Bancado por meio de um financiamento coletivo, o documentário In Search of Darkness (2019) é uma produção de quatro horas que traça um panorama bastante amplo sobre o cinema de horror nos anos 1980. Dirigido por David A. Weiner, a obra é uma gigantesca carta de amor ao gênero e tenta construir a ideia de que havia algo especial nos lançamentos daquela época.
Para o filme, o diretor entrevistou nomes como Larry Cohen, John Carpenter e Joe Dante, que falam de suas carreiras. Também ouviu pessoas que cresceram com esses títulos, como o youtuber James Rolfe, o editor da Fangoria Phil Nobile Jr. e o produtor Ryan Turek. Tais depoimentos cumprem o papel de representar o público dentro da narrativa e mostram a força do período na formação de uma plateia de horror.
Ainda que esteja longe de ser perfeito, In Search of Darkness cumpre o papel de registrar o imaginário social desse recorte temporal na produção cinematográfica de gênero. Na extensa narrativa, há discussões sobre o tipo de riscos que os realizadores corriam com essas produções na época, sobre as barreiras de representações de gênero e sobre a criatividade dos cineastas e técnicos de efeitos especiais.
Assim como muitos dos entrevistados da ala dos fãs do documentário, também tive meu primeiro contato com essas produções ainda na infância – e na TV aberta, o que era pior.
Como parte de uma geração que cresceu com esses filmes, não deixo de achar envolvente o resultado alcançado pelo filme. Assim como muitos dos entrevistados da ala dos fãs do documentário, também tive meu primeiro contato com essas produções ainda na infância – e na TV aberta, o que era pior. Foi por meio deles que me apaixonei por horror, sentimento que, anos depois, me traria até esta coluna.
Reconheço, porém, que o imaginário retratado pelo filme é demasiadamente romântico. Em muitos aspectos, remete ao idealismo dos anos 80 projetado pela série Stranger Things. Na terceira temporada, as crianças de Hawkins estão em um cinema lotado para ver Dia dos Mortos (1985), tratado como uma estreia-sensação pelos personagens. Na vida real, o filme mal pagou as contas com a venda de ingressos na bilheteria norte-americana, ainda que tenha sido relativamente lucrativo no circuito internacional. Somente depois é que se tornou uma obra fundamental para o período.
Weiner parece fazer o mesmo que a série da Netflix quando destaca lançamentos como Bonecas Macabras (1987), Nasce um Monstro 3: Ilha dos Monstros (1987) e Halloween 4: O Retorno de Michael Myers (1988). Tais longas-metragens são cultuados, mas não seriam eleitos como os melhores representantes da década de 1980. São parte de um catálogo muito maior, cheio de obras com mais ressonância, como Sexta-Feira 13 (1980), O Iluminado (1980) e A Hora do Pesadelo (1984). Dar atenção para títulos que estão fora dos holofotes parece uma decisão política. Uma tentativa de interferir no imaginário, ajudando a construir essa magia que acompanha nossa percepção do que é o cinema de horror na década de 1980.
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Aproveitando o tema do texto, gostaria de anunciar que no segundo semestre sairá, pela editora Skript, a coletânea O Melhor do Terror nos Anos 80. O livro é organizado por mim, Euller Félix e Jéssica Reinaldo. Atualmente, está em campanha pelo catarse e toda ajuda é bem-vinda: https://www.catarse.me/terror80.