Acredito que a criação artística – a que nos interessa nesta coluna – nasce da capacidade de um autor em argumentar com inteligência sobre aquilo que lhe é sensível. Mais do que somente representar este sensível (motivo), o bom autor se apropria dele para, então, reinterpretá-lo a partir de seu conhecimento estético, da sua consciência histórica e do poder da sua imaginação. Estou certa que um desses bons criadores é Ian Ramil, que cultiva qualidades de um excelente compositor, traçando seu caminho na música com o comprometimento de quem nasceu no mundo das artes. Viva Satolep!
Acompanhado somente de seu violão, Ian Ramil faz sua intervenção em Curitiba nesta quinta-feira (24), às 20h, na bucólica sala de música na Casa Heitor Stockler de França. O músico apresenta parte do repertório registrado em seus dois discos publicados: IAN (2013) e DERIVACIVILIZAÇÃO (2015), ganhador do Grammy Latino de melhor álbum de rock em língua portuguesa em 2016. Um trabalho ruidoso, independente e essencialmente crítico, que dá um nó na produção serializada e cada vez mais sintética da atual indústria fonográfica. Uma obra valente, financiada pelo seu próprio público, que merece destaque nesta coluna e na produção brasileira contemporânea (download gratuito aqui).
Gravado na casa onde nasceu, na cidade de Pelotas, DERIVACIVILIZAÇÃO é um disco ainda em movimento. Uma criação contínua que insiste em dialogar com o tempo do agora e expressa a inquietação política e social que diz respeito a todos nós. Faixa-a-faixa, que vai de “Coquetel Molotov” (faixa 1) a “Não vou ser Chão pros teus pés” (faixa 10), Ian Ramil e Guilherme Ceron, coprodutor do CD, mergulham fundo num mundo onde nem sempre encontramos o belo.
Um álbum insubordinado e urgente, que estilhaça convicções morais sobre igualdade e coletividade. Um exemplo é a canção em parceria com Daniel Mã, um “batidão” cujo título (também) revela o narrador da obra. “A voz da indústria”: “Você vem dizer que escolhe o que ouvir. Bobinho você, que acha que a escolha é livre. Esmago você, de um jeito que você nem vai notar, neném” e segue com o riff “martelo você, martelo você”. Não preciso explicar mais nada, não é?
Acompanhado somente de seu violão, Ian Ramil faz sua intervenção em Curitiba nesta quinta-feira (24), às 20h, na bucólica sala de música na Casa Heitor Stockler de França.
Ian Ramil é rock avant-guardè, voz e violão. Um artista que busca autenticidade na letra, na harmonia, na sonoridade de seus álbuns, não se prende a formas musicais e faz do seu questionamento sobre os bastidores da realidade social o tema de sua obra. Um provocador que não tem dificuldade para transmitir o que pensa, especialmente neste show solo que estará pela primeira vez em Curitiba.
Percebi que no século XXI, o tempo do mundo se mede pelas redes sociais, mas é reconfortante perceber que a linguagem poética segue potente em seu próprio espaço. Ian Ramil também não tem pressa. É um sujeito longilíneo e carismático, grande amigo, que herdou do pai a capacidade de controlar seu próprio tempo como artista.
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SERVIÇO | Ian Ramil no “Vozes de Outras Cidades”
Onde: Centro Cultural Heitor Stockler de França | Av. Marechal Floriano, 458 – Centro;
Quando: 24 de maio, às 20h;
Quanto: Gratuito.
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Na órbita
Seria injusto não citar os artistas do qual Ian Ramil colabora. Exemplos mais recentes de sua vertente como compositor são as gravações d’A Banda Mais Bonita da Cidade e Filipe Catto. Na parceria em palco, é fácil encontrá-lo com Duda Brack, Ava Rocha, Uyara Torrente, Gutcha Ramil e na minha companhia.
Como produtor musical, sempre ao lado de seu comparsa, Guilherme Ceron, estão discos de alguns artistas do antigo “Escuta o Som do Compositor”, movimento autoral de Porto Alegre que serviu de laboratório para muitos compositores. Entre eles está o músico Poty, que lançou nesta semana uma amostra do CD Percepção, novo lançamento desse bando de artistas.
Com este clipe me despeço.
NO RADAR | Ian Ramil
Onde: Pelotas, Rio Grande do Sul;
Quando: 2013;
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