Qual o papel da poesia no contexto das cidades brasileiras? Em busca desta resposta, a mesa “A Cidade e o Território”, com mediação do poeta e curador João Bandeira, abriu a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), tendo como convidados o antropólogo e poeta baiano Antonio Risério e o poeta carioca Eucanaã Ferraz.
Antonio Risério, para quem pensar em uma cidade ideal hoje é utopia e gasto desnecessário de tempo, defendeu que é preciso encarar a conurbação que vivemos atualmente. “A cidade grande corrompe. Não adianta ser a favor ou contra, caminhamos para uma cidade planetária”, comentou.
Durante sua fala, Risério analisou os centros das grandes cidades e citou a importância de preservar estes espaços, já que são um direcionamento ao futuro e não uma recordação do passado. “Temos que enfrentar a realidade e construir um chão compartilhável, uma narrativa comum”, afirmou. “Não há nenhuma catástrofe a caminho. A merda já aconteceu. Só nos resta tentar remendar a idiotice planetária que conhecemos”.
Arte e cidade deveriam fazer parte de um mesmo pensamento, um contaminando o outro.
Já Eucanaã Ferraz iniciou sua fala lendo versos de “Lira Paulistana”, poema de Mário de Andrade, autor homenageado na Flip deste ano. O poeta queria ilustrar como os modernistas da década de 1920 se posicionavam perante a cidade, abraçando a metrópole e permitindo o desenvolvimento que a poesia possui da cidade. “Quando eu morrer quero ficar / Não contem aos meus inimigos / Sepultado em minha cidade / Saudade”.
Ferraz acredita que cidade e arte precisam caminhar juntas, já que, segundo o poeta, não é possível enxergá-las de forma dissociada. “Arte e cidade deveriam fazer parte de um mesmo pensamento, um contaminando o outro”, disse. O escritor ainda compartilhou com o público a forma como enxerga a poesia. “A imaginação é um fato social. Eu quero pensar a poesia deste modo”, contou o poeta, muito aplaudido na sequência.
Em um momento curioso do debate, João Bandeira leu uma pergunta feita pela plateia referente às ciclovias construídas pela gestão do prefeito paulista Fernando Haddad. “São Paulo é um fenômeno socioterritorial específico. Você tinha a grosseria da engenharia da ditadura militar, que produziu o Minhocão, e todos os viadutos construídos por Paulo Maluf. Haddad é o primeiro prefeito da cidade que procura discuti-la de um ponto de vista urbanístico. A ciclovia não é o problema”, pontuou Risério. Sem se posicionar favorável ou contrário, o antropólogo encerrou sua fala arrancando aplausos e risos do público presente.
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