Ser jornalista é capturar momentos. Não são poucos os que conseguem exercer essa arte com maestria e devoção, mas somente Truman Capote foi capaz de elevar essa definição a um nível ainda não igualado. Não tivesse o autor de Bonequinha de Luxo escrito A Sangue Frio ou o perfil “O Duque em Seu Domínio”, cujo objeto a ser pintado é Marlon Brando, o jornalismo, por certo, não seria o mesmo.
Capote, que terminou a vida envolvido em seus próprios delírios, chegou de mansinho para entrevista o astro em sua fase áurea pré-O Poderoso Chefão. Brando estava no Japão para filmar Sayonara, dirigido por Joshua Logan, e aceitara conversar com o repórter que tinha a encomendar de perfilá-lo para a New Yorker. Segundo a lenda, perpetrada pelo próprio autor, Capote conseguia gravar – mentalmente – 94% das conversas que tinha e, por isso, jamais usava gravador ou bloco de notas. Essa estratégia, misturada aos drinques que tomaram, deixou Brando à vontade para falar abertamente de si mesmo.
O relato, minucioso e performático, se debruça até mesmo sobre o sotaque da equipe japonesa designada para mimar Brando. Aos poucos, o ator vai se deixando enlaçar pela amizade de Capote. Dos bastidores das filmagens, rapidamente, a dupla conversa sobre o trauma de Brando com alcoolismo da mãe, sobre as dificuldades de ser um astro e a antipatia que sentia por James Dean, a quem chamou de doente e recomendou seu analista.
Truman Capote fora um jornalista devastador – nas mais variadas acepções da palavra – e fora, também, um professor de precisão.
Àquela altura, Brando acreditava que a entrevista não passava de um bate-papo, uma conversa entre amigos. Capote, ao contrário, se refastelava com as confissões do ator. Brando, que nunca foi santo, foi ingênuo em se deixar levar, é verdade, mas tamanha abertura só mostra o quando o protagonista de O Selvagem tinha se tornado uma pessoa fria e isolada, incapaz de confiar nas pessoas mais próximas.
Truman Capote acabara por atrasar outros compromissos de Brando à medida em que a entrevista seguia. O telefone tocava e Brando adiava. Até que, enfim, cancelou o encontro que teria com seu assistente. Tudo é descrito com minúcias por Capote. Brando se revelava mais e mais ao passo que as horas avançavam.
Quando “O Duque em Seu Domínio” foi publicado em novembro de 1957, Brando ficou furioso com seu entrevistador. Acusou-o de ter sido desonesto e ter se aproveitado de sua hospitalidade. Capote não desmentiu, mas afirmou que nada do que escrevera era mentira. A técnica seria usada poucos anos mais tarde para retratar o brutal assassinato de família Clutter, no estado do Kansas.
Como fez com Brando, aproximou-se de um dos assassinos e criou laços de amizade, conseguindo informações que ninguém possuía à época. Truman Capote fora um jornalista devastador – nas mais variadas acepções da palavra – e fora, também, um professor de precisão.