Se o mundo seguisse uma linha lógica, hoje todo fã de blink-182 estaria em sincronia, com os dedos tremendo de ansiedade por um veredito nas redes sociais. Mas quis o destino mais uma vez estragar a surpresa da banda e encerrar a tortura.
California foi vazado com uma semana de antecedência, logo após três faixas serem lançadas nas plataformas. O trabalho continha uma expectativa, tanto boa quanto ruim, por ser o primeiro trabalho da banda sem Tom Delonge. Dessa vez não era +44 ou qualquer outro nome, era blink-182 com Matt Skiba e pronto.
Se você é daquela leva de fãs que esperou até agora para ouvir, recomendo que pule esse parágrafo. Aqui com certeza deve ser dito em todas as letras possíveis o quanto Matt Skiba, o vocalista tenebroso e cadavérico do Alkaline Trio, deu uma nova alma à banda, totalmente diferente de seus últimos trabalhos.
Matt Skiba, o vocalista tenebroso e cadavérico do Alkaline Trio, deu uma nova alma à banda, totalmente diferente de seus últimos trabalhos.
Eu confesso que, por mais que fosse um grande fã de Alkaline Trio, assim como de blink-182, fiquei em choque ao saber da escolha. Tinha medo, inclusive, de que a banda se rendesse ao sinistro e perdesse a essência colegial que consagrou o trio no cenário do punk rock mundial.
Não resisti e baixei. E foi logo quando cliquei no play que meu amigo havia me mandado uma mensagem, repleta de palavrões de felicidade, exaltando a escolha.
Matt Skiba arrebentou, mostrou ser um músico completo e muito à vontade na responsabilidade que ele sabia ser grande. E foi nesse momento que eu realmente me perguntei “quem é, afinal, Matt Skiba?”.
Nascido em Chicago, Matt Skiba foi o fundador do Alkaline Trio, formado também pelo baixista Dan Andriando e o baterista Derek Grant. A banda, como muitos descobriram após a fatídica escolha pelo músico, sempre se rendeu a atmosferas sombrias e mais controversas. Com letras que envolviam cenários góticos, referências literais bem explícitas a Lovecraft e uma afeição por Anton LaVey, Alkaline Trio uniu a simplicidade sonora do punk rock a muito dark em suas composições. E essa fórmula funcionava ainda melhor pelo visual obscuro com o qual os integrantes adotavam.
A banda, assim como o blink-182, tinha os vocais e as composições divididas entre Matt e Dan. Mas ao contrário da dupla feliz Hoppus-Delonge, Matt Skiba e Dan eram opostos que contemplavam aquele culto às sombras.
É comum você ouvir num disco do Alkaline Trio baladas mais sombrias e lentas, conduzidas pelo vocal triste e melancólico do baixista, enquanto Matt Skiba narra todas as suas com guitarras pesadas, ritmos e compassos maiores e berros atrás de berros, inclusive sendo fundamental para o brilhantismo de Grant na bateria.
Essa condução de músicas rápidas, divisão de vocais e um baterista mestre no que faz foram fórmulas que Hoppus analisou quando o quis no lugar de Tom. E quando Skiba assume os vocais nas faixas de California, sua magia acontece com uma voz muito agradável e levada pelas baterias desumanas de Travis Barker. E por mais que as sonoridades das duas bandas sejam completamente distintas e o encaixe de um integrante tão sombrio numa banda feliz soasse estranho, surpreende dizer que não havia escolha mais certeira. Nem mesmo se tivessem escolhido algum frontman mais badalado daquela cena californiana.
Ao ouvir California, fiquei extremamente surpreso e feliz com o resultado. Imaginei até que, se a banda tivesse se tornado um projeto, talvez teria sido o melhor ao lado do solitário Boxcar Racer.
Matt Skiba incorporou um lado jovial e até mais feliz de uma maneira surpreendente até mesmo aos fãs de sua banda original. E nessa mistura, foi peça fundamental em recolocar a banda nos caminhos do catchy pop-punk de sempre, mesmo com o excesso de oh-oh-oh e na-na-na impostos por Feldman.
Longe de mim querer dizer que ficou melhor com essa formação. Mais longe ainda eu querer negar que prefiro que Matt assuma de vez os vocais de Tom, que ainda sonho ver de volta na banda e com a amizade forte com os demais integrantes. Só que não posso negar que os pontos mais altos de California, além de Travis Barker, foi o encaixe perfeito que Matt Skiba deu, revelando ser mesmo um artista completo, competente e talentoso que talvez vivia um personagem que a banda exigia.
Aos fãs mais críticos que repudiam o trabalho por apenas ser o marco da vida pós-Tom, peço que ao menos tentem avaliar o trabalho por este motivo.
Blink-182 é, ao lado de Green Day e Offspring, um dos grandes nomes da reformulação do punk rock no pós 90s. E a responsabilidade de seguir adiante sem uma peça e mesmo assim surpreender com single alternativo top one nas paradas norte-americanas mostra que essa importância foi levada a sério por todas as partes envolvidas.
Como fã, só tenho a agradecer pelo grande trabalho e pela ótima escolha. Que surjam outros tantos artistas com a mesma aptidão e fome de música de Matt Skiba. E para os que querem comprovar o que digo, “Left Alone” é onde ele mais brilha.