Em reta final, Segundo Sol decepcionou muita gente. Com uma trama mal desenvolvida, arrastada e cheia de clichês, João Emanuel Carneiro aposta em incluir em seu enredo assuntos que possam causar uma certa rebuliços e debates nas redes sociais, tentando assim, quem sabe, manter uma certa audiência e repercussão dos capítulos.
O problema é que os temas abordados, apesar de importantes e necessários, são malconduzidos e acabam sendo apresentados de forma rasa. Há algum tempo, escrevi nessa coluna sobre a polêmica envolvendo a personagem Maura, interpretada por Nanda Costa, questionando na época os rumos da personagem e quais eram a intenção do autor em fazê-la se envolver com um homem: falar sobre bissexualidade ou promover a “cura gay”.
Na última terça-feira (30 de outubro), após uma longa espera (notem a data que publiquei o primeiro texto), tivemos a resposta: Maura é bissexual. Legal, não? Pensar a bissexualidade sendo abordada na principal novela da Rede Globo é algo incrível, o assunto foi tocado pouquíssimas vezes na teledramaturgia brasileira e muito pouco explorado.
A visibilidade LGBTQ+, apesar de ser um mote recorrente, ainda é pouco explorado nos meios de comunicação de massa, como a televisão. E o B dessa sigla é o que mais sofre com a invisibilidade (veja mais sobre o assunto nesse artigo apresentado no Intercom desse ano).
Na novela, quem era leigo em alguns dos temas, continuou leigo. Quem era preconceituoso com algum dos tópicos, não assistiu a nenhuma discussão séria e desconstruída, e provavelmente continua com o mesmo preconceito. Sinceramente, para mim, ambas as abordagens não serviram para nada.
Sendo assim, era para esse texto ser positivo, exaltar um mérito da novela. Porém, não é bem assim, porque, assim como tudo em Segundo Sol, a questão foi muito mal trabalhada e não teve nenhum aprofundamento. No capítulo citado, ao conversar com a irmã sobre sua indecisão entre Selma e Ionan, Rosa (Letícia Colin) questionou: “Você gosta mais de homem ou de mulher?”. “Eu gosto de gente, Rosa, gente! Gosto de Ionan e gosto de Selma! Igual! Tenho carinho, vontade de ficar junto, amo os dois, por mim ficava com os dois, mas não posso!”, respondeu a policial.
E foi isso. Essa é toda a abordagem sobre a bissexualidade da personagem. Apenas um único diálogo. E por quê? Porque o autor, ao invés de explorar isso, decidiu que não iria falar sobre e incluiria um outro tema: poliamor. “Oxê, não pode por quê?! Tanta gente aí vivendo o amor livre, o poliamor! Se você vai ser feliz com os dois, é o que importa, ninguém tem nada a ver com sua vida! Eu dou a maior força de você tentar, propõe isso pra eles! Maura, não tem fórmula, nem deve ter regra”, respondeu a personagem de Colin.
Na cena seguinte, Maura apareceu conversando com Selma e Ionan para propor o relacionamento a três. Ela declarou que gosta dos dois, com a mesma intensidade, e que não queria escolher entre um ou outro. “Já não basta minha mãe, com dois maridos, agora serei eu com duas mulheres?”, reagiu o policial – a personagem Naná (Arlete Salles) também vive um trisal com Dodô (José de Abreu) e Nestor (Francisco Cuoco).
Apesar da breve indignação, ele e Selma toparam a proposta, sem muitos estranhamentos, sem nenhuma grande conversa sobre como iria funcionar, sem ressalvas. Fácil. Sem nenhum aprofundamento sobre esse tema também. Vale citar aqui que quando Naná propôs o amor livre, Nonô e Nestor também aceitaram na hora (mesmo sendo pessoas de mais idade, acostumados com o modelo “tradicional” de casamento).
Ou seja, a novela tocou em dois assuntos polêmicos e importantes, mas não falou de verdade sobre nenhum. João Emanuel Carneiro deveria aprender com o programa Amor & Sexo, que já trouxe ambos os conteúdos de maneira didática e explicativa.
Na novela, quem era leigo em alguns dos temas, continuou leigo. Quem era preconceituoso com algum dos tópicos, não assistiu a nenhuma discussão séria e desconstruída, e provavelmente continua com o mesmo preconceito. Sinceramente, para mim, ambas as abordagens não serviram para nada.