Trazendo o melhor de grupos como os californianos do Thrice, os curitibanos da Othersame liberaram este ano o EP Courting Saturn, um álbum de tiro curto que refina as referências do gênero criando algo inspirador. E o melhor: não chega nem perto de emular suas influências, tampouco soa uma sonoridade datada.
João, Alemão, Tissu e Marcelo transitam entre questões divisórias em Courting Saturn, propiciando momentos catárticos nas três faixas que compõem o EP. O registro traz elementos que surpreendem, incorporando uma assinatura tipicamente pesada com letras apaixonadas, pessoais. Com comedimento, o grupo brinca com a amplitude sonora, evocando as melhores recordações das melodias explosivas do cruzamento entre o hardcore melódico e o post-hardcore.
https://www.youtube.com/watch?v=jzDw_RXC8vg
A quem acompanhou a efervescência dos gêneros ao longo dos anos 90 e 2000, nota facilmente as homenagens presentes nos riffs da Othersame, que em outras mãos talvez transparecessem antiquados, mas aqui tem um quê de vistoso – sempre bom lembrar que ambos gêneros têm passado por um revival nos últimos 2, 3 anos.
O grupo não se contenta com o lugar-comum e se joga em um esforço (recompensado ao final, importante frisar) de capturar a essência de uma arte que é bela por sua pretensa obscuridade.
Courting Saturn possui um dinamismo comercial e radiofônico, como na faixa “Blue Devil”, por exemplo, que o ouvinte pode encontrar também em versão acústica. A profundidade da escrita do quarteto também é posta à prova, inclusive através de uma faixa mais extensa, como “Cronus” e seus mais de oito minutos. A interpretação é pungente, evidenciada na tensão que se sente na voz, bem como a estrutura orquestrada pela Othersame e que flui notavelmente de canção para canção. Sem soberba ou arrogância, se nota uma imensa confiança em cada nota desprendida pelo grupo curitibano, unindo uma visão artística cerebral e emotiva, catalisadoras desse registro envolvente.
O grupo não se contenta com o lugar-comum e se joga em um esforço (recompensado ao final, importante frisar) de capturar a essência de uma arte que é bela por sua pretensa obscuridade, enquanto cria um ambiente verdadeiramente atraente. O EP não é triste, cinzento, mas carrega uma confusão reconfortante, uma ligeira improvisação melódica que guarda, mesmo que quase imperceptível, uma angústia. Nisto, o trabalho das guitarras é preponderante nesta construção de uma atmosfera calorosa.
Se tivesse que definir Courting Saturn, diria que se trata de um registro imaginativo, ainda que visceralmente real. Sua excelente produção, desenrolada de forma crua, mas polida, dá pequenos tons dramáticos a essa musicalidade preciosa, repleta de habilidade técnica e artista. Dos melhores do ano.