É difícil fugir do clichê e não dizer que o MasterChef Brasil é uma galinha dos ovos de ouro na grade da Band – se não a única, provavelmente está entre as principais. Isto porque o programa pegou com força na cultura televisiva, a ponto de conseguir gerar uma série de spin-offs. Dentre eles, está Pesadelo da Cozinha, com o chef Erick Jacquin, e as versões específicas da franquia, como MasterChef Kids, MasterChef Brasil – A Revanche e MasterChef Profissionais.
O sucesso estrondoso do reality show segue a trilha de vários outros que apostam numa mesma fórmula fechada. Basicamente, todas as temporadas de MasterChef Brasil mantêm a mesma estrutura na competição e, mais importante que isso, todos os sujeitos envolvidos têm papéis muito marcados: Erick Jacquin é o francês (cujo sotaque nunca ameniza) de aspecto durão, mas de coração mole; Henrique Fogaça é o punk que curte fazer um terror (quase sempre desnecessário) com os participantes; e, até então, Paola Carossella era a argentina elegantíssima, mas doce, que encantava todos os presentes. Os competidores também seguem papéis: há sempre uma pessoa mais velha que traz a sabedoria da cozinha de “antigamente”, os jovens impetuosos, as mulheres emocionalmente descontroladas, os moderninhos que querem ousar nos pratos. Eles todos precisam estar bem delineados pois apontam a valores que serão defendidos ou execrados pela audiência.
Descrevo tudo isso para pontuar a pergunta que sempre me faço: por que vemos todo ano um programa sobre o qual sabemos praticamente tudo? A resposta, me parece, tem a ver com o fato de que TV é familiaridade. Costumamos gostar de programas que trazem uma espécie de previsibilidade – como episódios de novela dos quais já tivemos spoilers mas mesmo assim assistimos. Mas é claro que a repetição tem que ter medida: se nada mudar de um ano para o outro, é bem possível que chegue um momento que o espectador desista de voltar. Em certa medida, é o que acontece com MasterChef Brasil, principalmente quando emenda uma temporada depois da outra.
Em 2020, o programa teve que se adaptar à pandemia, e a solução encontrada foi encerrar uma competição por semana, quebrando o formato em que os participantes se enfrentam durante a temporada inteira. Claramente, não foi uma boa opção, pois este formato alternativo impossibilitou que o programa desenvolvesse as personalidades e as tramas em torno dos competidores.
O retorno de MasterChef em 2021 já tem como primeiro trunfo o fato de que levou cerca de um ano para estrear, dando ao seu público uma chance de respirar e sentir saudades.
Por isso, o retorno de MasterChef em 2021 já tem como primeiro trunfo o fato de que levou cerca de um ano para estrear, dando ao seu público uma chance de respirar e sentir saudades. E há, por fim, uma novidade impactante: a jurada Paola Carossella anunciou que não estaria mais no programa, e foi substituída por outra mulher, a chef gaúcha Helena Rizzo (que já havia, inclusive, aparecido em temporadas anteriores como convidada).
Helena encara uma missão nada fácil – afinal, os jurados de MasterChef são as grandes estrelas do programa, e Paola se tornou indubitavelmente uma musa, provavelmente a mais carismática do trio. Não obstante, em apenas dois episódios, Helena Rizzo já mostrou que tem muito potencial para criar seu próprio “culto”. Ela retoma alguns aspectos do estilo de Paola (como a elegância, o claro domínio do seu ofício), mas nitidamente não tenta substituí-la, o que é ótimo. Diferente de Paola, que tinha um ar mais “sisudo”, Helena tende a ser mais sorridente. Ainda que isso não se relacione com a competência da chef, vale dizer que aqui falamos de um programa de TV e, por isso, a persona é importante (não valeria de nada um profissional exímio que não tivesse qualquer carisma ou presença na tela).
A graça da temporada, como sempre, se segue nos elementos de fundo do programa, como o aspecto da “neurose fitness” que atinge os programas sobre cozinha, e a enorme quantidade de metáforas que esse tipo de atração carrega – falando menos sobre comida e mais sobre adequação a um mundo capitalista em que o espírito coach prospera. Enquanto alguns mandam (os jurados) e os “ajuizados” obedecem (os participantes), é preciso sempre que alguém escape um pouco dessa cartilha para chamar atenção dentro dessa pequena multidão que, obviamente, não deseja um troféu, mas sim a visibilidade que o programa pode trazer.