a todo custo tocar o quer que seja, como se estivesse em território contaminado. Cuarón nos expõe a face mais horrível do classismo (e do racismo), como também o faria mais tarde em Roma.
Cuarón nos expõe a face mais horrível do classismo (e do racismo), como também o faria mais tarde em Roma.
O roteiro de E Sua Mãe Também, premiado no Festival de Veneza, se coloca, literalmente, em movimento quando entra em cena Luisa (vivida pela atriz espanhola Maribel Verdú, de Belle Époque), prima rica e cosmopolita de Tanoch que seduz os dois rapazes e os convida a fazer uma viagem de carro pelo país em direção à costa do Pacífico. Para ela, que sofre de uma doença grave, a jornada tem razões existenciais e, para os garotos, funcionará como um ritual de iniciação.
Ao saírem da Cidade do México, eles são confrontados pelos profundos contrastes sociais, econômicos e culturais do país, abismos que carregam dentro de si sem se darem conta. Nada será como antes após esse rito de passagem, que tem para o cinema contemporâneo a relevância, como retrato geracional, de filmes como o americano Juventude Transviada (1955), de Nicholas Ray, ou os filmes da saga de Antoine Doinel, de François Truffaut.
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