Já é fato consolidado: a Record está estabelecida como a casa dos reality shows mais deliciosos do Brasil. Enquanto a Globo organiza as atrações marcadas pela seriedade e pela clara noção (da emissora e do público) de que muito se perde se eles não forem bem-sucedidos, a Record foi muito perspicaz ao assumir-se como a emissora que oferece os programas mais trash desse estilo – em boa parte das vezes, pegando as “rebarbas” dos realities da Globo. Por isso mesmo, com o encerramento de Power Couple Brasil, havia muita especulação em torno de Ilha Record.
Anunciado a quatro ventos como um formato original da emissora, a verdade é que Ilha pincela várias coisas de outros programas: ele tem o caráter “natural” de No Limite (pois se passa numa locação belíssima, em Paraty, RJ), inclusive com provas que desafiam os limites físicos dos participantes, enquanto apresenta, tal qual A Fazenda, um elenco escolhido a dedo para causar. Ilha Record traz uma espécie de dream team da TV trash: quase todo mundo já participou de outros realities. Os nomes explicitam uma intenção de montar um cast raiz (com pessoas como a argentina Antonela, do BBB 4, e a funkeira Valesca Popozuda), alguns sujeitos tidos como marcantes em seus realities de origem (como Lucas Selfie, de A Fazenda 12, e Pyong Lee, o hipnólogo do BBB 20), além de algumas novas apostas nesta seara (como os influencers Negão da BL e Nanah).
Mas a cereja do bolo, sem dúvida, está em conseguir levar para esta ilha algumas pessoas que seriam a nata deste tipo de entretenimento – almas dispostas a fazer qualquer coisa para causar e espezinhar outros participantes, garantindo assim um lugar numa espécie de panteão da TV assumidamente ruim. Colocaria aqui o ex-jogador Dinei (A Fazenda 4), Laura Keller (Power Couple 1), é claro, Nadja Pessoa, que já está em seu quarto programa desse estilo na Record (esteve antes em A Fazenda 10, da qual foi expulsa, Power Couple Brasil 3, e ganhou um programa especial Tudo ou Nadja). Protagonizando tretas no papel oficial de barraqueira, Nadja conseguiu virar uma espécie de primeira dama desse tipo de programa – ou, como disse Chico Barney, do UOL, Nadja se tornou a Juliana Paes dos realities da Record.
A cereja do bolo está em conseguir levar para esta ilha algumas pessoas que seriam a nata deste tipo de entretenimento – almas dispostas a fazer qualquer coisa para causar e espezinhar outros participantes.
Pois bem, a julgar pelas primeiras semanas de Ilha Record, já é possível listar alguns motivos para defender e alguns poucos para criticar a nova criação da emissora de Emir Macedo. Vejamos alguns deles:
– É preciso destacar, primeiramente, o investimento feito pela Record em Sabrina Sato como apresentadora de reality shows. Dona de imenso carisma, por causa de sua persona meio brejeira/ meio superglamourosa, Sabrina tem seu talento pouco explorado na emissora – sua última empreitada foi o sem-graça Guerra dos Clones. Já é até meio clichê dizer isso, mas vale lembrar que mulheres não têm tido muitas oportunidades para encabeçar este segmento dos realities, que precisam de um líder rápido, empolgado e capaz de prender o espectador em frente à tela mesmo que não esteja acontecendo muita coisa. A Record apostou (e acertou) em Adriane Galisteu em Power Couple 5 e agora arrisca também com Sabrina – que é divertida, embora soe um pouco apagada pelo fato de o programa ser gravado (na última edição do podcast Splash vê TV, Sabrina sugeriu que o público mobilize uma campanha para a próxima temporada de Ilha Record ser ao vivo).
– O fato de ter um formato original (o que significa dizer que não é uma franquia comprada por uma produtora e, por isso, não precisa cumprir regras pré-estabelecidas) traz liberdade para que Ilha invista em elementos um tanto bizarros, mas que são capazes de trazer bastante diversão. A competitividade do programa se dá em torno da coleta de pedaços de um mapa, que surgem nas mãos de um misterioso “Guardião da Ilha” – um sujeito com rosto vendado que chega de barco com alguma mudança na história. Tudo um tanto ridículo e, por isso, capaz de gerar riso – como bem se espera de um programa desse tipo.
– Outro aspecto importante da dinâmica é a ideia de que os participantes eliminados não saiam do programa. Quando isso acontece, eles são deslocados para uma “caverna”, envolta de uma cenografia meio precária: a ideia, aparentemente, é que parecesse uma caverna de pedra, mas dá a impressão de que eles estão dentro de um cenário de papelão do Chapolim. Lá, eles ficam vendo TV e mantendo verdadeiros solilóquios enquanto assistem aos colegas (minha maior curiosidade é saber como eles são dirigidos para que fiquem falando o tempo todo).
– E, claro, nada disso funcionaria se não fosse o elenco: como Dinei, o primeiro expulso, que fica resmungando na caverna e garante uma diversão à parte; a tresloucada Nadja, que sob uma superfície de tranquilidade, consegue envolver todo mundo em suas histórias; a esquentada Valesca, que já subiu nas tamancas, como se dizia antigamente, logo no início do programa; o sempre arrogante Pyong Lee, que criou para si mesmo uma pecha de inteligente, mas sempre se lasca. Ilha Record dá certo porque todas essas pessoas estão dispostas a comercializar o que for pelo gosto da fama (mesmo que seja uma fama trash).
– Teve um diálogo logo na primeira semana que, em minha opinião, resume bem o que é Ilha Record: em certo momento, Sabrina Sato inicia um diálogo com Negão da BL dizendo “esta é sua primeira votação, no seu primeiro reality…”. Estamos diante aqui de pessoas que claramente entendem isso tudo como uma carreira: ser participante de reality show é quase ser um soldado que galga postos dentro de uma jornada neste tipo de programa. A Record, espertamente, está só capitalizando esta profissão melhor que as outras emissoras.