Reza a lenda que antes da estreia de Psicose (1960), Alfred Hitchcock mandou comprar todos os exemplares do livro de Robert Bloch disponíveis nas livrarias para que ninguém soubesse o final surpreendente antes de ver o filme.
Assisti ao longa algumas vezes, mas não consigo me lembrar se na primeira vez fui surpreendido de verdade pela revelação no terceiro ato. É bastante provável que a imagem de Norman Bates de peruca já estivesse tão incutida no imaginário do cinema de horror, que quando encarei o filme já soubesse que ele não era exatamente um gentleman. Já no livro, lançado aqui no Brasil pela editora DarkSide com tradução de Anabela Paiva, caso a pessoa não tenha informações prévias (o que é bem difícil hoje em dia), é praticamente impossível fazer uma suposição certeira antes de chegar pelo menos ao meio da narrativa.
Mas nem só de plot twist vive essa história. Embora boa parte dos enredos de suspenses policiais se sustente apenas no mistério de quem é o assassino, Psicose consegue fascinar também pela sua ambientação perturbadora (a casa é lazarenta de assustadora também por escrito) e, no caso do livro, por sua construção narrativa instigante, com ações simultâneas e ganchos irresistíveis ao final de cada capítulo, tornando praticamente impossível não querer ler tudo de uma vez.
Psicose consegue fascinar também pela sua ambientação perturbadora e, no caso do livro, por sua construção narrativa instigante.
A genialidade de Hitchcock contaminou nossa imaginação de tal modo que fica difícil criar algum tipo de imagem mental que não seja mera reprodução de algo visto no clássico do cinema, mas eis que rola algo surpreende já de cara: esqueça o magrelão do Anthony Perkins, o Norman Bates original é um gordão de óculos que passa o dia lendo literatura barata e jogando Xbox. Ok, a parte do Xbox talvez esteja apenas na minha imaginação.
Num geral, a sequência de fatos é praticamente idêntica a do filme (digamos que a famosa cena do banheiro é só um pouquinho mais hardcore), mas como literatura e cinema são linguagens bem diferentes, experimentamos no livro um mergulho mais profundo na mente perturbada de Bates, em sua forma tortuosa de raciocinar, seus medos e anseios, etc, o que pode tornar a leitura fascinante para os fãs do longa.
Embora haja algumas referências ao ocultismo nas leituras de Norman, é a psicanálise que dá o tom do comportamento de Bates com relação à mãe. Sobra pouco para inferir ou simplesmente pensar por conta própria, uma vez que o autor trata de explicar detalhadamente quais são as interpretações possíveis para o caso de psicopatia (algo que no filme também me incomoda um pouco). Mas tudo foi tão legal e apavorante até ali que a gente nem liga para o didatismo besta.
O importante é que a imagem de um hotel de beira de estrada, com uma velha casa na colina ao lado, continua sendo um dos cenários mais assustadores que se pode imaginar. Caso você duvide disso, espere por um dia de chuva torrencial e dê uma olhada melhor no segundo andar desse prédio aí perto de você. A luz está acesa, mas não dá pra enxergar direito. Aquilo ali na janela é realmente uma mulher?
PSICOSE | Robert Bloch
Editora: DarkSide;
Tradução: Anabela Paiva;
Tamanho: 175 págs.;
Lançamento: Julho, 2013.