Depois de apenas dois anos fora do ar, American Idol retorna à televisão em nova emissora e com alguns desafios. Com tantos reality shows que focam mais nos jurados/mentores, Idol tem a missão de voltar seus holofotes aos candidatos e suas histórias de vida, a fim de construir um caminho que os levará a uma espécie de jornada do herói. Entretanto, como fazer isso em uma realidade bem diferente daquela de quando o programa começou, em 2002? Quem ainda precisa de um programa de TV para fazer sucesso quando o YouTube lança talentos a cada semana? Quem ainda engole o discurso de um ídolo americano?
Diferentemente de competições como The Voice ou The X-Factor, American Idol tenta mostrar a trajetória que levou aquela pessoa a estar em frente aos jurados. Depois disso, acompanhamos, fase por fase, a luta dessas pessoas para encarar desafios que exigem criatividade, espírito de equipe e versatilidade. A diferença dos outros é que, desde o comecinho, nós vemos os candidatos sem a glamourização de um palco ou de grandes produções. É somente a voz e nada mais.
O grande desafio do American Idol é achar seu lugar na TV e na indústria fonográfica.
Quanto mais o funil vai apertando, mais vamos nos afeiçoando àqueles personagens. Quando as apresentações de fato começam, nós já formamos alguns laços. O trunfo do programa, então, é a humanização do ídolo. Tudo isso, claro, serve para exaltar os Estados Unidos como a terra das oportunidades e do trabalho duro, mas também justifica por que o American Idol foi um fenômeno durante muitos anos. O programa conseguiu, com muita eficiência, grudar no imaginário social como se fosse uma instituição, uma oportunidade única para quem deseja alcançar o estrelato.
Talvez ninguém espere que em 2018 tenhamos uma nova Kelly Clarkson ou Carrie Underwood, mas o fato é que American Idol ainda é um dos poucos, senão o único, reality que de fato conseguiu colocar pessoas em evidência. Em seus dois primeiros episódios da 16ª temporada, Idol já mostrou que não quer reinventar a roda. Com Ryan Seacrest no comando, que apresentou a competição por 14 anos, nem mesmo a logo da marca foi alterada.
Com os novos e carismáticos jurados – Lionel Ritchie, Katy Perry e Luke Bryan -, o reality mostrou um bom equilíbrio entre o protagonismo dos três e as audições dos calouros. Embora Katy Perry seja claramente a grande carta na manga para alavancar a audiência, os três interagem bem e parecem estar se divertindo muito com tudo aquilo, retirando aquele peso de ser o “ídolo americano” ou o grande herói da nação. Ao invés disso, temos discurso sobre como a indústria fonográfica pode ser cruel ou como determinados perfis de candidatos podem não estar preparados para enfrentar o que vem pela frente. O programa também amenizou as audições ruins, deixando de lado as bizarrices e humilhações para focar no talento, algo que já vinha sendo feito nas últimas temporadas na FOX.
Entretanto, ao menos nesse começo, o programa chamou mais atenção pela aquisição de Katty Perry no elenco do que necessariamente pelo talento dos cantores. Algo já esperado, claro, mas que mostra uma fragilidade e um perigo para a ABC, que apostou forte no retorno do reality. Com bastante desenvoltura e humor, Perry dá uma leveza ao programa e parece não ter muito medo de vetar certos candidatos, ao mesmo tempo em que tenta encontrar uma ligação com cada um deles. Mas depois do primeiro episódio, o que mais foi noticiado é o beijo dado pela jurada em outro candidato. Benjamin Glaze disse que se sentiu desconfortável com a atitude da cantora, pois queria que seu primeiro beijo fosse “especial”.
O grande desafio do American Idol, então, é achar seu lugar na TV e na indústria fonográfica. Para um programa que nasceu em uma época em que o streaming ainda engatinhava e que acabou presenciando grandes transformações ao longo do tempo, Idol deve encontrar o balanço entre o modo tradicional de se construir um ídolo e a nova forma de consumo de música.
O grande problema do reality talvez seja pasteurizar os candidatos quando eles saem do programa, mesmo que durante a temporada a diversidade seja abraçada. Transformando todos em produtos pop comerciais iguais a todos que vemos por aí, American Idol talvez precise olhar para outras formas de divulgação e estratégia. Em tempos em que lançar vídeos no YouTube pode ser mais eficaz do que se apresentar semanalmente para milhões de pessoas, American Idol vai precisar convencer o público de que o programa é mais relevante do que apenas um canal de divulgação.