Entre os anos de 1986 e 1987, explodia no mundo a febre do hard e glam rock e o Mötley Crüe era uma das principais bandas dessa corrente. Em cima de um palco, com penteados extravagantes, calças de couro e muito contraste entre estampas de oncinha e o rosa, o visual disputava o foco com músicas que falavam sobre drogas, orgias e o estilo rockstar que todos passaram a desejar desde então.
Naquela época, a banda estava no auge da carreira com o lançamento de Girls, Girls, Girls e as turnês mundiais eram cada vez maiores. Foi nessa época de topo que os fãs quase conheceram o fundo do poço, devido ao uso constante de heroína. A história é muito melhor contada no livro Heroin Diaries: A Year in the Life of a Shattered Rockstar, escrito pelo baixista da banda, Nikki Sixx, em parceria com Ian Gittins.
No livro, Sixx é enfático ao contar suas histórias entre os natais dos dois anos, passando por sérios problemas com o vício, depressão e paranoia em sua casa em Van Nuys, na Califórnia, até a decisão conjunta da banda toda de nunca mais usar heroína na vida, tomada após uma quase morte por overdose do baixista. O livro serviu de inspiração para o primeiro trabalho da outra banda do baixista, chamada de Sixx A.M.
Sixx é enfático ao contar suas histórias entre os natais dos dois anos, passando por sérios problemas com o vício, depressão e paranoia em sua casa em Van Nuys.
O álbum The Heroin Diaries Soundtrack, lançado em 2007, 20 anos depois de todos os diários, se tornou o trabalho mais emblemático de uma volta por cima do rockstar e também de uma banda que em nada se parecia que o Mötley do “Dr. Feelgood” e do “Live Wires”.
Construído como uma Opera Rock, The Heroin Diares Soundtrack merece ser lembrado quase 10 anos depois de seu lançamento como um trabalho sóbrio demais — com perdão ao duplo sentido — e que sabe transmitir a emoção necessária em cada faixa, coisa que muitas bandas dessa nova geração deixaram de lado em seu trabalho.
O disco abre com uma brilhante e sombria introdução que recita um dos trechos do livro. “X-Mas in Hell” é a pura devoção de Nikki Sixx ao seu contato com as drogas e a depressão, trancafiado sozinho dentro de sua casa. O coral infantil representa a paranoia do músico e repassa um leve terror ao ouvinte.
As faixas seguintes, como “Van Nuys”, “Life is Beautiful” e “Pray for Me” dão tom crescente e emocional do disco, com as guitarras hipnotizantes de DJ Ashba e os vocais poderosos de James Michael, que como um breve ator, assume o papel de Sixx nos vocais, mesmo que o próprio baixista esteja ali do seu lado conduzindo a base da música. O álbum provoca o ouvinte também, usando os estágios da depressão como mote para transformar as faixas.
Assim, logo a euforia das primeiras faixas é quebrada por uma assustadora e claustrofóbica “Intermission”, que dá lugar às baladas sufocantes como “Accidents Can Happen” e a deliciosa “Girl With Golden Eyes”, uma sincera e triste declaração de amor à droga, ao mesmo tempo em que pede socorro para se livrar dela.
The Heroin Diaries Soundtrack é um trabalho tão bem feito, com tanto apreço aos detalhes, que funciona até no modo aleatório. Se você ouve o disco sem se preocupar com a história de plano de fundo, percebe que cada faixa tem sua identidade, mesmo que tenham sido escritas para funcionar em conjunto.
Sixx A.M. é uma das mais brilhantes bandas de hard rock da atualidade, e mantém seu trabalho sólido nos outros álbuns, mesmo que a Opera Rock não seja uma constante. Entretanto, ao ouvir uma banda que abusa de tons mais sombrios e pesados, pode-se perceber uma vertente ainda mais poderosa, diferente do que o consagrou como um dos ícones do hard rock dos anos 80, enquanto explora linhas simples de baixo, mas que são brilhantes liricamente.
Como dito lá em cima, quase 10 anos depois, esse álbum soa extremamente atual e único, dando um respiro e uma dose de reabilitação a um gênero que vinha se perdendo lentamente, com riffs muito parecidos e com uma proposta de tentar resgatar, sem sucesso, a fórmula que explodiu nos anos 80.
Se músicas boas são aquelas que contam histórias, ficam aqui meus parabéns a Nikki Sixx e Sixx A.M.