Justiça. Supermax. Dois Irmãos. Em comum, todos estes produtos da Globo foram disponibilizados previamente em seu aplicativo para smartphones, tablets e smart tvs. Até o primeiro episódio de Tá no Ar, humorístico comandado por Marcelo Adnet, que retorna hoje à programação da emissora, já estava disponibilizado aos assinantes desde a semana passada.
Essa nova movimentação segue tendência internacional. Inúmeras emissoras de televisão têm disponibilizado seu conteúdo na íntegra ou parte dele nos aplicativos, antes mesmo deles irem ao ar na televisão. Foi assim com a Freedom, da Walt Disney, e até com a BBC de Londres. Além de um desafio à Netflix, que no Brasil até novembro de 2016 praticamente não tinha concorrentes, isso também evidencia uma mudança na postura do consumidor e, segundo Andy Donchin, vice-presidente de investimento da Dentsu Aegis Network, um dos maiores grupos publicitários do mundo, uma estratégia de viés comercial que atende muito bem os anseios dos anunciantes. “Se as pessoas querem assistir desse jeito, elas provavelmente são telespectadores altamente engajados”, disse Donchin. “Se você está engajado com um programa, espera-se que você esteja também engajado com os comerciais”, completou o executivo em entrevista à Reuters.
Mas não é somente a Netflix que parece enfrentar desafios. Este novo fenômeno indica, também, uma mudança do consumidor e sua relação não apenas com as emissoras, mas também com as operadoras de TV por assinatura. Segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), o país conta hoje com mais de 18 milhões de assinantes de televisão por assinatura, uma retração de quase 3% em relação a 2015. Em números absolutos, as operadores perderam pouco mais de 550 mil assinantes. E a previsão, mesmo com a instituição de taxas sobre estes serviços, é que isso possa aumentar no decorrer de 2017.
O que estes movimentos apontam é uma maior percepção das emissoras e dos serviços de streaming sobre os hábitos de consumo do espectador.
A Amazon, que lançou seu serviço no Brasil em dezembro de 2016, é a primeira a entrar no mercado. A HBO já está em operação com modelo teste do HBO Go no Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Bahia e Distrito Federal. A FOX também investe no seu FOX Play, ainda que, tal qual o HBO Go (que está atrelado à companhia Oi), esteja funcionando apenas com assinantes do canal nas operadoras.
O que estes movimentos apontam é uma maior percepção das emissoras e dos serviços de streaming sobre os hábitos de consumo do espectador. Não apenas a mobilidade entra em jogo, mas também a possibilidade de assistir seus programas a qualquer momento, no ritmo desejado e sem ter que, para isso, levar junto um pacotes de canais aos quais o espectador não necessariamente assistirá e pelos quais terá que pagar bem caro.
Talvez seja um bom momento para as operadoras de TV por assinatura sentirem esse novo cenário e, de repente, apostarem em novos modelos comerciais apenas com canais à la carte. Nos dias atuais em que a crise é para todos, não há mais sentido pagar pelo o que não se consome, e nessa queda de braço, bem, já vimos que é o consumidor/espectador quem manda – ainda que o lobby das operadoras seja pesado.
E vale lembrar que a Netflix já apostou em modelos de talk show, como o Chelsea, que vai ao três vezes por semana em episódios de cerca de 30 minutos e já está renovado para uma segunda temporada, e que já estuda projetos para investimento em jornalismo. A televisão como veículo nunca acabará e nem tampouco perderá sua relevância, mas certamente nunca mais a assistiremos como já fizemos anteriormente. É literalmente ver pra crer.