OThe Mars Volta sempre foi uma banda que partiu do caos para encontrar a ordem. Um grupo de músicos que alimentava uma verve free-jazz-psicodélica, uma espécie de canção feita de fora para dentro.
Era como se estivessem em uma jam session para curtir, abusar das possibilidades da arte para sua própria satisfação. Essas características sempre tornaram seus trabalhos pouco identificados com grandes públicos, rádios, MTV e paradas de sucesso.
Ao mesmo tempo, foram estas escolhas que os tornaram dignos de culto. Era quase uma antítese ao que haviam feito com a At the Drive-In, quinteto de pós-hardcore que criaram em 1994 – e já voltaram e acabaram duas vezes.
Neste mês, após um hiato de 10 anos, Cedric Bixler-Zavala e Omar Rodríguez-López tornaram a gravar um disco, o homônimo The Mars Volta. O registro é bastante enxuto perto de características que marcam a trajetória do grupo. O sabor agridoce, a sensação de que a expectativa não foi suprida, domina o resultado.
A banda foi, ao longo dos anos, ficando cada vez mais sucinta. Cedric e Omar optaram por manter o novo álbum em segredo. Fica claro que queriam poder compor sem a obrigação de prestar contas com o passado. No entanto, isso cobrou seu preço.
‘The Mars Volta’ vai na contramão: oferece composições muito mais acessíveis a outros públicos, o que é uma virtude, mas carece de detalhes que imprimam sua identidade.
Um dos aspectos que mais chamam a atenção é a opção por mixagens que não entregam a vivacidade, exuberância e intensidade pela qual se tornaram conhecidos. Seu DNA sempre foi marcado por estruturas sinuosas, recheadas de camadas instrumentais complexas e efeitos vocais.
The Mars Volta vai na contramão: oferece composições muito mais acessíveis a outros públicos, o que é uma virtude, mas carece de detalhes que imprimam sua identidade. Pior, o álbum sofre com uma produção meio sem vida, até mesmo desleixada.
Não é estranho que ao ouvir pareça que as faixas foram gravadas com pouco orçamento, em um estúdio caseiro e com pouca infraestrutura. E aqui é preciso pontuar: grandes músicas foram feitas deste jeito, a questão é mais profunda do que a forma, diz respeito ao brilho e às texturas sonoras que, aqui, estão quase completamente ausentes.
Em determinados pontos, Omar e Cedric até parecem tentar soar ousados, mas nada se apresenta de maneira cativante. A cada transição, a cada escalada, é natural esperar um som mais estruturado, capaz de acompanhar o que as letras estão desenhando para o ouvinte – e essa é, certamente, a maior qualidade do novo disco da The Mars Volta.
Se o breu da poesia de Cedric não estava tão exposto aos fãs ou era demasiadamente rebuscado, é impossível negar que entendemos o que ele expressa nas suas letras agora. Não há tanta necessidade de decifrar as mensagens, porque a linguagem é bastante clara.
E isso surge após 10 anos de hiato, em grande parte motivados pelo envolvimento de Cedric com a cientologia (atualmente, Chrissie, sua esposa, acusa o ator Danny Masterson – de That ‘70s Show – de estupro e a Igreja da Cientologia por supostamente assediá-los em favor do acusado, que enfrenta um julgamento no qual pode pegar até 45 anos de prisão).
O trauma, o medo e a angústia ficam nítidos, mas também o impacto que as escolhas pessoais trouxeram ao projeto. The Mars Volta, então, pode ser visto como um expurgo, a força que move dois artistas geniais a trabalharem juntos.
Porém, torna bem complicado inserir o disco em uma linha do tempo, tamanha sua desconexão com a trajetória dos músicos. Novamente, não se trata de juízo de valor, mas de uma sonoridade que parece tudo, menos a tão temperada The Mars Volta.
O tempo, e não este texto, dirá se isso foi bom ou ruim, um acerto ou uma aposta furada.
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