Seria muito ousado, e possivelmente desastroso, emular no Brasil séries médicas consagradas como E.R. – Plantão Médico, hoje um clássico da tevê, ou Grey’s Anatomy, há 18 temporadas no ar.
Além da realidade da saúde no Brasil ser muito diversa, a importação de modelos narrativos sem muito critério, e sem a devida adaptação à realidade local, pode resultar no mínimo patética.
Talvez por isso é tão impressionante o triunfo de Sob Pressão, que agora chega à quinta temporada (sexta, se contarmos a minitemporada com foco na Covid-19), em exibição na plataforma de streaming Globoplay.
Embora haja inevitáveis semelhanças entre a produção brasileira e suas congêneres norte-americanas, afinal todas se passam dentro de hospitais e entrecruzam histórias de médicos, enfermeiros, funcionários e pacientes, Sob Pressão tem o grande mérito de buscar autenticidade, de se embeber da nossa realidade, ao optar, desde sua primeira temporada, por retratar o dia a dia em hospitais públicos no Rio de Janeira.
Criada por Luiz Noronha, Claudio Torres, Renato Fagundes e o cineasta gaúcho Jorge Furtado (de O Homem Que Copiava), e escrita por Lucas Paraizo com a colaboração de Márcio Alemão, André Sirangelo, Pedro Riguetti e Flavio Araujo, Sob Pressão é derivada do longa-metragem homônimo, de 2016.
Já o longa, por sua vez, foi livremente inspirado no livro Sob Pressão: A Rotina de Guerra de um Médico Brasileiro, do cirurgião torácico Marcio Maranhão em depoimento à jornalista Karla Monteiro. Quem assina a direção artística da série é o cineasta Andrucha Waddington (de Casa de Areia).
A produção tem em comum com suas “parentes” gringas apresentar novos casos médicos a cada episódio, ao mesmo tempo em que os arcos dramáticos de seus personagens fixos são desenvolvidos a longo prazo. Só que a série global, coproduzida pela Conspiração Filmes, busca traçar um retrato que não pareça artificial, idealizado e distante da precariedade nossa de cada dia.
A produção tem em comum com suas ‘parentes’ gringas apresentar novos casos médicos a cada episódio, ao mesmo tempo em que os arcos dramáticos de seus personagens fixos são desenvolvidos a longo prazo.
Os protagonistas de Sob Pressão são um casal que, entre crises, idas e vindas, chega junto e feliz ao início da sexta temporada. Evandro, vivido pelo excelente ator gaúcho Júlio Andrade (de Cão sem Sono), é um cirurgião tão habilidoso quanto obstinado, por vezes irascível.
Ele vive um caso de amor repleto de altos e baixos com a médica Carolina, interpretada com maestria pela curitibana Marjorie Estiano, já indicada ao Emmy Internacional pelo papel. Com um histórico de abuso sexual familiar, depressão e automutilação, ela encontra no companheiro um parceiro de vida, dentro e fora da sala de cirurgia.
No início da temporada 5, o casal está em paz, vivendo com o filho de Evandro, após um entendimento com a mãe da criança, cuja guarda é compartilhada. A bonança, contudo, vai durar pouco.
Heleno (o grande Marco Nanini), pai do cirurgião, que não o via há mais de 20 anos, ressurge, doente de Alzheimer, e precisando de cuidado e atenção, que Evandro não sabe se conseguirá prover – há muito ressentimento represado na relação entre eles. Carolina, por sua vez, descobre ter um nódulo no seio.
Paralelo a tudo isso, o diretor do Hospital Edith de Magalhães, Décio (Bruno Garcia), decide acompanhar seu companheiro, Kléber (Kelner Macêdo), com quem se casa no terceiro episódio da temporada atual, que ganha uma bolsa para estudar em Londres.
Deixa em seu lugar a também cirurgiã Vera (Drica Moraes), que, por sua vez, na temporada anterior, interrompeu um recém-iniciado relacionamento amoroso com seu colega Mauro (David Junior), um médico negro bem mais jovem que ela.
O primeiro episódio da atual temporada, cujo foco é a saúde mental dos profissionais de saúde, gira em torno, além do reaparecimento de Heleno, de um incêndio numa fábrica de fogos de artifício, que deixa, entre os feridos, gêmeos idênticos, vividos por Lázaro Ramos. O ator e diretor brilha nos dois papéis, conseguindo dar nuances, e diferenças, aos personagens.
Já no terceiro episódio quem faz participação especial é a revelação Juan Paiva, o Ravi da novela Um Lugar ao Sol, no papel de um ex-garoto de rua cujo protetor, um técnico de futebol, é baleado por traficantes na comunidade onde vivem. No quarto capítulo, o agora ex-bbb Douglas Silva (de Cidade de Deus) vive um pai que se recusou a vacinar a filha pequena e procura, desesperado, o hospital quando a menina apresenta sintomas de turberculose.
É justamente esse vínculo entre o Hospital Edith de Magalhães, uma instituição pública que enfrenta todos os tipos de precariedade, e o mundo ao redor, violento, desigual e carente de cuidado e informação, que faz de Sob Pressão a melhor série brasileira da atualidade.
VOCÊ CHEGOU ATÉ AQUI, QUE TAL CONSIDERAR SER NOSSO APOIADOR?
Jornalismo de qualidade tem preço, mas não pode ter limitações. Diferente de outros veículos, nosso conteúdo está disponível para leitura gratuita e sem restrições. Fazemos isso porque acreditamos que a informação deva ser livre.
Para continuar a existir, Escotilha precisa do seu incentivo através de nossa campanha de financiamento via assinatura recorrente. Você pode contribuir a partir de R$ 8,00 mensais. Toda contribuição, grande ou pequena, potencializa e ajuda a manter nosso jornalismo.
Se preferir, faça uma contribuição pontual através de nosso PIX: pix@escotilha.com.br. Você pode fazer uma contribuição de qualquer valor – uma forma rápida e simples de demonstrar seu apoio ao nosso trabalho. Impulsione o trabalho de quem impulsiona a cultura. Muito obrigado.