Para começo de conversa, é preciso elogiar a escolha do nome da nova atração do SBT. Fábrica de Casamentos traduz com perfeição a proposta e a dinâmica deste novo reality show da emissora de Sílvio Santos: trata-se de um programa que aborda com perfeição o caráter industrial que hoje torna a instituição do casamento um grande negócio, assim como ocorre com outros ritos da vida humana (como a maternidade e a criação dos filhos, por exemplo).
Sendo assim, o SBT é bem-sucedido ao exibir com esmero as etapas desta grande “fábrica” do matrimônio. Que se esclareça: não há exatamente um tom irônico ou “desconstruído” acerca do casamento no programa, mas é algo que pulsa a cada segundo nesta nova atração. Trata-se de um reality show não competitivo, aos moldes de Corte & Costura, exibido pelo mesmo SBT, e com um tom profissional (pois vários fornecedores do negócio do casamento são convocados para demostrar suas expertises profissionais sob pressão), já bem experimentado em Esquadrão da Moda.
Assim, a dinâmica é simples: um casal é convidado para participar do programa e tem a oportunidade de ganhar uma festa organizada no espaço de sete dias. O desafio, portanto, não é colocado aos participantes, mas aos experts, que precisam adequar seu trabalho a um tempo entendido como bastante curto. Esclarece-se a todo instante: um casamento é algo que leva meses ou anos para ser organizado; um “sonho” ao qual uma grande quantidade de casais dedicará parte de seu tempo, esforço e dinheiro para concretizar. Portanto, o mote de atração é tentar reproduzir na tela a pressão e a tensão em vermos as vontades dos clientes serem atendidas em tempo recorde e, por fim, se eles conseguiram realizar o sonho da forma mais idealizada quanto for possível.
Fábrica de Casamentos, portanto, pega certa carona na onda dos reality shows profissionais que outrora eram comuns apenas nos canais a cabo mas hoje abundam na TV aberta (SBT e Band são as emissoras que mais têm investido neste estilo). Para capitanear a atração, o SBT conta com o chef Carlos Bertolazzo (em versão light em relação ao papel “profissional hardcore” que desempenhava em Hell’s Kitchen – Cozinha Sob Pressão) e Chris Flores, recém-vinda da Record. Juntos, eles têm a tarefa de organizar, passar as instruções e por fim liderar (com uma boa dose de dureza e rispidez, para que a diversão se cumpra) os vários outros profissionais responsáveis por organizar todas as etapas da cerimônia, como cabeleireiro, maquiador, confeiteiro, estilista, produtor de eventos.
No primeiro programa, o casamento era de um casal que trabalha como dançarinos de tango, e que tinha a incumbência de trazer exigências relativas aos seus desejos para a festa: tudo deveria remeter a tango e à Argentina, desde o vestido da noiva (que queria casar de vermelho) ao prato servido (que o noivo solicitou que fosse parrilla, para desespero dos organizadores). Assim, a graça da atração certamente estará sempre no teor inusitado dos pedidos e nos conflitos causados com as vozes especializadas, que tentarão sempre impor suas expertises e forçar uma adequação aos “padrões” esperados ao casório ideal.
O mote de Fábrica de Casamentos é tentar reproduzir na tela a pressão e a tensão em vermos as vontades dos clientes serem atendidas em tempo recorde e, por fim, que eles consigam cumprir o sonho da forma mais idealizada quanto for possível.
Um dos momentos mais tensos do programa, por exemplo, se deu no conflito entre a cerimonialista Elisa Tavares e o estilista Lucas Anderi – enquanto ela queria que a noiva entrasse no salão com um buquê de hortênsias azuis, ele forçava que a noiva o trocasse por uma única rosa vermelha que, segundo explicava, combinaria melhor com o resto da decoração. Há, portanto, todo um duelo entre desejo versus norma, (mau) gosto pessoal versus etiqueta social. “Confia em mim”, pedia Anderi à noiva – por fim, venceu a decisão pessoal e o estilista teve que ceder. É de se esperar, para as próximas semanas, por noivos mais bizarros e com pedidos mais inóspitos.
Assim, Fábrica de Casamentos funciona bem como reality show, mas pode parecer um pouco over aos espectadores já muito familiarizados com o gênero, pois há muitos efeitos dramáticos colocados na edição que talvez soem um tanto forçados. O tom por vezes beira o exagero: o discurso sobre o sonho do casamento, por fim, é reiterado excessivamente, sem que haja tanta necessidade.
Entretanto, como muitos dos realities deste mesmo estilo (Fábrica de Casamentos me faz lembrar, por exemplo, dos programas sinistros que giram em torno de concursos infantis de misses), parte da diversão está num tom velado – e possivelmente imprevisto pela própria produção – de denúncia quanto ao exagero da performance estabelecido a ritos cujo significado é mais profundo (e bem menos ostensivo) do que faz parecer a indústria que lucra muito dinheiro com todo o show.