Ainda é cedo para decidirmos nos nossos corações qual é a melhor série do ano — e com a existência de The Handmaid’s Tale, fica difícil escolher outra coisa. Mas eis que a BBC America lança Killing Eve, baseada em uma série de livros chamada Codename Villanelle, de Luke Jennings. A produção britânica, criada por Phoebe Waller-Bridge (de Fleabag), vem arrancando elogios mundo afora e não sem motivos.
Eve Polastri (a ótima Sandra Oh, de Grey’s Anatomy) é uma agente da inteligência britânica que costuma lidar com a burocracia diária do trabalho, sem muita empolgação. Em determinado momento, surge a oportunidade de Eve investigar uma série de assassinatos violentos que vem ocorrendo em alguns lugares da Europa. Ela acredita que as mortes são causadas por uma mulher. Não demora muito para ela descobrir que essa mulher se chama Villanelle (a sensacional Jodie Comer), uma psicopata sádica, carismática e irresistível. Nessa caçada, as duas mulheres começam a ficar obcecadas uma pela outra.
A série é difícil de categorizar, algo que diz muito sobre a televisão atual. Não é uma comédia, mas traz um humor pesado, caracteristicamente britânico, capaz de te fazer gargalhar. Não é apenas uma série de espionagem, mas traz ação e tensão capazes de fazer você ficar na ponta do sofá. Não é drama, mas carrega uma densidade psicológica forte. Não discute feminismo, mas é extremamente feminista em sua execução. Entre uma narrativa nervosa em que uma mulher mata pessoas de maneira bizarra e criativa enquanto dá um sorrisinho entediado, o texto insere situações do cotidiano, transformado os personagens em pessoas humanas, parecidas com a gente, nada glamourosas e perfeitamente empáticas.
Não há maniqueísmo em nenhum dos lados e nada sai do tom ou fica fora de contexto.
Se a história é boa, as duas protagonistas são o corpo, a alma e o espírito da série. A britânica Jodie Comer entrega uma Villanele complexa, sádica, irônica, amiga e extremamente carismática. Hannibal Lecter ficaria com inveja. A personagem é tão bem construída que não há um momento em que ela se torne dispensável ou que o público torça para que ela se dê mal, mesmo com uma frieza de gelar a espinha. Não há maniqueísmo em nenhum dos lados e nada sai do tom ou fica fora de contexto. A atriz ainda entrega no olhar uma tristeza e melancolia que a deixam tão humana quanto monstruosa.
Da mesma forma, Sandra Oh apresenta uma Eve diferente do clichê da policial que fica obcecada por um caso e vai destruindo sua vida pessoal aos poucos. A história até caminha para isso, mas com um equilíbrio perfeito para que nada soe melodramático ou exagerado. Com um timing para comédia e drama impecável, Sandra Oh trabalha com o mesmo nível de importância de Jodie Comer. Interessante notar, também, como a série é predominantemente feminina. Os homens ocupam papéis de liderança, mas vão se atrapalhando no meio do caminho, enquanto as mulheres tomam conta da história.
Sem deixar o ritmo em nenhum dos oito episódios que formam a primeira temporada, Killing Eve é o exemplo perfeito de uma excelente série para ser maratonada e que consegue unir entretenimento, um texto afiado, protagonistas carismáticas e atuações para aplaudir de pé. Imperdível.