“Após êxodo e falência, Detroit ensaia ‘ressurreição’” era o título de uma matéria do site da BBC Brasil a respeito da retomada de crescimento que a cidade vinha apresentando até o ano passado. Muito disso tem sido dado pelo incentivo da prefeitura na compra de lotes, terrenos ou casas vazias que haviam sido abandonados desde a derrocada da indústria automobilística e as demissões em massa por volta dos anos 60 e 70, especialmente devidos às rebeliões e às demissões em massa da indústria.
Nestas condições, Detroit via seus 2 milhões de habitantes cair para 700 mil. Ainda que seja uma cidade grande, se comparada ao porte de muitas capitais metropolitanas do Brasil, Detroit nunca mais havia sido a mesma, especialmente após decretar falência em 2003 e entrar no ranking das cidades mais perigosas e violentas do mundo.
Hoje com esse cenário de recuperação, Detroit já foi diferente e um paraíso para as oportunidades. Especialmente no mundo da música.
Durante a semana, assisti no canal BIS um episódio da série Metal Evolution, dirigida por Sam Dunn e Scott McFadyen, que narra as histórias e as peculiaridades dos subgêneros do Metal, contando um pouco mais da famigerada U.S. Division – ou a Cena Americana dos anos 70.
E Detroit é uma das maiores e mais importantes cidades para o formato da música americana até os dias de hoje. Explico o porquê.
Durante os 60 e pouco nos anos 70, o rock britânico, a psicodelia e os hippies eram a bola da vez na América, como eles mesmo dizem. Em meio àquele cenário, algumas das bandas rejeitavam esses rótulos e preferiam apresentar algo mais enraizado na cultura do país, de maneira mais pesada, mais rápida e que fosse direta. Foi o ambiente perfeito para bandas como Amboy Dukes, Blue Cheer e até mesmo o guitarrista de surf music Dick Dale. Com aquela sonoridade que se configuraria o garage rock, os EUA começaram a entrar na disputa pela audiência de seus próprio país contra o rock britânico.
Ainda que não houvesse essa rivalidade pintada e muitas das bandas inclusive servissem como referência para outras (tanto que não dá pra apontar uma banda que Led Zeppelin e Black Sabbath não influenciaram na época), o rock americano começava a tomar forma, até chegar em Detroit ao final dos anos 60.
O que veio a acontecer na cidade depois disso passaria a bifurcar o gênero em duas categorias extremamente presentes no rock atual: o metal e o punk. Influenciados pelas guitarras rápidas e distorcidas, as batidas rápidas e pesadas, surgiram bandas que começaram a desafiar a realidade musical e principalmente a mainstream e bandas como The Stooges e Alice Cooper viriam a conduzir bem perfeitamente para cada ponte as bandas atravessariam naquele rock moderno. Além deles, vinha com um impacto feroz na música e extremamente político a lendária MC5 e seu famoso bordão “kick out the jams, motherfucker”, que faria o próprio Ted Nugent cair de joelhos pelo som dos caras. E o momento político de Detroit era o background perfeito para as bandas que surgiam.
Com Stooges de um lado atraindo cada vez mais a cultura underground e, junto do MC5, dando a cara ao protopunk e tudo que viria de 77 em diante, do outro Alice Cooper seria essencial para quebrar as barreiras do rock americano com as rádios, quando hits como “I’m Eighteen” e “School’s Out” começaram a ser reproduzidas e excessivamente pedidas pelos fãs. Nesse cenário, Iggy e Alice confessam, nas cenas do documentário, que competiam para o status de mais loucos de Detroit na época.
O que veio a acontecer na cidade depois disso passaria a bifurcar o gênero em duas categorias extremamente presentes no rock atual: o metal e o punk.
A influência de Detroit, passando por essas bandas, começou a surtir efeito em outras cidades. Foi a partir daí que o cenário abriu as portas para que Aerosmith e KISS surgissem, conquistando cada vez mais o público em um jeito único de tocar e fazer música, seja pelo lado do Aerosmith, que misturava as várias influências de seus integrantes nas composições, como o KISS, que usava das turnês e dos efeitos de palco artifícios para impressionar cada vez mais uma multidão que aos poucos ia conhecendo a banda. A importância de Detroit no rock americano é tão grande que rendeu até a homenagem em “Detroit Rock City”, do próprio KISS.
Se Detroit vem hoje se reerguendo depois das crises e problemas, é ótimo pelo lado das pessoas que ali vivem e buscam oportunidades. Tomara que nesse meio tempo, Detroit emplaque mais uma palheta nervosa nesse mundo de seis cordas que é o rock n’ roll.