Grace and Frankie é uma série adorável e muito fácil de ser amada. As duas primeiras temporadas, entretanto, alternavam ótimos momentos com deslizes grosseiros vindos das mentes de Marta Kauffman, uma das criadoras de Friends, Howard J. Morris e dos roteiristas viciados em sitcoms. Quando as piadas funcionavam, o público ria. Quando não dava certo, a sensação era de vergonha. Quando pendia para o humor escrachado, era sem graça. Quando tentava ser um drama, não carregava a força necessária. Mas a interação entre as duas protagonistas, as ótimas Jane Fonda e Lily Tomlin, deixavam esses deslizes mais brandos, tornando Grace and Frankie uma série deliciosa e leve. Felizmente, assim como suas protagonistas, a série amadureceu e acertou o tom de maneira até surpreendente nesta terceira temporada. Se os dois primeiros anos mostravam as duas mulheres lidando com a traição dos maridos, que assumiram um relacionamento entre os dois, o terceiro ano progride sua narrativa e faz a série ganhar uma identidade própria.
Após Frankie (Lily Tomlin) criar um lubrificante caseiro com a filha de Grace, Brianna (a ótima June Diane Raphael) e ver sua criação alterada por empresários gananciosos, Frankie se junta a Grace (Jane Fonda) para uma nova empreitada: a criação de um vibrador feito especialmente para mulheres mais velhas. A temporada, então, já começa de maneira inteligente, mostrando a saga das duas mulheres para conseguir um empréstimo bancário e colocar o produto no mercado. Após ouvirem inúmeros “Não!”, Brianna decide emprestar o dinheiro necessário para o negócio deslanchar, mas sem que sua mãe saiba, obrigando Frankie a mentir que seu namorado Jacob (Ernie Hudson) realizou o empréstimo.
É claro que o argumento traz diversas situações que poderiam estar em toda sitcom tradicional. É quase possível ouvir as risadas ao fundo. Mas o grande acerto deste ano é a forma como o texto e os próprios personagens contornam o clichê e não ficam reféns de um formato previsível. Durante os 13 episódios, temos ótimos exemplos de cenas que poderiam ter dado errado, mas acabam sendo genuinamente engraçadas, como o problema de coluna de Grace e Frankie e a luta das duas para chegar até o telefone e pedir ajuda após uma queda na sala de casa ou o surto de Frankie ao saber que Grace tem uma arma em casa. Ao mesmo tempo em que as cenas são hilárias, todas as situações se transformam em reflexões bastante comoventes.
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Neste terceiro ano, por exemplo, a série discute como idosos podem empreender mesmo depois dos 70 anos, como é possível duas senhoras viverem sozinhas e, claro, como é possível sentir prazer no sexo mesmo quando todos dizem que não. Importante perceber, também, como todas as situações elevam a relação das duas protagonistas e discutem não apenas o valor da amizade, mas carência e solidão na terceira idade. Jane Fonda e Lily Tomlin, aliás, estão em suas melhores formas e a química entre as duas, melhor do que nunca.
Grace and Frankie assume um tom bem mais sombrio e sério do que seus anos anteriores.
Arriscando uma nova abordagem, a terceira temporada de Grace and Frankie assume um tom bem mais sombrio e sério do que seus anos anteriores. Doenças começam a aparecer, dramas surgem de forma muito mais pesada e a amizade entre as duas protagonistas realmente começa a ser afetada, seja pelo stress da sociedade ou pela decisão de Frankie em mudar de cidade. Ao mesmo tempo, o relacionamento de Robert (Martin Sheen) e Sol (Sam Waterston) ganha mais profundidade, com uma discussão interessante sobre aposentadoria e o peso de terem assumido a homossexualidade. Enquanto Robert prefere ignorar manifestações homofóbicas, Sol prefere virar um militante da causa, colocando em contraste o significado de ser gay para aqueles que passaram a vida reprimidos e hoje vivem numa época em que sair do armário é praticamente uma obrigação imposta
A temporada também consegue explorar de maneira muito mais dinâmica a vida dos filhos. Coyote (Ethan Embry) luta para se manter sóbrio e centrado, tentando recomeçar sua vida; Bud (Baron Vaughn) ganha mais destaque ao assumir a empresa do pai e começar um relacionamento bastante esquisito com sua namorada; Mallory (Brooklyn Decker) vive uma crise no casamento; mas é Brianna quem ganha mais cenas neste ano. Deixando de ser apenas um alívio cômico – ainda que continue uma das personagens mais engraçadas – Brianna ganha nuances e uma história bastante interessante quando a empresária começa a avaliar seu modo de viver e como trata as pessoas ao redor.
Mas a série continua realmente acertando na questão do envelhecimento, explorando os efeitos psicológicos e como o mundo trata pessoas mais velhas. Em uma série com atores predominantemente acima dos 70 anos, todas as cenas acabam tendo mais importância ao passar uma mensagem positiva e esperançosa, além reflexões que impactam não apenas o público mais maduro, mas os mais jovens também. Afinal, envelhecer não é opcional.
Diferentemente dos dois primeiros anos, o final da temporada de Grace and Frankie ganha contornos mais dramáticos do que cômicos. Ao mesmo tempo, a última cena é tão simbólica e doce que pode ser capaz de fazer você derrubar algumas lágrimas de emoção, não de tristeza. Grace and Frankie, então, continua trilhando um caminho muito bonito na televisão e que certamente ganhará ainda mais o carinho do público, tanto dos velhinhos quanto dos mais novinhos.
Assista ao trailer da terceira temporada de ‘Gracie and Frankie’
https://www.youtube.com/watch?v=_KRIMhehOLs