Danilo Moralles ainda é nome desconhecido de muitos e isso precisa ser sanado o quanto antes. Jovem filho da noite paulistana, Danilo lançou no ano passado Voodoo Prazer, seu disco de estreia, que impõe batidas eletrônicas à poética da MPB.
Editado pela gravadora Joia Moderna no ano passado, Voodoo Prazer parece ainda não ter chegado aos ouvidos mais antenados e isso precisa ser mudado. Recentemente, Danilo lançou o clipe da faixa “Sujeito de Sorte”, clássico de Belchior, que ganhou invólucro para as pistas de dança.
Dirigido por Sillas Henrique, em parceria com Ana Alexandrino (fotografia), o clipe foi gravado em Parapiacaba e traz Moralles numa dança à la Pina Bausch, de forma orgânica, em meio ao cenário de quase escombros (o diretor do vídeo cita como referência os trabalhos artístico-arquitetônicos de Gordon Matta-Clark).
A ousadia de Zé é certeira: Voodoo Prazer é um discão, que bebe da MPB, da poesia e da arte para se esbaldar na pista, flertando com o anos 80.
A versão clubber de Belchior liga-se claramente ao trabalho seminal de DJ Zé Pedro, que ousou brincar com a MPB e os beats eletrônicos na virada dos anos 90 para os anos 2000. Por isso mesmo, é natural que a estreia de Danilo tenha saído pela Joia Moderna, gravadora de Zé e que repetidamente tem apostado em “grandes artistas ainda desconhecidos”.
A ousadia de Zé é certeira: Voodoo Prazer é um discão, que bebe da MPB, da poesia e da arte para se esbaldar na pista, flertando com o anos 80 (a correlação com Pet Shop Boys é direta), os anos 90 e com os pares de sua geração. Alice Caymmi e Letrux podem ser nomes correlatos, todos mexendo com o pop de forma liberta, porém o nome que melhor se comunica com Danilo é o do duo NoPorn, em suas experimentações e sua spoken word quase andrógina.

Danilo Moralles mostra seu lado mais andrógino nas palavras mais faladas que cantadas de “O Canto”, faixa de abertura do disco e composição de Marcos A.S., produtor do disco, responsável pela roupagem eletro. Na sequência, Danilo se mostra de vez como cantor e compositor em “Cicatriz”, canção mais delicada e sensual. A surpresa chega na terceira faixa, em que o artista revisita “Papel Sulfite”, lá do disco de estreia do Metá Metá, criando uma versão que mantém a força e a intensidade da original, mas adaptada ao universo mais noturno do cantor.
Destaca-se também “Blues”, canção que lembra o trip-hop dos anos 90, de batidas sincopadas num emaranhado potente, na qual a voz de Danilo se mostra mais entregue. A canção, aliás, é bastante representativa do universo de Voodoo Prazer: Um disco de embalagem dançante e baladeira, mas que fala sobre dores, angústias e certo rancor.
Há uma solidão, uma tristeza em cada canção, com ares de “para dançar & chorar”. Com apenas dez canções e pouco mais de 30 minutos, Voodoo Prazer é disco veloz, direto, que apresenta Danilo Moralles como artista vibrante e interessante.
Talvez tentem enquadrá-lo na cena LGBT do pop e da MPB nacional; certamente farão aquelas comparações de seu timbre com o de Ney Matogrosso, Filipe Catto e qualquer um que cante de forma mais “feminina”; apesar de qualquer clichê desses, Danilo Moralles tem força para ir além dessas caixinhas. Espero agora que sua música ecoe bem alto pela noite.