Não há como pensar o ser humano dissociando-o da cultura: somos essencialmente culturais. Ela é elemento chave na construção de uma identidade nacional, e está presente em tudo, sejam os temas que debatemos, os produtos que consumimos ou como eles permeiam nossas conversas diárias. Vemos o mundo a partir de nossa própria cultura.
Surgimos em um contexto de compreensão da cultura como processo em constante evolução, e no qual o verbete culturalizar, ou seja, forjar novos processos culturais, implicaria em voltar os olhos para si, de forma a compreender os costumes que guiam nosso comportamento.
A criação do Ministério da Cultura, no dia 15 de março de 1985, pelo Decreto 91.144 do então Presidente da República José Sarney, representava uma grande conquista de nossa recém-adquirida democracia. Não se pretende dizer que sem um Ministério não se faz cultura, contudo, já passamos pelo dissabor de ver o MinC extinto em capítulo recente de nossa história. Naquele momento, o Brasil assistiu pouco a pouco o desmonte do que compreendemos por cultura, caminhando para uma visão redutora desta, um desligamento dela para com o nosso cotidiano.
A fusão do Ministério da Cultura com o Ministério da Educação representa um retrocesso ao atingir os princípios básicos de sua existência, entre eles o da preocupação em democratizar a cultura a partir da ampliação do acesso aos bens culturais universais, de forma que cada um possa construir sua própria identidade. Como apontado pela pesquisadora de políticas culturais Maria Helena Pires Martins, da ECA/USP, “Ampliar a distruibuição e a compreensão da produção cultural, em vez de adaptá-la ou facilitá-la, enfraquecendo-a, permite que nós nos apropriemos de instrumentos de expressão e possamos construir uma consciência crítica diante do mundo em que vivemos.”
Um Ministério da Cultura forte em uma democracia forte possibilita não apenas que haja maior oferta e melhor distribuição cultural, mas é fundamental para que os indivíduos possam passar a fazer parte da vida cultural de nossa sociedade de forma ampla e diversificada, ou nas palavras de Maria Helena “formando o seu próprio ‘capital cultural'”.
A Escotilha se posiciona contrária à fusão por acreditar que a existência independente é o que permitirá uma democracia cultural que busque efetivamente fomentar a criatividade, dando a possibilidade para que todos os agentes culturais e sociais do país tenham voz, sejam reconhecidos e reconhecíveis, para que possamos sem risco mergulhar na pluralidade de visões de mundo que formam nossa identidade enquanto povo, mostrando o que temos de comum e o que nos torna únicos por sua especificidade.