A literatura em hebraico ainda não recebeu – no Brasil e no mundo – a atenção merecida, sendo Amós Oz e David Grossman, em se tratando da produção contemporânea, os nomes mais influentes do país. Por isso, a publicação de Minotauro, de Benjamin Tammuz (1919 – 1989), ainda que o autor seja nascido na Rússia e tenha imigrado aos 5 anos para a Palestina, talvez ajude a aquecer o catálogo de autores israelenses e palestinos.
Publicado originalmente nove anos antes da morte do autor, Minotauro é a história de Alexander, um agente secreto que, ao completar 41 anos, entra em crise existencial. O encontro casual com Téa, que avista em um ônibus em Londres, passa a dar um novo sentido à sua vida. A partir desse momento, Alexander vive sobre o tênue limite do desejo e da obsessão, usando – literalmente – todas as suas armas para se aproximar de Téa.
Tammuz faz de seu livro uma perturbadora metáfora para o desejo humano. Se, por um lado, ele quer Téa a todo custo, por outro, quando a tiver nos braços, sua vida perderá novamente o sentido. Como em Um corpo que cai, de Hitchcock, e Trágica obsessão, de De Palma, a relação de Alexander com a sua musa é também uma tentativa, um ultimato, de ligação consigo mesmo.
O texto é intrincado e repleto de reflexões. Considerado por Graham Greene (1904 – 1991) o “romance do ano”, Minotauro vai muito além do spy novel e transita entre a filosofia e o entretenimento. Alexander não objetifica a mulher amada, ao contrário, estabelece uma idealização romântica, byroniana, ou seja, trágica e mística. Enquanto se atrela à Téa, por meio de cartas, busca descobrir o que (ainda) há de si próprio no mundo.
Existe um quê de desafio do autor para com o leitor. Os multiníveis de leitura, as entrelinhas, são parte fundamental para desvendar o real quebra-cabeça que Tammuz propõe.
Perspectivas
Minotauro é divido em quatro partes, cada uma dedicada a um personagem em específico – sendo a primeira a última a respeito das diferentes perspectivas da personalidade de Alexander. Tammuz é capaz engendrar zooms sobre suas criações, aproximando o leitor de seus personagens – como em Janela indiscreta ou O jogo da amarelinha.
Em uma lógica inversa e irônica, quem está no labirinto não é Téa, a menina indefesa, mas Alexander. Ele precisa percorrer cada um dos caminhos com cuidado e atenção. O livro é audacioso ao promover essa contrapartida.
Existe um quê de desafio do autor para com o leitor. Os multiníveis de leitura, as entrelinhas, são parte fundamental para desvendar o real quebra-cabeça que Tammuz propõe. Não há nada que não esteja ao alcance dos olhos, entretanto, é preciso saber observar. Com uma escrita primorosa, o autor oferece uma nova e sagaz caminhada da primeira à última página.
MINOTAURO | Benjamin Tammuz
Editora: Rádio Londres;
Tradução: Nancy Rozenchan;
Tamanho: 192 págs.;
Lançamento: Outubro, 2017 (2ª edição).